Avenida de Portugal, na cidade Carmona. Dois homens armados
foram detidos neste cruzamento, faz hoje 35 anos. Foto de Jorge Oliveira
Carmona, 31 de Maio de 1975. São para aí umas quatro horas da madrugada. É sábado. Os bares nocturnos da cidade começam a escoar clientes e «profissionais». A PM faz a volta «solitária» passando por locais tidos como suspeitos. Não se vêem situações anormais. «Têm medo de nós...», brincalhou o Marcos, que é homem de estatura baixa, mas alma forte.
Estava na hora do regresso ao BC12.
O jipe conduzido pelo Breda galga sossegadamente o alcatrão da cidade. Vagarosamente, quase displiscentemente! Só se ouve o barulho do motor a gasóleo. A cidade está morta e os poucos neons não dão muita graça ao bréu mal disfarçado pela parca iluminação pública! Nem se ouvem os tiros que costumavam fazer pasto da noite.
Passámos ao liceu, virámos para o bairro industrial e olhámos a luz da Rádio Clube do Uíge. Seguimos para o ventre da cidade que dormitava!! Não se vê ninguém! «Vamos embora, dê a volta pela Rua do Comércio...», foi dito ao Breda.
O jipe avançou entre as sombras das ruas citadinas. «O que é aquilo?!», perguntou o Marcos.
Dois homens escondiam-se na entrada de um prédio e pareciam armados! Pffffff..., faltava esta! Um Toyota com metralhadoras adaptadas passou a poucos metros, era de outra força. E sumiu-se na noite! Os dois homens armados continuavam por ali. Estavam e fugiram, correndo para a Avenida Portugal. Mas foram agarrados, justamente no cruzamento da foto, detidos e levados para o BC12. Ao passarmos na estrada para o BC12, na zona do liceu, soaram tiros escondidos do capinzal. Ainda hoje muitos de nós não entendemos como, sem medos ou um passo atrás, corríamos perigos que eram de morte, desafiando as traições que se tapavam no bréu das noites enluadas da cidade.
Um dia depois, pouco mais de 24 horas depois..., a1 de Junho de 1975, rebentaram as «macas» de Carmona. O meu sábado foi de folga e comi bife com ovo a cavalo no Escape.
1 comentário:
Eram cerca de cinco e quinze da manhã, quando acordei com o barulho dos morteiros entre MPLA e FNLA. Estavamos a 1-6-1975 e nessa madrugada o "estufa" (Domingos) tinha ficado até tarde a cantar uns fadunchos, de Fernando Farinha, com as mãos nos bolsos, tal como era seu hábito. Eu, muito zangado disse; calem-se deixem-me dormir. De repente vi uns clarões muito intensos na noite do BC12. Tinha começado a guerra entre os dois partidos. Nessa manhã eu estava de serviço "cabo de dia". Ainda não eram cinco e trinta, já eu o Emanuel e o Damião estavamos no posto de vigia do BC12 por cima da sala de operações. Embora sendo horrivel era "um espectáculo" ver na escuridão da noite o cruzamento dos fogos entre as partes em conflito. Pouco depois entrava eu de serviço. Assim aconteceu e o mais dificil foi a hora do meio dia pois era preciso levar de comer ao edificio da ex-PIDE-DGS, bem no coração da cidade de Carmona. Mas entre medos e valentias lá conseguimos cumprir a nossa missão mesmo com fogo cruzado e não sendo operacionais, nunca me senti tão protegido com uma Berliet e cerca de vinte homens armados para levar uma panela de sopa e outra de comida. "A nossa vida dava um grande filme".
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