quarta-feira, 5 de maio de 2010

O 25 de Abril de 1974 visto de... Angola

Casa das Transmissões no Quitexe de 1973

Quando em Lisboa se tomavam posições com vista à revolução, eu e outros camaradas apetrechavamo-nos para uma operação de dois dias. Alheios aos acontecimentos, partimos às duas da madrugada para uma saída que marcaria, não só esta data, mas também a nossa passagem por Angola.Com o nosso tempo terminado a 14 de Abril, foi com algum, e até muito receio, que iniciámos a caminhada em zona onde sabíamos ser alvos fáceis.
Os nossos receios viriam a provar-se fundados.
A travessia de um riacho "obrigou-nos" a uma desatenção que quase nos foi fatal. De um morro surgiram rajadas de metralhadora que nos fizeram aumentar o clima de tensão. E de medo também! Afinal, tínhamos o nosso tempo cumprido, e estávamos a passar por uma situação complicada. Recordo as sucessivas cargas de água misturadas com um calor abrasador, e que que nos secava a roupa, em pleno andamento.
O alferes viria a necessitar de ajuda, mercê de uma repentina indisposição que o debilitou fisicamente. Homem de Operações Especiais, tinha um ponto fraco que não conseguia controlar em situações de grande tensão - o estômago! Ainda nos faltavam muitos quilómetros para percorrer e o nosso guia parecia não estar com muita vontade de avançar.
Pairou a desconfiança sobre a sua lealdade e as coisas chegaram a estar feias para o seu lado! Teve o furriel de tomar atitudes que não estavam previstas nos Códigos de Boa Conduta, para "convencer" o cavalheiro a cumprir a sua obrigação. Chegada a hora certa, via rádio, fiz o contacto com o Comando, para que nos recolhessem com medicação adequada e alertando para os necessários cuidados com que o deviam fazer.
A minha parte estava feita e eu, digo-o com vaidade, fiquei satisfeito por me sentir útil.
Ainda avistámos o IN à distância, mas o seu rumo era diferente do nosso. Além disso, a nossa operação acabava ali mesmo. e quanto menos ondas melhor! O nosso pensamento estava na família e disso já muito falavam as nossas missivas. Regressados ao Quartel, nada ainda transpirava sobre a Revolução. Mas eu soube-o, ainda com o meu banho por tomar. Em segredo e depois de assumir a minha «palavra de honra», o Silva, operador-cripto, lá desabafou ao meu ouvido o que só viria a saber-se alguns, e até muitos, dias depois.Já com dez dias passados, viria a receber uma encomenda com jornais, que nos davam conta das novidades. Correram toda a Companhia, mas alguns nem para ele olhavam. Aquilo nada lhes dizia e queriam era ir para casa! Era (foi) o meu 25 de Abril de 1974! Cheio de acontecimentos e muito marcante, por terras de Angola.
ANTÓNIO CASAL
1º. cabo rádio-telegrafista da CCS do
BCAÇ. 3879, no Quitexe em 1972/73

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