BATALHÃO DE CAVALARIA 8423. Os Cavaleiros do Norte!!! Um espaço para informalmente falar de pessoas e estórias de um tempo em que se fez história. Aqui contando, de forma avulsa, algumas histórias de grupo de militares que foi a Angola fazer Abril e semear solidariedade e companheirismo! A partir do Quitexe, por Zalala, Aldeia Viçosa, Santa Isabel, Vista Alegre, Ponte do Dange e Songo! E outras terras do Uíge angolano, pátria de que todos ficámos apaixonados!
sábado, 12 de junho de 2010
Os mortos esperariam...
Primeiros dias de Junho de 1975, a 2 ou 3. O PELREC evolui na cidade de Carmona e já levara algumas dezenas de civis refugiados para o BC12. Ouve-se regularmente o rebentar de morteiros e obuses e, de quando em vez, uma ou outra rajada.
O Francisco, no cruzamento da Rua do Comércio para a Praça da ZMN e dos edifícios públicos, ofereceu «resistência» - porém, rapidamente quebrada... - à subida de uma família para a Berliet. Dias antes, quase no mesmo local, tinham ofendido a equipa de PM - eu, o António e ele.
Estamos ao fim da manhã, hora de refeiçoar a ementa quente que os nossos companheiros da cozinha e da padaria nunca deixaram faltar naqueles dias de metralha, de sangue e muitas dores! Foram extraordinários!!! De uma generosidade impagável!!! Alguns deles andaram dias seguido sem dormir: o Pereira, o Almeida, o Ferreira, o Rebelo, o Baião, que me perdõem os que aqui esqueço! Foram todos iguais!!!
Guardámos as armas e íamos para o refeitório quando fomos chamados: havia mortos e feridos no bairro Montanha Pinto (foto), mesmo ao lado da nossa messe. Tínhamos de ir.
«Cuidado com o fogo!..». gritou o tenente Mora, creio que na altura nas suas vezes de oficial de dia. O ribombar dos morteiros ouvia-se no BC12, como se soprassem a fronteirar as nossas orelhas.
«Calma, pessoal... Eles não se metem connosco!!!...», foi dito aos bravos soldados do PELREC, já nós descíamos para a cidade! Para os descansar! E iludir os nossos medos.
«Não metem, o c......!! ...da-se!!!», gritou um eles, a morder os lábios de raiva e a cuspir da Berliet para o asfalto, enquanto esbracejavacom violência, pontapeando a caixa da viatura e fazia mira na G3, pelo canto do olho. «Calma, ó fulano...», disse-lhe, levantando-lhe a arma. Nestes momentos, sentíamos uma estranha calma e uma coragem que muitas vezes nem identificávamos connosco.
«Estamos a ver o alvo!!!», disse o Garcia, pela rádio de outra viatura, num bairro a que passaram pelo campo de futebol. «Estão debaixo de mira!!!... manenham contacto».
A barriga dava horas desde as quatro ou cinco da manhã, mas tínhamos de avançar. E, digamos, na verdade avançar com muita confiança! Se coisa havia que nos descansava - neste caso para além da protecção das NT, do alferes Garcia -, era o respeito que, nestes dias de violenta e mortífera metralha na cidade, os movimentos tinham pelas FAP. Parecia, por vezes e ao vivo, a imortal guerra de Solnado: chegávamos, dizíamos ao que íamos (buscar feridos) e parava-se o combate por uns minutos. O tempo de os recolher.
Naquele dia e no Montanha Pinto (foto), avistámos uma linha de fogo da FNLA e fizemos segurança à ambulância militar, para transportar os feridos. Os mortos esperarariam! A guerra lá «parou» e logo abandonámos o local. Ainda a tempo, porém, de vermos a serem disparados morteiros, que caíram quase em cima dos próprios apontadores e municiadores. Estranha guerra!
- FAP. Forças Armadas Portuguesas.
- ZMN. Zona Militar Norte.
- PM. Polícia Militar, em Carmona denominada Polícia de Unidade (PU).
- NT. Nossas Tropas.
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