O Mosteias era um gajo do caraças! O Mosteias era um gajo bom!! O Mosteias era um tipo que casava o impulso com a razão, misturando-as e reagindo-as numa doce partilha de amizade e camaradagem. O Mosteias era um portento de força física, praticante de halteres improvisados e dono de imponente figura. Era o mais alto, o mais pesado, o mais calmo, o mais bonacheirão, o melhor de todos nós numa série de coisas. Sapador de infantaria, era o gajo das minas e armadilhas!!! Ele, o montijense Cândido Pires e o amarantino Farinhas! Um trio muito singular!
O Mosteias era único furriel miliciano casado de toda a CCS. O que lhe dava uma auréola muito especial, entre todos nós, quando falávamos pela noite dentro, olhando a lua avermelhada dos céus africanos e sentindo os cheiros de cio de Angola, contando e ouvindo histórias, entre um gole de cerveja, um trago de wisky, ou simplesmente a endeusar as nossas irreverências de juventude, delas fazendo lendas e maioridades!!! A quietude bonançosa das noites do Quitexe dava para tudo, embrulhando-nos de emoções! E falasse-se de saudades!! Aí, aí... então aí ficávamos todos a olhar e a medir as estrelas no céu angolano e a antecipar sonhos das próximas horas de sono! A sonhar não digo com quê!!!
Não consta que o Mosteias alguma vez tenha usado a sua instrução militar especializada, em qualquer picada ou trilho da zona cafeeira de Angola por onde «vagabundeávamos» em patrulhamentos e operações. E ainda bem!!!! Sinal de que não havia perigos!!!
Divertia-se e ansiava-se ele, no dia a dia, era com o sonho e a expectativa de receber da mulher grávida a notícia de que já era pai!!
Tivera uma curiosa história, a do seu casamento com Leonor, filha do patrão, que era despachante oficial em Lisboa. História que ele contava com com indisfarçável gozo e felicidade!!: «Olhe, amanhã vou casar-me com a sua filha. Se quiser ir, é na Conservatória tal....».
- «Ó Mosteias e foi mesmo assim?!!...», perguntávamos nós, sempre de sorriso afiado! Para sempre ouvirmos a mesma história, contada com felicidade que não se contava em quilómetros. «Ó Mosteias, já te viste com a criança no colo?!... », respingávamos-lhe nós, rapazes na irreverência dos nossos 21/22/23 anos, para o provocar, em sorriso de refinada malícia, sugerindo-lhe o cofiar dos anéis dos cabelos da criança, o tocar-lhe a pele macia, dar-lhe o biberon, mudar-lhe as fraldas.
O Mosteias olhávamos com supremo desdém, de sorriso cúmplice, como se não houvesse no mundo pessoa mais feliz que ele. Um dia alguém lhe leu um poema: «Pai, o teu Natal é longe de mim/A mãe pousa as mãos no ventre/E sinto-lhe saudades sem fim/Porque me sente/Filho de ti!!!....". Qualquer coisa parecida com isto.
«Ó pá, mariquices, pá...», balbuciou ele. E riu-se, riu-se, riu-se! E saiu de ao pé de nós!
Não sei porquê, mas sempre tive a ideia de foi chorar para o quarto.
Dias depois, era pai!! E veio a Lisboa conhecer a criança!
- MOSTEIAS: Luís João Ramalho Mosteias, furriel miliciano sapador de infantaria. Mora em Sines. O filho seguiu a carreira da actor.
2 comentários:
É uma maravilha muito agradável ler isto, deviam ser momentos bem passados e divertidos, e ainda há quem diga que os tropas eram uns rudes e insensíveis.
Fui militar em Carmona e fiquei em Angola, a trabalhar numa fazenda dos arredores do Quitexe - vila aonde eu ia muitas vezes, ao bar do Rocha, ao Morais, a eles todos. E fazer compras aos Guerreiros, ou à administração civil e aos correios. Uma vez estive uns dias no hospital com o paludismo e foi um médico militar que me tratou, acho que o dr. Campos.
Boa sorte para todos vós e diverti-vos.
António Luís
Olha que dois!!!
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