A ponte do Dange
A foto é recente e da ponte do Dange, aparentemente com um novo tabuleiro em construção. Ao lado, julgo poder identificar a antiga - por onde passámos em1974, por mais de uma vez. Será? Francamente, não consigo rev(t)er a imagem. Seja como fôr, passei na ponte do Dange duas noites e três dias, em data que também não consigo precisar! Fazia-se-lhe protecção, já que que era nevrálgica para o sistema rodoviário, entre Luanda a Carmona - a chamada Estrada do Café!
Indo sair uns dias e sabendo ser para missão estacionada, levei alguma literatura. Era 2ª. feira e, de Lisboa, tinha chegado o Expresso, o jornal - que, ao tempo, não se vendia ao "quilo", como agora, e eu lá recebia semanalmente.
Ao segundo turno, passei a ronda e, com a noite toda serena e de lua cheia, sem cheiro de IN, sem ruídos que nos fizessem nascer medos e connosco espreitando o luar que se punha por cima da mata, pus-me a matar o tempo em leitura do Expresso! De repente, um susto: o jornal noticiava que a ponte do Dange tinha sido dinamitada e que tinham morrido dois soldados portugueses! Senti um frémito de medo e angústia! Apanhou-se-me o peito! A ponte dinamitada?!
Estava armado, de G3 com bala na câmara e dilagrama, duas granadas defensivas e outras tantas ofensivas! Os soldados estavam de alerta, as redondezas armadilhadas e a ponte estava ali na nossa frente, intacta! Eu mesmo, não muito antes, a atravessara apeado, vindo de um posto de controlo, do outro lado do rio! Como era possível um jornal de Lisboa, de dois dias antes, dar notícia da destruição da ponte?!!!
«Será outro Dange...», considerou-me o Leal, que era soldado de poucas palavras e estava ali ao meu lado, em turno de descanso mas sempre de olho vivo, sentado sobre uma grade vazia de cerveja e, mesmo em descanso, espreitando os perigos que se suspeitavam da noite!
Olhámos, ambos ansiosos, para o bréu dos Dembos: a lua parecia-nos maior que nas outras noites, o luar abria avenidas no escuro e, de longe, ouviam-se piados e grunhidos de animais da selva! Mais do longe, pareciam ouvir-se batuques - que seriam de uma aldeia que sabíamos próxima!
A noite passou-se, sem mais leituras do jornal e com um milhão de cuidados, sem um momento de cerrar os olhos! Um momento sequer!
Quando o sol caiu nos nossos olhos, folgámos o sistema nervoso. Ali perto, vi passar uma velha, que cachimbava e se sentou numa pedra enorme, caída de algures. Lançava fumaças para o céu que se avermelhava, eram menos de sete horas da manhã.
«Bom dia, esfurrié...», disse-me ela, quando me aproximei.
Tínhamos-nos visto na véspera, na tal aldeia, e a velha que cachimbava levava uma cântara de madeira, cheio de fuba. Outra, com água! «Vais comê nos nossa aldeia?», perguntou-me ela, soltando uma espiral de fumo, lenta, em direcção ao céu.
Disse-lhe qualquer coisa e voltei à guarnição, onde já cheirava a leite escuro, para o mata-bicho, nas malgas de lata que o serviam com o pão duro de véspera. «Notícia de m....», pensei eu, sobre o que lera da dinamitação da ponte do Dange e apetecendo-me dar uns bons pontapés a quem tal notícia editou!. «P... que os p....!!!...».
Quando de lá voltámos ao Quitexe, olhei para a ponte numa espécie de adeus! E ela ali estava, intacta! Nunca mais por lá passei!
Indo sair uns dias e sabendo ser para missão estacionada, levei alguma literatura. Era 2ª. feira e, de Lisboa, tinha chegado o Expresso, o jornal - que, ao tempo, não se vendia ao "quilo", como agora, e eu lá recebia semanalmente.
Ao segundo turno, passei a ronda e, com a noite toda serena e de lua cheia, sem cheiro de IN, sem ruídos que nos fizessem nascer medos e connosco espreitando o luar que se punha por cima da mata, pus-me a matar o tempo em leitura do Expresso! De repente, um susto: o jornal noticiava que a ponte do Dange tinha sido dinamitada e que tinham morrido dois soldados portugueses! Senti um frémito de medo e angústia! Apanhou-se-me o peito! A ponte dinamitada?!
Estava armado, de G3 com bala na câmara e dilagrama, duas granadas defensivas e outras tantas ofensivas! Os soldados estavam de alerta, as redondezas armadilhadas e a ponte estava ali na nossa frente, intacta! Eu mesmo, não muito antes, a atravessara apeado, vindo de um posto de controlo, do outro lado do rio! Como era possível um jornal de Lisboa, de dois dias antes, dar notícia da destruição da ponte?!!!
«Será outro Dange...», considerou-me o Leal, que era soldado de poucas palavras e estava ali ao meu lado, em turno de descanso mas sempre de olho vivo, sentado sobre uma grade vazia de cerveja e, mesmo em descanso, espreitando os perigos que se suspeitavam da noite!
Olhámos, ambos ansiosos, para o bréu dos Dembos: a lua parecia-nos maior que nas outras noites, o luar abria avenidas no escuro e, de longe, ouviam-se piados e grunhidos de animais da selva! Mais do longe, pareciam ouvir-se batuques - que seriam de uma aldeia que sabíamos próxima!
A noite passou-se, sem mais leituras do jornal e com um milhão de cuidados, sem um momento de cerrar os olhos! Um momento sequer!
Quando o sol caiu nos nossos olhos, folgámos o sistema nervoso. Ali perto, vi passar uma velha, que cachimbava e se sentou numa pedra enorme, caída de algures. Lançava fumaças para o céu que se avermelhava, eram menos de sete horas da manhã.
«Bom dia, esfurrié...», disse-me ela, quando me aproximei.
Tínhamos-nos visto na véspera, na tal aldeia, e a velha que cachimbava levava uma cântara de madeira, cheio de fuba. Outra, com água! «Vais comê nos nossa aldeia?», perguntou-me ela, soltando uma espiral de fumo, lenta, em direcção ao céu.
Disse-lhe qualquer coisa e voltei à guarnição, onde já cheirava a leite escuro, para o mata-bicho, nas malgas de lata que o serviam com o pão duro de véspera. «Notícia de m....», pensei eu, sobre o que lera da dinamitação da ponte do Dange e apetecendo-me dar uns bons pontapés a quem tal notícia editou!. «P... que os p....!!!...».
Quando de lá voltámos ao Quitexe, olhei para a ponte numa espécie de adeus! E ela ali estava, intacta! Nunca mais por lá passei!
1 comentário:
Caro Sr. Celestino Viegas.
Em primeiro lugar cumprimentá-lo.
Pois eu também sou um filho do Quitexe, e estava lá na altura em que o vosso Batalhão lá esteve. O meu Pai era o encarregado geral da Fazenda Guerra & Cia., conhecido por Santos.
Conhecíamos muito bem o vosso Comandante, na altura Tenente Coronel Almeida Brito. Era visita frequente da Fazenda Guerra & Cia., e amigo do meu Pai.
Lembro-me muito bem, de alguns militares passarem o período de férias, lá na Fazenda.
Amigo Celestino Viegas. Por acaso, já tive conhecimento do seu Blog, através do Blog do amigo Garcia. Gostei bastante, e é mais um contributo, para se perpectuar a memória daquela maravilhosa terra. Ultimamente tenho tido dificuldade em abrir o seu Blog. Tem-me aparecido um bloqueio do internet explorer, mas vou tentar ultrapassar o problema.
Um abraço para si...
A. Jorge Santos
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