sábado, 22 de janeiro de 2011

O 1º. cabo Casal participado em plena operação militar


António Casal da Fonseca, 1º. cabo de transmissões,
participado por alferes miliciano em plena operação militar

Por volta das três da manhã, em data que não consigo precisar, fomos acordados para mais uma operação de três dias, que nos levaria à densa mata angolana. Por onde andei, nunca o soube exactamente, mas recordo-me que foram dias de chuvas torrenciais e um calor abrasador, que nos secou as roupas no corpo.
Ao terceiro dia, fomos obrigados a passar um riacho que nos levaria a água aos joelhos. Calculei a distância entre as margens para ver se, saltando, evitava encher as botas de água, para tornar menos penoso o resto da caminhada. O alferes Sousa, de Operações Especiais e comandante do grupo, era especialista a debitar piadas de mau gosto, o que lhe terá causado dificuldades de relacionamento na Companhia, principalmente com sargentos e praças.
«Ó Casal, não tenha medo da água!..., se quiser eu levo-o pela mão… blá…blá…blá»!..., em tom gozão, achando que todo o grupo se iria rir da piada.
Ninguém se riu e muito menos eu, que lhe respondi no mesmo tom, mas com um sorriso largo, não o desrespeitando: «Desculpe lá meu alferes, mas não sou eu que ando a arrojar as botas desde ontem…, não fui eu que passei a mochila ao guia, apesar de ser eu que venho a alombar com um rádio…, e mais, eu até atravessava o riacho consigo às costas»!
Não gostou do que ouviu e nem eu gostei do que me vi “obrigado” a responder! Mas, pronto, estava dito, e de tal não me gabo nem me arrependo! Certo é que não atravessei o riacho, saltando por cima dele depois de tomar um balanço de cerca de 10 metros. Não molhei as botas, mas logo ali mesmo, à beira da água, me foi lida a sentença - uma participação!

Sentença interrompida por duas rajadas e dois ou três tiros isolados, que não nos terão passado muito longe! Devo dizer que houve ali alguma aflição, se não muita, porque as primeiras árvores distavam cerca de 20 metros. Fizemos melhor do que a instrução nos ensinara e rastejámos até ao arvoredo, lambendo a lama avermelhada. Não mais se ouviu um tiro e as horas que se seguiram foram de receios e cuidados. Não vimos ninguém, o que não era o melhor sinal, e pelas 15 horas a operação foi dada por terminada.
Visivelmente nervoso e sempre temendo que o TR 28 não fizesse o seu papel, aproximou-se de mim o alferes para que eu fizesse o contacto para o regresso ao quartel. «Você acha que o rádio vai funcionar?...contacte lá o quartel antes que se faça noite!»
E funcionou mesmo, com o Mário do outro lado da linha a perguntar se estava tudo bem - nesse mesmo dia, ao posto de rádio do Quitexe, enviadas de Santa Isabel, já tinham chegado noticias de outras movimentações. E a matar o tempo de espera, e também de medos, ali ficámos sentados a falar de coisas que nem tinham nada a ver com a operação. O seu curso de engenharia por acabar – tinha chumbado um ano - e do que eu fazia, ou não fazia, na vida civil, aguçando-se-lhe a curiosidade. E muito menos se falou da tal participação com que me ameaçara, assim como da troca de palavras na travessia do riacho que, vendo bem, não passaram de coisas menores. Até aos dias de hoje!
ANTÓNIO FONSECA

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