Quando fui de Portugal para Angola, levei muito pouca bagagem: uma mala com a roupa militar e alguma civil, artigos de higiene pessoal (muito poucos), livros e uma cassete. E uns embrulhos de amigos de cá, para familiares civis de lá!
A cassete, vejam lá, levava uma singular gravação: repeniques festivos e toques de finados dos sinos da igreja daqui ao lado. Parece uma infantilidade, se calhar uma patetice, mas a verdade é que não havia conforto que não me desse quando a ouvia, nos momentos mais nostálgicos. Estou a imaginar-me, estendido na cama, de mãos cruzadas na nuca e a deliciar-me com a audição. De olhos cerrados, imaginava-me na torre sineira a tocar o repenique, fosse ele de um baptizado, ou de um casamento, de dia de festa ou simplesmente o toque das trindades, do meio-dia ou do momento de Santos, na missa! Mais raramente, ouvia o toque de finados - os sinais!!!... - e sentia-me sempre muito, muito confortado. Parecia-me, assim e mesmo tão longe, como se aqui estivesse no adro, a conversar com os amigos e a sentir os cheiros da minha terra.
Uma vez - e era aqui que queria chegar... - como que acordei a um bater apressado e quase aflitivo na porta do quarto.
Era o tenente Mora: «O que é isso»!...».
Isso, eram os repeniques que eu mesmo badalara e que ouvia repetidamente na cassette. Lá expliquei.
Era o tenente Mora: «O que é isso»!...».
Isso, eram os repeniques que eu mesmo badalara e que ouvia repetidamente na cassette. Lá expliquei.
«Ora venha aqui fora...», chamou-me ele.
Fui: meia dúzia de soldados, religiosamente em silêncio, escutavam o toque dos repeniques que saíam do rádio-gravador do meu quarto. Ainda hoje os «estou a ver», cheios de emoção,concentrados, de braços cruzados e pernas traçadas, de pé e ao sol de África que lhe fazia escorrer suor pelo corpo abaixo, a ouvir a gravação, como se estivessem na missa.
3 comentários:
Amigo Viegas; são momentos como esses, de nostalgia e recordação que nos dão o encanto de memórias vividas em terras Africanas. Quantas lágrimas derramadas por coisas tão simples e com tanto significado. Parabens por nos recordares momentos intimos e tão pessoais.
Devo confessar que dessa não me lembraria eu! Bom, não tenho essa arte mas sabe que eu sou um apaixonado por repeniques - faz parte da nossa cultura.
Um companheiro meu também levou uma cassete, mas de repeniques (também são musicais) nada tinha, o que foi pena porque teria evitado uma situação quase dramática! Era uma cassete que o ía pondo maluco e cuja história virei a narrar com pormenores, agora que me foram bem lembrados por um amigo que sem querer, se viu envolvido na história!
Este Viegas é um espectáculo, uma coisa destas só mesmo dele, conheço-lhe historias do arco da velha e verdadeiras, continua a ser um gajo desconcertante s´meso um gajo como ele se dara à tarefa de criar e atualizar o bloguie todos os dias.
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