Aeroporto Internacional Craveiro Lopes, em Luanda (anos 70 do século XX)
Campo Militar do Grafanil, nos arredores de Luanda, 8 de Setembro de 1975. Poucos dos Cavaleiros do Norte, os da CCS, dormiram na noite mais longa dos 15 meses e alguns dias que fizeram a nossa comissão em Angola.
A luz rasgou o dia, num instante. Como sempre! A caserna vivera empolgamentos irrepetíveis! Comeu-se, bebeu-se e cantou-se até ao exagero! Houve até quem dançasse o merengue e abusasse um bocadinho do álcool. Nada de mais! Ainda não são seis horas da manhã e já toda a CCS, quase toda a CCS!..., está de mala aviada, sem sono e ansiosa, impecavelmente fardada, garbosa, esmeradamente escanhoada. Estão a chegar as berliets que nos vão levar ao aeroporto.
Ainda não são 8 horas e já lá estamos! Suando do calor e da emoção! E da espera na bicha que se faz para chegar ao avião. Por ali vamos todos fazendo e desfazendo sorrisos. Daí a dez/onze horas, não mais... já estaremos em Lisboa! Depois, cada qual galgará os caminhos que os levarão aos seus adros familiares, aos colos das suas casas natais, as regaços das mães, mulheres e namoradas, aos cheiros das suas ruas de 15 meses antes.
Na hora do embarque, a mim, ao Neto e ao Mosteias, não me lembro se a mais algum imediatamente futuro ex-furriel, entregam-nos um preso! Um preso, a cada um! E lá fomos nós, de algemas dadas. Tínhamos de os entregar em Lisboa!
Acomodámo-nos no avião!!! O 707 levantou as asas e voou, voou, voou... até Lisboa - onde chegámos por volta das 6,30/7 horas da tarde. Ainda era bem de dia!
Lá nos esperava o Benício, motorista da fábrica do pai do Neto, que nos «carregou» para Águeda. Como é que está Portugal, como é que está Águeda?, este e aquele, isto e aquilo, enchemos o Benício de questões.
A estrada não era auto-estrada e as menos de duas horas de hoje, eram quatro ou cinco por aquele tempo! Parámos em Alcoentre, para comer bacalhau. Bacalhau com vinho branco, que saudades!
Já era mais de uma e meia, mais para as duas horas!, quando chegámos a casa do Neto, onde o esperava a família - o pai, a mãe, os irmãos, a namorada Eunice, sua Ni ainda de hoje! Quanta alegria, quanta felicidade se espalhou na casa dos Neto´s!!! E eu para ali a um canto, meio esquecido, a deliciar-me de os ver tão felizes e tão exuberantes. Eu ali, a 8 quilómetros da casa onde, sem me saber tão perto, dormia minha mãe a serenidade e luto da sua viuvez.
Lá fui lembrado e veio o Benício trazer-me. Por cautela, fui bater à janela da casa de minha irmã. Truz, truz, truz, no vidro!!!... Já lá vão mais de duas horas de madrugada. Ouço meu cunhado Zé Pinheiro a acordar, sobressaltado. «Quem é?!...». Ora, quem é?, quem o acordaria àquela hora? «Sou eu!!!...«, lhe disse.
E, sem estar a ver, adivinhei a cotovelada na minha irmã. «Acorda, tá ali o teu irmão...».
Ninguém sabia que eu vinha e minha irmã levantou-se para ir acordar a nossa mãe. Isso lhe pedi. Já lá iam mais de três horas quando a senhora dona Maria Dulce abriu a porta da nossa modesta sala. «És tu, rapaz? Já vieste?!...».
Dormi com e como os anjos. Acordei com o toque das trindades da manhã, às seis e tal. Virei-me para o outro lado, mas pouco depois já estava a pé, no pátio, a abrir a porta do curral da vaca, os dos porcos, a contar as galinhas, a ouvir as badaladas das oito horas! Tam, tam, tam... Até que minha mãe chegou, já da horta, a chamar-me para o café de cevada com migas de broa. Estava em Ois da Ribeira, na minha casa! Já era 9 de Setembro de 1975, amanhã fará 35 anos!!! Um dia antes, estava em Luanda, em Angola!
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