domingo, 12 de dezembro de 2010

A verdadeira história dos beduínos do Quitexe...



MANUEL MACHADO
Texto

A história do beduíno é real e passou-se na minha recruta, quando frequentava o curso de sargentos milicianos nas Caldas da Raínha. É uma história curta, que se passou com um alferes miliciano contratado, que comandava o meu pelotão, bem secundado por dois cabos milicianos que, infelizmente, eram do mesmo tipo. Gabava-se de que todas as noites bebia uma garrafa de wiskye, pelo que é imaginável a sua disposição para lidar, na manhã seguinte, com um pelotão de recrutas, dada a ressaca com que acordava.
Tivemos uma instrução do pior, não havia ribeiro que tivesse muitas silvas por onde não passássemos, nem lagoa onde não metessemos o corpo. Numa dada noite, pôs-nos a pé às duas da manhã, alegando instrução nocturna, já bastante toldado pelo álcool, e fez-nos passar por dentro do tanque onde os prontos lavavam a roupa e pela vala onde eram vazados os dejectos dos porcos. Isto depois de darmos algumas voltas ao quartel. Realmente era o banho ideal. No final, tomamos banho vestidos para retirar alguma da porcaria de que vínhamos impregenados.

O alferes vertia as suas frustrações nos exercícios de aplicação militar que adaptava no sentido de os tornar mais difíceis para os instruendos. Para ele, não tínhamos nome, éramos todos beduínos pois não íamos ter sossego nem tenda certa durante três anos.
A verdade é que assim foi, sempre com a casa às costas até ao final. Este fulano, dizia algumas coisas que nunca mais esqueci, com a de «os cães vadios no interior da unidade são vossos superiores» e «quem os molestar será punido». Isto dá para ver a coação psicológica que nos era feita por essa gente. É claro que o melhor era não fazer ondas, mas dizia cá para com os meus botões - vai meter essa a outro.
E assim passei três meses de recruta no Regimento de Infantaria nº 13, nas Caldas da Raínha, no primeiro turno de 1973 - que se iniciou a 23 de Janeiro na quarta companhia de instrução.
Daí que nós enquanto militares eramos realmente como as tribos de beduínos do deserto, que não tem lugar certo para estar.
- MACHADO. Manuel Afonso Machado, furriel miliciano mecânico de armamento. Natural de Covelo do Gerez (Montalegre) e residente em Braga.
- BEDUÍNO. Nome que Machado vulgarmente atribuía aos militares do BVAV. 8423 e que muito se popularizou na guanição.

1 comentário:

Anónimo disse...

Camaradas: È verdade, ainda há por aí muitos antigos beduínos, que se tornaram sedentários, mas com saudades do tempo da beduinácia. Um grande abraço aos antigos beduínos. Do beduíno MM"
M. MACHADO