quinta-feira, 28 de outubro de 2010

As botas que eram da Força Aérea e custaram 400$00



A 28 de Outubro de 1974, recebi umas botas pelo correio. Botas da tropa, bem entendido.
As minhas, um dos dois pares de cabedal que daqui levara, já estavam muito gastas pelos milhares de quilómetros calcorreados desde a Escola Prática de Cavalaria, em Santarém, passando pelo exigente e muito palmilhado Centro de Instrução de Operações Especiais - os Rangers, em Lamego - e não esquecendo os tempos de Santa Margarida. E as operações militares nas matas do Uíge angolano. 
E o que de história tem receber um par de botas?! Bom, é que eram botas da Força Aérea e eu era do... Exército, o que causou alguns engulhos. Nomeadamente, por causa da velhíssima relação persecutória que um quadro superior da CCS mantinha com a minha pessoa.
Fui chamado a contas.
«O nosso furriel não sabe que calça umas botas da Força Aérea?», interpelou-me o impertinente superior hierárquico, uns dias depois. Bem poucos.
«As botas são minhas...», respondi, com ar e atitude de respeito.
«Não pode usá-las, são da Força Aérea...», insistiu quem na tropa mais era que eu.
«São minhas!...», retorqui, já meio refilão, diria mesmo algo insolente - que a paciência também morre.
«Faça favor de as ir tirar, se não participo...», ameaçou-me a superior figura.
«Pois participe!!! Eu conheço das NEP...», respondi eu, já impaciente, mas respeitador qb e até algo receoso, confesso. «Dá-me licença que me retire?».
Fui licenciado e ao outro dia repreendido: «O sr. furriel nunca mais me responde assim, se não....».
Vim a saber - estas coisas sabem-se sempre... - que a venerável figura tinha passado horas a procurar nas NEP um artigozinho da lei com o qual me pudesse «fazer a cama».
«Ó Viegas, pá... o homem até se babava de ansiedade, por não encontrar forma de te pegar...», disse-me um 1º. cabo que assistiu ao acto.
As botas foram enviadas pelo amigo Alberto Ferreira, que era cabo especialista da Força Aérea, na Base Aérea de Luanda. Custaram 400$00. «O correio foi de borla, pois trata-se de um envio de SPM para SPM», contou-me ele, na carta capeada pelo envelope da imagem que se vê acima.
- NEP. Normas de Execução Permanente.
- SPM. Serviço Postal Militar

3 comentários:

Tomás disse...

"Coitado" do homem se calhar não tinha mais nada que fazer, bem podia ir entreter-se com a mulher dele. Aliás era o passatempo predileto dele. Perdido e achado andava na peugada da malta toda, fosse ele quem fosse. Era caso para dizer; (ai Mora Mora, se eu pudesse, mandava-te daqui para fora).

Tomás disse...

"Coitado" do homem se calhar não tinha mais nada que fazer, bem podia ir entreter-se com a mulher dele. Aliás era o passatempo predileto dele. Perdido e achado andava na peugada da malta toda, fosse ele quem fosse. Era caso para dizer; (ai Mora Mora, se eu pudesse, mandava-te daqui para fora).

Viegas (ex-furriel miliciano) disse...

Caro Tomás:
Não foi quem dizes.
Outro assunto: estou à espera das tuas fotos do reencontro.
Abraço.
C. Viegas