terça-feira, 9 de junho de 2009

O soldado de cavalaria que chorava pela mulher e pelas duas filhas doentes...


As saudades eram razão para alguns momentos menos bem passados no Quitexe. Por mim, abusando de algum racionalismo criado e crescido nas minhas raízes rurais, dava-me bem com esses momentos: lia, escrevia, caminhava, contava(-me) histórias, deixava passar o tempo.
Esta mesa, ao lado da minha cama - no quarto que partilhava com o Neto - teria muitas histórias para contar. O que ali se vê pousado, enquanto redijo alguma coisa para alguém, é um livro de poemas, que relembro pela capa mas sem conseguir identificar o autor. Outros se vêem na improvisada estante, ao meu lado esquerdo.
Por ela, pela mesa, passaram sementeiras de muitos sonhos e promessas de muitos amores - as mesmas que os aerogramas carreavam para Portugal, ao encontro do coração de muitas namoradas e madrinhas de guerra. Nesta mesma mesa, escrevi a talvez mais dramática mensagem enviada para Portugal, a de um soldado já pai de duas crianças, ambas adoentadas e uma delas gerada na quase certa pressa de casal mais afoito, nalgum milheiral dos lados de Pombal. Isso o levou, ao casal de namorados, a uma envergonhada apressada ida ao altar, roubando-se ao mal-dizer dos vizinhos e da aldeia.
A jovem mãe, também doente e sem meios de sustento que dessem para tantos remédios e mais e melhores cuidados, escreveu ao marido-soldado plangente recado: «Já não sei o que fazer!...».
O soldado, nosso irmão do destino quitexano, irmão feito do mesmo barro e tendo a mesma alma, há dias que andava diferente: cabisbaixo,entristecido, desconcentrado. Chorava!!! E então o que era? Era ele estar ali, longe, muito longe.. e não poder fazer nada pelas suas meninas. Era ele não saber que amanhã seria o delas. Era ele saber que as famílias, a dele e a da mulher, não olhavam nem cuidavam da dor que se vivia na sua casa! E a mulher, coitada, jovem e só, entregue aos seus medos e dificuldades.
Tinha um amigo que trabalhava nas Meirinhas de Pombal e Alcogulhe, perto de Leiria (já falecido, companheiro de artes profissionais), a quem lancei apelo: «Ajude essa família!...». Ajudou!
Tive o gosto de conhecer estas meninas, já mulheres e mães, em 1999, num encontro de militares do BCAV 8423. E o (ex)soldado, agora um marido feliz e reconhecido, lembrou para elas e em outras e suas palavras, esta história que aqui deixo. E apresentou-me os netos! Três ou quatro netos e netas! Ou cinco?! Embebecido e eufórico! Feliz! Gostei, meu caro!
- SOLDADO: Intencionalmente, não cito o nome do soldado. Direi apenas que era ajudante de motorista. Um abraço para ele, se me ler!

2 comentários:

QUITEXE disse...

Caro Viegas, a minha filha descobriu o teu site e farta de me ouvir falar da tropa e do quitexe à tantos anos, andou a mostrar-me estas coisas bonitas do nosso tempo de tropa; eu não me lembro de quem é este soldado mas lembro-me bem de na noite de natal de 74 se falar nessa história estávamos nós no bar a beber umas nocais e umas cucas, com mancarra; a ideia que eu tenho é a de que era um rapaz baixito, que passava vida a limpara as G3 e andava muito contigo, é esse?
Parabéns pelo blogue, luís

SANTOS disse...

História bonita, o furriel Viegas emprestou-me uma vez 200$00 para eu comprar um daqueles tapetes que se punham nas paredes das salas, ainda já 3 anos quando fui a Portugal ele lá estava na sala da casa dos meus pais; era muito amigo ele do outro furriel de águeda, o neto, o que é feito dele?
SANTOS