terça-feira, 27 de abril de 2010

O dia 25 de Abril vivido no Quitexe

Rua principal de Quitexe, estrada de Luanda para Carmona (Uíge)

ANTÓNIO CASAL
Texto

Quando em Lisboa se tomavam posições com vista à Revolução, eu e outros camaradas apetrechavamo-nos para uma operação de dois dias. Alheios aos acontecimentos, partimos às duas da madrugada para uma operação que marcaria não só esta data, mas também a nossa passagem por Angola.Com o nosso tempo terminado a 14 de Abril, foi com algum, e até muito receio, que iniciámos a caminhada em zona onde sabíamos ser alvos fáceis.
Os nossos receios viriam a provar-se fundados.
A travessia de um riacho "obrigou-nos" a uma desatenção que quase nos foi fatal. De um morro, surgiram rajadas de metralhadora que nos fizeram aumentar o clima de tensão. E de medo também! Afinal, tínhamos o nosso tempo cumprido e estávamos a passar por uma situação complicada. Recordo as sucessivas cargas de água misturadas com um calor abrasador, e que que nos secava a roupa, em pleno andamento.
O alferes viria a necessitar de ajuda, mercê de uma repentina indisposição que o debilitou fisicamente. Homem de Operações Especiais, tinha um ponto fraco que não conseguia controlar em situações de grande tensão - o estômago! Ainda nos faltavam muitos quilómetros para percorrer e o nosso guia parecia não estar com muita vontade de avançar. Pairou a desconfiança sobre a sua lealdade e as coisas chegaram a estar feias para o seu lado! Teve o furriel de tomar atitudes que não estavam previstas nos códigos de boa conduta, para "convencer" o cavalheiro a cumprir a sua obrigação.
Chegada a hora certa, via rádio, fiz o contacto com o comando, para que nos recolhessem com medicação adequada e alertando para os necessários cuidados com que o deviam fazer. A minha parte estava feita e eu, digo-o com vaidade, fiquei satisfeito por me sentir útil. Ainda avistámos o IN à distância, mas o seu rumo era diferente do nosso. Além disso, a nossa operação acabava ali mesmo. e quanto menos ondas melhor!
O nosso pensamento estava na família e disso já muito falavam as nossas missivas. Regressados ao quartel, nada ainda transpirava sobre a Revolução. Mas eu soube-o, ainda com o meu banho por tomar. Em segredo e depois de assumir a minha «palavra de honra», o Silva (operador-cripto) lá desabafou ao meu ouvido o que só viria a saber-se alguns, e até muitos, dias depois.Já com dez dias passados, viria a receber uma encomenda com jornais que nos davam conta das novidades. Correram toda a Companhia, mas alguns nem para ele olhavam. Aquilo nada lhes dizia e queriam era ir para casa!
Era (foi) o meu 25 de Abril de 1974! Cheio de acontecimentos e muito marcante, por terras de Angola.

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