segunda-feira, 12 de abril de 2010

As transmissões e a operação na mata da Serra do Quibinda

Um grupo de Transmissões da CCS do BCAV. 8423, no Quitexe, em 1974 (em cima, clicar
para a ampliar) e um operador do Racal TR28 (em baixo, foto tirada DAQUI)


As transmissões eram essenciais, fossem lá elas falhar quando fosse necessária uma evacuação, um socorro, uma comunicação urgente. As saídas para operações, os patrulhamentos, ou para as mais vulgares escoltas, não dispensavam o homem da rádio.
A minha primeira operação na mata angolana, pela serra de Quimbinda adentro, foi de três dias - com dois grupos de GE´s. E bem sei e lembro as aflições de deixar de ter o Racal TR28 a comunicar com o Quitexe, a partir da manhã do segundo de três dias. E o medo, o constrangimento, a boca que se fazia roxa de morder os lábios enquanto se palmilhavam os trilhos da mata, carregando a mochila, de arma aperrada e olhos bem abertos, a querer ver o que não... queria. Entre a vida e o temor do sangue e da morte.

Ao terceiro dia, numa clareira já perto da fazenda Vamba, lá esticámos as antenas, tentando comunicar com o Quitexe. Qual quê?!!! Quando finalmente a comunicação foi conseguida, não havia acerto de senhas - não sei já porque coisa! Falei em linguagem claro, sem códigos, aflito! «Sou fulano, pá!...».
Não me percebia o operador, ou não reconheceu! Foi um drama! Havia legítima dúvida de identidade, há para aí 30 horas que não havia contactos, sabe-se lá o que teria acontecido, se não estaria prisioneiro!

Finalmente, lá nos entendemos. E fomos transportados pelo Pelotão de Morteiros, comandado pelo Alferes Leite, açoreano - que não me deu palavra até que chegámos ao aquartelamento. Eu e uns 40 e tantos GE´s. O Racal TR28 lá voara os éteres dos céus de Angola, com a mensagem que nos «evacuou». Estão a ver a importância das trasmissões. Aqui lhes presto a minha continência.

2 comentários:

Casal disse...

Continência, sim senhor, muito bem.
Aproveito para puxar dos meus galões, melhor dizendo, divisas. Ou não tivesse eu sido homem de Transmissões!
Teria aqui pano para mangas muito compridas, mas vou resumir.
Recordo-me de um dia almoçar com uns amigos que faziam parte da escolta ao MVL. Dois tinham feito a recruta comigo e o Alferes tinha sido meu colega de escola. Almoçámos os quatro e despedimo-nos cerca das duas da tarde. Ás quatro da tarde recebemos uma comunicação via rádio, pedindo-nos ajuda. Não chegámos a sair do quartel porque logo de seguida recebemos nova comunicação a informar-nos que um PELREC já ia a caminho, proveniente de um destacamento mais próximo do local.
Partimos sim, mas às seis da tarde, com uma tarefa bem mais dolorosa. Não vou entrar em detalhes, apenas quero salientar a atitude do homem das transmissões. Muito baixinho, metido apenas com ele mesmo e que quando falava, parecia que sussurrava.
Contou-me o Alferes, á noite, que o soldado de transmissões, ao saltar da viatura, foi protegido pelo rádio Racal TR 28, que foi atingido por uma das três Bredas montadas, ficando destruído e sem hipóteses de funcionamento. Abrigou-se atrás duma roda e aproveitou uma pequena pausa do tiroteio, para gritar a amplos pulmões, simulando que estava a falar com os camaradas e dando a entender que a ajuda estaria próxima. A atitude resultou e verificou-se uma reviravolta nos acontecimentos, que já tinham deixado as suas marcas.
O acto foi reconhecido e, já na vida civil, vim a saber que foi condecorado, ou que recebeu uma medalha pelo seu feito, não posso precisar. Creio que se chamava (ou chama) Mateus, o tal que se punha sózinho no seu canto e que era olhado como um "meia leca". E que pelos vistos até tinha boa voz, mas só dela fazia uso quando entendia ser necessário! Ele lá sabia. E lá soube!

J. Silva disse...

Alguém se lembra das transmissões e da importância que tinham, obrigado e parabéns ó Viegas, só tu podias vir falar destas coisas todo este tempo todo depois da guerra de Angola...