terça-feira, 4 de agosto de 2009

A morte de dois civis brancos, emboscados numa picada

Furriéis Viegas e Miguel (pára-quedista) na vila do
Quitexe, a 14 de Outubro de 1974. Clicar na foto, para a ampliar
O Miguel era furriel miliciano pára-quedista e foi parar ao Quitexe por uma qualquer razão que agora me escapa, mas ligada à gestão operacional dos GE (Grupos Especiais). Mais velho que nós, um ano - e com mais tempo de comissão... -, tinha de Angola e dos perigos que muitas vezes nos amedrontavam, uma noção mais exacta da realidade e os seus conselhos eram ouvidos atentamente. Por ele já tinham passado «coisas» que nós não viemos a conhecer! Felizmente!
O dia desta foto não é dos mais felizes da nossa passagem por Angola e terras do Quitexe! Dia 14 de Outubro de 1974!
Um grupo IN, na picada entre as fazendas Alegria II e Ana Maria, emboscou uma viatura civil e matou os dois civis brancos que nela sequiam. Foi um dia inquietante para todos nós, que cada vez mais sonhávamos com o regresso antecipado a Portugal e este acontecimento não era o melhor que poderia acontecer. Supostamente, terá sido um acto de ajuste de contas. E felizmente foi isolado! Mas que dores se sentiram nesse dia, e seguintes, que medos medraram na nossa alma!
A fotografia, na estrada principal do Quitexe (Luanda-Carmona), mostra-nos do regresso da morgue (?), onde fôramos ver os cadáveres, e deixa ver o cemitério da vila e o famoso Posto 5 - posto de vigia e «prisão militar» do Quitexe. Algumas (poucas) vezes lá conduzimos homens que a disciplina militar penalizou. Uma tarefa bem pouco agradável, vale a pena dizer!
- MIGUEL. Miguel Peres dos Santos, furriel miliciano pára-quedista, reside em Setúbal.

3 comentários:

Anónimo disse...

A morgue do Quitexe, de morgue nada tinha! Era uma simples divisão, onde autenticamente se despejavam os corpos sem um mínino de dignidade. Mas como sobre este assunto muito, e nada dignificante, haveria a dizer,é melhor ficar por aqui! Vamos com calma porque o dia até acordou bonito e avisto Kms de horizonte para abrir a alma.
Leio muito sobre o posto 5 mas não tenho ideia de ser usado no meu tempo. Acho que a malta se portava toda bem! Só se alguma coisa me escapa, mas tenho que perguntar à minha malta. Ah, lembrei-me agora que foi atacado de noite!Ora, nada de especial!
Ainda não contei, pois não?!
Contarei entretanto esta "afronta".
Casal

Alfredo Coelho disse...

Viegas; eu Alfredo Coelho(Buraquinho). com respeito à morgue e ao posto nº5,que era a prisão eu posso desvendar alguns mistérios,porque me diz respeito. 1º na tal dita morgue do Quitexe,que ficava ao lado do cinema do Quitexe os primeiros mortos a passar por minhas mãos, foram 7 pretos e 1 branco. Eles eram madeireiros e empregados do SALGADO, estavam na mata a cortar árvores quando foram surpreendidos pelos guerrilheiros da F.N.L.A. mataram-nos,despiram-nos,regaram-nos com um liquido inflamável, possivelmente gasolina,e chegaram-lhes o fogo. isto foi na zona do Líveráto. Quem os foi buscar fui eu,mais alguns militares que já não me recorda,troucemos num unimogue embrulhados em cobertores do exército, e expostos na morgue do Quitexe. Quando os militares saíram do cinema e tiveram conhecimento do sucedido,foi logo um corrupiu de curiosidade,para verem os corpos calcinados.e era eu, o Analista de águas,que descobria os cadáveres para eles verem. 2º com respeito ao posto nº5 que era a prisão do batalhão,de cavalaria 8423 perguntai ao inimigo quem somos,que ficava próximo do cemitério do Quitexe. Eu;Alfredo Coelho,analista de águas (buraquinho),era o delegado de saúde do posto nº 5 a tal dita prisão.E foi por ser quem era, que recusei em entrar na prisão,quando levei o castigo de 30 dias de prisão disciplinar agravada,e fui com o 1ºcabo da guarda ao comandante da companhia da c.c.s. que era o Capitão Oliveira,dizendo que não aceitava a prisão naquelas quatro paredes,por não ter as mínimas condições de higiene, e eu como delegado de saúde,espero que o meu capitão Oliveira me respeite,e mande retirar os presos da prisão para a enfermaria,porque eles estão doentes com o paludismo,devido à falta de higiene que lá existe.Caso o meu capitão não faça caso, eu tenho que comunicar ao capitão médico,para resolver o problema,uma vez que sou o delegado de saúde o senhor capitão tem que me respeitar.E então, os presos que eram cinco, um branco e quatro pretos,foram encaminhados para a enfermaria para serem tratados.Foram amarrados à cama da enfermaria até que a companhia do batalhão resolvesse a situação.Então arranjaram uma casa civil pegado à sala do soldado, com as condições,por mim aprovadas.E então, depois dos presos estarem devidamente curados regressaram à nova prisão, como eu; mas só lá fui dormir quatro noites,porque de dia estava de serviço à enfermaria por ordem do capitão Oliveira. VIEGAS,eu Alfredo Coelho, tinha muitas histórias para contar até, sobre aqueles dois civis que foram mortos numa picada de regresso a casa quando vinham das suas fazendas. eles foram encontrados mortos encostados ao jipe que conduziam com um balázio nas costas cada um,e com os seus anéis nos dedos,lembro-me como se fosse hoje.Viegas, por hoje é tudo.Um abraço deste teu grande amigo inesquecível.Alfredo Coelho o ( BURAQUÍNHO ).

Anónimo disse...

Esta foto traz-me à memória uma operação em grande escala efectuada bem no interior da mata.
Terreno quase virgem, as viaturas fizeram uma grande parte do percurso com os faróis acesos, apesar de estar-mos a meio do dia.
A parte mais operacional ficou a cargo dos Paraquedistas e com apoio aéreo. Penso ter sido a maior acção desenvolvida naquela zona e no meu tempo. Não é um tema muito agradável, principalmente porque o desfecho também não o foi para os Páras.
Curiosamente, foi nesta altura que me apercebi bem da nossa ingenuidade no terreno!

Casal