quinta-feira, 15 de setembro de 2011

1 005 - Um país novo e de si inimigo...

Os meus primeiros dias do Portugal europeu, chegado eu da ultramarina Angola que se preparava em parto para a independência, teve momentos de choque. E de surpresa! E de expectativa!!!
Tudo para mim era novo: o deslumbramento revolucionário, a capacidade reinvindicativa, as manifestações e os plenários, o azimute único para um caminho que eu desconhecia, umas coragens inflaccionadas que me arrefeciam a alma! E eu, por aí apanhado de surpresas, a querer entender as diferenças de um Portugal onde, nas ruas e nas praças, cantavam de raiva algumas G3 roubadas em quartéis, atirando sobre irmãos nossos, sangue nosso.
Eu chegava de Angola, que se violentava de Luanda para o norte - para o nosso Quitexe,a  nossa Carmona; de Luanda para o Cunene e para o Huambo, em guerra fraticida. De uma Angola em torrente abrupta de sangue, que sujava muitas mãos. Uma Angola que, irada ao rubro e violenta, atirava para Lisboa aviões de bojo grávido de gente mártir, que fugia, com uma mão à frente e outra atrás.
E que Portugal eu reencontrava?
Um Portugal diferente! Muito desigual, levedando esperanças de igualdade e liberdade.
Um Portugal já em V Governo, em prolongada e complexa crise de Verão Quente, que despertou fervores revolucionários e amordaçou muita gente - ameaçada com a grilheta das prisões. Otelo e o seu COPCOM a ameaçar, até que Vasco Gonçalves caiu, apesar da muralha de aço de que se rodeou e o segurou. Parecia-me, na minha inocência, que os políticos não eram mais que vendedores ambulantes de sonhos, mercadores de simpatia fácil e votos, exploradores da boa fé dos portugueses. Vinha de um sítio que entremeava esperança com a morte e chegava a outro, ao meu país, que parecia fazer-se de si inimigo.

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