terça-feira, 16 de agosto de 2011

Carta de um artilheiro de 75 anos aos Cavaleiros do Norte


Caros Camaradas
Cavaleiros do Norte:



O signatário deste comentário foi, no período de 1965/67, furriel do QP de Artilharia e, posteriormente, 2º. sargento, fazendo parte do QO da CART. 785, do BART. 786, que inicialmente foi colocada na Fazenda Liberato, depois em Santa Isabel e, na parte final da comissão, novamente no Liberato.
A nossa comissão no Sub-Sector do Quitexe, Sector de Carmona, foi uma duríssima provação de dois anos de operações intensivas, em que éramos utilizados por todas as cadeias de Comando, pois tínhamos que fazer serviços operacionais desde o escalão Companhia, passando pelas do Batalhão, do Sector e até ao nível das da RMA.
Éramos um "pau para toda o obra" e não nos pouparam em nada. Para fazerem uma ideia do real panorama que tínhamos pela frente, basta dizer-vos que, em muitos meses do ano, muitas, mas muitas vezes mesmo, papávamos 21 rações de combate, tipo EE, reforçando este quadro, ainda recordo o discurso feito na Unidade de Mobilização, pelo n/ 2º. Comandante, no fim da comissão:
"O nosso Batalhão, nos seus dois anos de missão, realizou trabalhos que um só homem levaria, sem parar, 44 anos a realizar".
Ao ler alguns "posts" do v/ blogue, reavivaram-se todas as imagens que, desde aquele tempo, me ficaram gravadas na memória e que estavam em stand by. Memórias de uma vida dura, cheia de riscos, em que palmilhámos difíceis itinerários com destino a diversas serras: Vamba, Quitoque, Pingano, Uíge e Quivinda e ainda os vales do Luége, Vamba, Loge, Dange, Sanda, etc., etc.!..., que configuravam o nosso calvário.
Mas, por incrível que pareça, há um estranho sentimento de saudade desse temmpo, não das circunstâncias em que se vivia e viveu, mas da camaradagem, espírito de corpo e amizades que se cimentaram e mantêm até hoje e que, ainda hoje, fazem com que os elementos dessa força expedicionária se reúnam em convívios anuais regulares.
Hoje, sou Sargento Ajudante de Artilharia, aposentado, já com os meus quase 75 anos, doente coronário (fiz um bypass em 1989), diabético insulino-dependente, mas espero ainda este ano ir encontrar-me, pela primeira vez, com os meus camaradas dessa memorável expedição a Angola e ao Quitexe.
Sem mais, os meus cumprimentos para o blogmaster e colaboradores dos Cavaleiros do Norte, assim como para todos os elementos do vosso BCAV., do camarada,
OCTÁVIO BOTELHO
(na foto)

1 comentário:

Luis Patriarca disse...

Meu caro Octávio Botelho. No meu caso e com toda a certeza todos nós que por lá passámos partilhamos dos mesmos sentimentos que expressou no texto.
Pertenci ao BCAV 1917 e à Comp. 1707 que vos substituiu no Liberato e talvez ainda se lembre da operação de sobreposição creio que na Serra do Pingano em que levávamos um guia capturado penso que pela vossa companhia com a intenção de nos levar a atacar e destruir uma central IN que lá havia. Foi para nós um baptismo de fogo terrível e para vós que estavam de partida, ocasião para lá perderem mais algum companheiro como aquele que meses antes tinha ficado na picada.
Por sorte não houve nem mortes nem feridos apesar da operação como já referi ser de grande envergadura.
Estas e outras situações fizeram com que a entreajuda criasse e cimentasse amizades que nunca mais poderão ser esquecidas.
Luis Patriarca ex-segundo sargento miliciano.