sábado, 30 de abril de 2011

Fim de férias e novidades em Carmona...

Furriéis Cruz e Viegas, no separador ajardinado da avenida do Quitexe. Atrás, vê-se o alferes Ribeiro e o bar dos praças. O coberto, serviu de espaço para as aulas regimentais

A 30 de Abril da 1975, uma quarta-feira, acabou-se a nossa boa vida - minha e do Cruz. Foi o útimo dia de férias e voámos de Luanda para Carmona no avião do fim da manhã, com tempo útil de chegada para almoço. Inevitavelmente, no Escape, restaurante da Rua do Comércio, que era poiso habitual da tropa. Por lá já estava o Neto e pusemos a conversa em dia:
1 - A 1ª. Companhia (do capitão Castro Dias), a de Zalala, tinha mudado para o Songo, com um destacamento em Cachalonde. Tinha transitado, a 21 de Novembro de 1974, de Zalala para Vista Alegre e Ponte do Dange, duas povoações da estrada do café, a de Carmona a Luanda. Delas saíram a 24 de Abril.
2 - A 2ª. Companhia (do capitão José Manuel Cruz), a de Aldeia Viçosa, saiu a 26 de Abril e foi instalar-se em Carmona. 
3 - O alferes Meneses, a 13 de Abril, detivera elementos do MPLA e da FNLA que se tinham envolvido em tiroteio na cidade. Tal acto, corajoso, valeu-lhe um louvor.
4 - As eleições tinham decorrido normalmente, sem muita gente (militar) a votar.
5 - A rotação feita no BCAV. 8423 deveria ser a última, até ao terminar da comissão.
E sabia-se quando íamos embora?
Pois, nada se sabia.
Sabia-se, e a voz era do Neto, é que haviam momentos tensos na cidade, se mantinham as diferença da sociedade civil para com os militares; que os militantes da FNLA e do MPLA, e agora já também alguns da UNITA, não se entendiam - nem à lei da bala.  Que eles mesmos não entendiam muito bem o papel das Forças Armadas Portuguesas. Que a situação de calma era... fictícia.
Portanto, para quem chegava de férias, um bom enredo para os filmes das próximas semanas!
- MENESES. Manuel Meneses Alves, alferes miliciano de cavalaria. Transitou do Batalhão de Caçadores 4519/73, que concluíra a comisssão em Cabinda, onde esteve em rendição individual. Chegou à 2ª. CCAV. 8423 em Fevereiro de 1975. Empresário, em Leiria. Ver AQUI.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

O "truque" de escuteiro do (futuro) alferes Sousa



Furriéis Louro , Rodrigues, Nascimento, Barata e Barreto e
 alferes Sousa e Lains dos Santos, gente de Zalala


Zalala era um "buraco", a uns 60 quilómetros do Quitexe (falo de memória), aonde se chegava por uma picada cheia de mistérios, de perigos e de medos. Uma picada mítica, pela qual muito sangue se amassou em lama com o pó vermelho de Angola. 
Os Cavaleiros do Norte já não viveram os dramas e tragédias de 1961 e anos seguintes, mas não foram «dispensados» de muitos amargos de boca e de alguns sustos. Por alguma razão lhe chamavam «a mais dura escola de guerra».
A foto que o Rodrigues me enviou mostra um grupo de bons companheiros Cavaleiros do Norte, de Zalala, companheiros de amizade e solidariedade semeada por Santa Margarida - e ainda por lá nascida... . e por Angola crescida e multiplicada. Mostra um dos muitos momentos de convívio que sempre existiu entre furriéis e alferes da 1ª. Companhia.
A mim, pessoalmente, sublinha-se-me o alferes Sousa, dele puxando de memórias de quase 38 anos, quando, ele cadete e eu instruendo, malhámos com o corpo no duríssimo curso de Operações Especiais, os Rangers!!!, em Lamego. Memórias de uma noite de Agosto de 1973, quase apostava que de 15 para 16, no decorrer de uma operação de instrução nocturna que levou cadetes e instruendos em provas de individuais, a galgarem a mais vária malha de obstáculos.
Saímos nós de Penude (o quartel), atravessámos a cidade que gorgitava de divertimento e marchámos em asfalto até um qualquer sítio da estrada para Régua - onde, noite cerrada e separados por minutos, íamos sendo largados individualmente.
Achámo-nos, eu e ele, num qualquer sítio onde tínhamos de trepar uns 3 ou 4 metros a pique - tipo de rapel, mas ao contrário. E como subir? As cordas de sisal no chão, cortadas, tinham dado subida a quem nos antecedera, mas de nada nos ajudavam agora. A solução foi proposta pelo Sousa, suponho com estratégia aprendida nos escuteiros: dobrou-se uma árvore, segurei-a eu quanto pude, trepou ele e saltou o obstáculo. Depois, amarrou as cordas em cima e subiu eu. E, atrás de nós, não sei quantos mais.
Não sei se o Sousa nos lê. Mas se lê, fique sabendo que aqui estou a recordar esta peripécia com os cabelos a arrepiarem-se-me!!! Emocionado!
Assim, desta e outras maneiras, se moldava a camaradagem  e nos preparávamos para enfrentar quaisquer obstáculos que a guerra nos pusesse diante dos nossos medos, da nossa generosidade e da nossa, deixem-me dizer, da nossa coragem.
- LOURO. José dos Santos Louro, furriel miliciano atirador de cavalaria, morador em Évora.
- RODRIGUES. Américo Joaquim da Silva Rodrigues, furriel  miliciano atirador de cavalaria, residente em V. N. de Famalicão.
- NASCIMENTO. José António Moreira do Nascimento, furriel miliciano de alimentação.
- BARATA. Jorge António Eanes Barata, furriel miliciano atirador de cavalaria.
- BARRETO. Jorge Manuel Mesquita Barreto, furriel miliciano enfermeiro, funcionário público aposentado, residente em Rio Tinto (Porto).
- SOUSA. Mário Jorge de Sousa Correia de Sousa, alferes miliciano de Operações Especiais.
- SANTOS. José Manuel Lains dos Santos, alferes miliciano atirador de cavalaria, residente em Alenquer.
Ver AQUI.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

O carro do militar que andou pelo ar nas mãos do povo...

Neto, Viegas, Matos e Monteiro, num carro de combate do RC4

A 26 de Abril de 1974, o BCAV. 8423, considerou-se «parte integrante do Movimento das Forças Armadas» e nesse dia, uma sexta-feira, o comandante Almeida e Brito «explicou a todo o pessoal» o que o movimento pretendia, em «palestras orientadas especificamente para oficiais, sargentos e praças».
Confesso que me escapa na memória o teor preciso da intervenção, mas tenho presente a euforia do momento em que todos fomos dispensados para fim de semana, o que não estava previsto - pois o que se deveria realizar a partir da 2ª. feira-seguinte o IAO.
Ao final do almoço, saímos de Santa Margarida para Águeda, no SIMCA 1100 do Neto, dando boleia ao Matos (da 2ª. CCAV), que era de Anadia e à porta dele passávamos nós, em Avelãs de Caminho. E ao Monteiro, que de Águeda seguiria para o porti e daqui para Marco de Canaveses.
A viagem, nas estradas do tempo, era algo morosa e lenta, batiam-nos palmas quando nos reconheciam militares, mas o espanto maior viria a ser em Coimbra - onde, na baixa, decorria uma manifestação com milhares de pessoas.
A passagem do trânsito era feita a velocidade menor que o passo, a certa altura os populares descobriram que dentro do SIMCA 1100 iam militares e, quando demos por ela, o carro foi levado no ar alguns metros, à força das mãos e do entusiasmo dos manifestantes. Foram uns três, quatro metros, em frente ao Hotel Astória, e esse momento, foi, porventura, aquele em que sentimos mais apaixonadamente a euforia que deslumbrava o povo.
Chegado à aldeia, soube que minha mãe andava no campo, a sachar milho. «Então, rapaz?!...», perguntou-me,quando me avistou. Ainda esta tarde, ambos recordámos esse momento. Disse-lhe que estava tudo bem, não lhe despindo, com a resposta, o luto que lhe ia na alma. E muito menos o faleci a Nilzalina, vizinha da terra e da sacha do milho, também ela viúva e mãe de António Melo - conterrâneo e amigo, do meu ano e escola, que nessa altura jornadeava pela Guiné.
« Tiveste sorte, já não vais...», disse-me ela, com o ar resignado de mãe que tem um filho na guerra.
Claro que fui. Para Angola. 

quarta-feira, 27 de abril de 2011

O primeiro aniversário e as primeiras eleições depois de Abril

Parada do BC12, em Carmona (anos 70 do século XX).
Ali se votou a 25 de Abril de 1975

O 25 de Abril de 1975, em Carmona, foi vivido na paz dos anjos e com o BCAV. 8423 a colaborar com «o processo revolucionário de Portugal», assim leio no livro da Unidade. Nesse dia, dia em que se fazia um ano da revolução militar e já com tantas águas passadas sob e sobre as labaredas revolucionárias, também se votou em Carmona, entre a guarnição.
«Verificou-se a ida às urnas de todo o pessoal que o quis fazer», relata o Livro da Unidade. 
Dias antes - a 16, 23 e 24 de Abril - tinham-se realizado palestras  sobre o acto eleitoral, orientadas por oficiais do Comando Territorial de Carmona (CTC) e do BCAV. 8423, ambos delegados do MFA. A 21, o brigadeiro comandante do CTC esteve no BCAV. 8423, acompanhado do seu Chefe do Estado Maior - com cerimonial que envolveu uma formatura geral na parada do BC12 (foto).
O dia 25 de Abril, para além do acto eleitoral para a Assembleia Constituinte, foi assinalado com «cerimónia simples mas singela», no CTC, com o içar da bandeira nacional e honras militares, na presença de todos os oficiais do mesmo CTC e do BCAV. 8423.
Assim se festejou o primeiro ano do 25 de Abril, em Carmona. Por Luanda, em devaneios de juventude, eu e o Cruz continuávamos a gozar as nossas férias. 

terça-feira, 26 de abril de 2011

A madrugada do 25 de Abril na caserna da CCS

Rodiolfo Tomás, 1º. cabo rádio-montador da CCS do BCAV. 8423 e alferes miliciano Garcia (em baixo)





RODOLFO TOMÁS
Texto
Há 37 anos, na noite de 24 para 25 de Abril de 1974, pensando na partida para terras africanas, nem sonhavámos no que estava para acontecer.

Estávamos em Santa Margarida, a formar Batalhão para irmos para Angola, e, de certa forma, até tinhamos vaidade em trazermos no cimo do ombro, colocado no blusão, a etiqueta "Angola".
Foi numa quinta-feira que aconteceu o 25 de Abril. Nós, a CCS do BCAV. 8423, estávamos instalados num daqueles (maravilhosos) pavilhões, que eram muito peculiares no campo militar de Santa Margarida. Estranhámos, eu estranhei, ser acordados às 6,20 horas,  por um jovem alferes miliciano que, de G3 na mão, abriu um dos portões daquele rectângulo coberto a que chamavam caserna. Depois, ouvimos a culatra ser puxada atrás e de imediato a bala entrar na câmara e serem disparados dois ou três tiros (?).
O jovem alferes, além de ter assustado quem estava no sono mais profundo, pôs tudo em alvoroço.
«Está a levantar, está a levantar rápido!!!... Quero tudo lá fora dentro de cinco minutos!...», gritou ele.
É evidente que nem todos «obedeceram» à ordem, mas os que fingiram não ter ouvido tiveram pouca sorte. De imediato o jovem alferes resolveu o problema: aproximou dos beliches, meteu o ombro na cama de cima e foi só tombar. Resultou mesmo, ficaram logo caídos no chão. Só depois, na parada, de terra e buracos, nos foi dito o que se estava a passar. Tinha acontecido uma revolução em Lisboa e o resto do país estava em suspense. Desde esse dia fiquei a saber que os dorminhocos estavam tramados com esse jovem oficial. Também desde esse dia fiquei com a impressão que me ia dar muito bem com ele, pois não brincava em serviço. Era o aspirante a oficial miliciano, o futuro alferes Garcia.
RODOLFO TOMÁS

segunda-feira, 25 de abril de 2011

A madrugada do 25 de Abril na 1ª. CCAV. 8423

A 1ª. Companhia, no 25 de Abril de 1974, num destacamento do Campo Militar de Santa Margarida.Da esquerda para a direita e à frente, o radiotelegrafista (?), alferes Santos, furriéis Queirós e  Rodrigues com elementos do 1º. Pelotão da 1ª CCAV.

A noite de 24 para 25 de Abril tocou ao Rodrigues de Famalicão estar de sargento dia no Destacamento do RC4, onde se instalava o BCAV. 8423, a fazer vésperas de embarcar para Angola.
A caserna era gigantesca, mas só para soldados e cabos, já que os restantes graduados continuavam no RC4 e só permaneciam ali durante a noite, por escala de serviço. Foi o caso do furriel Rodrigues, que aqui vem recordar essa noite, na primeira pessoa:
Não preciso as horas, mas relativamente cedo, tinha-me deitado na cama da casa da guarda, envolvi-me nos cobertores e tentei dormir, depois verificar que estava tudo em ordem. Não passou muito tempo e tenho o cabo da guarda a acordar-me e a dizer que estava ali o Comandante.
«Vai chatear o car…. », gritei-lhe eu, pensando que o cabo, por estar sozinho, queria era companhia, para não adormecer e passar o tempo.
Tinha acabado de blasfemar desta maneira e tenho à porta da casa da guarda o Comandante Almeida e Brito que me disse: «Vê se tens calma, vai à caserna e manda formar toda a companhia, com o devido armamento, imediatamente...».
Agora, imaginem ir acordar toda a 1ª. Companhia do Batalhão 8423. Quando cheguei à caserna, ouvi o que eu tinha dito ao cabo multiplicado por não sei quantas vezes. Ouvi muitas e das boas e ninguém se mexia. O comandante, estranhando a demora, deslocou-se à caserna e aí, sim, o pessoal tremeu todo e o meu trabalho ficou facilitado.
Entretanto, os restantes graduados começaram a chegar ao destacamento e a organizar os respectivos pelotões. Depois de variadas situações, como equiparmo-nos com todo o material e armamento, distribuição de munições e uma série de manobras militares, alguma confusão no comando e incerteza nas ordens dadas, assim passámos a noite e só pelas 6 horas da manhã, soubemos exactamente o que estava em marcha.
Ver AQUI.

domingo, 24 de abril de 2011

Os dias 24 de Abril de 1974 e 1975


Aeroporto do Lobito (em cima). Futuros furriéis Monteiro, Neto e Viegas, na messe de sargentos do RC4 - dias antes do 25 de Abril de 1974 (em baixo)
 


A 24 de Abril de 1974, depois de mais um dia de instrução, fomos nós - os habituais «compinchas» do SIMCA 1100 do Neto - de rota batida até Abrantes, por onde ao tempo, era famoso o frango de churrasco de um restaurante. Saímos no fim do dia, ainda o sol caía aberto sobre o Campo Militar de Santa Margarida, de «dispensa» na mão e para uma noite de borga.   
Por lá nos demorámos umas horas, regressando ao RC4 - que ao outro dia, dia seria de instrução. Voltámos lá pela meia noite e a falar, todos gaiteiros, de miúdas e de Angola - para onde iríamos partir dentro de semanas. 
No mesmo dia de 1975, voei eu e o Cruz de Lobito para Luanda, assim como voavam as nossas férias. Lá fomos nós, de Friendship (seria?), apanhando um brutal cagaço à chegada a Luanda, por causa de um poço de ar - quando sobrevoávamos Catete.
Luanda recebeu-nos ao fim da tarde, como sempre bela e cosmopolita mas com registo de vários incidentes. Assim me contou Rebelo Carvalheira, à porta do jornal A Província de Angola e antes do jantar no Paris Versailles.
Ao outro dia, seriam as primeiras eleições pós-25 de Abril. As Constituintes.

sábado, 23 de abril de 2011

O início da IAO na Mata do Soares, em vésperas do 25/A


A 22 de Abril de 1974, uma segunda-feira, os futuros Cavaleiros do Norte voltaram a encontrar-se em Santa Margarida, no Destacamento do RC4, depois de gozadas as chamadas Licenças de Normas - os famosos 10 dias de férias, antes do embarque para os teatros de guerra.
As ditas férias tinham sido de 18 a 28 de Março, mas foram prolongadas, por razões que agora me escapam. Na verdade e com algumas intermitências de serviços, foram prolongadas até esta data.
O objectivo imediato era realizar a chamada IAO, que nos iria levar pela Mata do Soares - em exercícios que «simulavam» a guerra e, nalguns casos, já com munições reais. Foi o caso do PELREC, que fez de IN nos dias em que as companhias operacionais testaram a sua eficácia, a sua ligeireza estratégica, as suas virtudes militares, o seu adestramento operacional.
«O sangue da instrução é sangue que não corre!», assim se falava, como preparação psicológica, aos soldados que se preparavam para a guerra do chamado ultramar - recebendo instrução que os transformava em soldados atiradores de cavalaria.
Outros slogans eram «O soldado português é dos melhores do mundo», ou «O Exército português é o espelho da Nação», também «Honrai a Pátria que a Pátria vos contempla", sugerindo o patriótico «Benditos filhos que tal Pátria tem». E os inevitáveis aprumo e atavio, pontualidade e vontade firme, dedicação e interesse, disciplina e respeito total, tudo para "Querer e saber vencer».
Mal sabíamos nós que estávamos em vésperas do 25 de Abril - a 5ª.feira imediatamente seguinte.
- IAO. Instrução Altamente Operacional, ou Instrução de Aperfeiçoamento Operacional. Antecedia, imediatamete, a partida de tropas para os palcos de guerra.
- IN. Inimigo, em gíria militar.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Problemas no Uíge e troca de prisioneiros no Úcua

Entrada de Úcua, actual (em cima) e mapa com esta vila
e algumas das localidades em que esteve o BCAV. 9423 


A 22 de Abril de 1975, vadiava eu com o Cruz pelas praias do Lobito - e arredores!!! - e pelo norte cafeícola e aguerrilhado, os companheiros Cavaleiros do Norte viam-se «em palpos de aranha» com os comportamentos dos independentistas da FNLA e MPLA, e esporadicamente os da UNITA, que teimavam em não se entender e por lá nadavam às turras e aos tiros, sem quererem, ou a não entenderem o papel das NT.
A esse dia, e cito o Livro da Unidade, realizou-se uma reunião a nível mais elevado, com elementos do Gabinete Militar Misto, «na procura de obter para o Uíge a tal calma aparente e o entendimento entre todos os movimentos». Não sei o que nela se passou, mas a verdade é que - e volto as citar o Livro da Undade - tal reunião originou «um patrulhamento ao Úcua, com vista a fazer-se uma troca de prisioneiros»  que, sem êxito, já havia sido tentada na véspera. Não me lembro, nem consegui agora apurar, de que prisioneiros se tratava. Muito provavelmente, seria elementos dos movimentos.
A sul, com o mês de Abril a finar-se e as férias já a encurtarem as mangas (os dias...), lá andámos (o Cruz e eu) a amorenar-nos pela restinga do Lobito e pela Baía Farta e a dar uns saltinhos à Catumbela, à Baía Farta e Cubal - mimados de gentilezas pela família dele.
O sul angolano era um paraíso!
- CRUZ. António José Dias Cruz, furriel miliciano rádio-montador. Natural de Cardigos e residente em Lisboa.
- NT. Nossas Tropas.
- SBELL. Sociedade de Bebidas Espirituosas do Lobito, Lda. Fábrica de whisky e outras bebidas alcoólicas.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O fado do ceguinho e as revistas de Zalala


O que a malta não inventava, para passar o tempo, que não nos matava saudades, antes as multiplicava por cada dia que se cortava no calendário.
Inventava-se tudo, desde um bom desenfianço para a cidade, a uma furtiva soneca, ou a  uma tarde de cartas e  cerveja gelada no bar.
Por Zalala, seria ainda menos fácil passar o tempo, que no Quitexe. E o que faziam os furriéis Rodrigues (à esquerda, na foto) e Pinto (à direita) para ultrapassar isso? Pois punham-se a cantar o fado do ceguinho e a vender revistas.
Vejam lá o que se inventava para, como lembra o Rodrigues, «tentar esquecer as tristezas, as saudades, a família, o sofrimento e sei lá que mais...».
Tudo disse havia por aquelas bandas e a farsa revisteira dos dois furriéis não era, claro, para vender nada, não era essa a intenção, mas antes para puxar a farra e a diversão, numa «feira» - a de Zalala -  em que a possível clientela não passava, afinal, de uma companhia de "tesos".
Se eventualmente aparecesse algum potencial comprador, algum fulano mais desprevenido e com alguns trocos no bolso, curioso e convencido, achado de surpresa ou «apanhado do clima», interessado na compra ou que não entendesse bem a intenção da dupla, a resposta era sempre a mesma. «Lá lhe dizíamos que só tínhamos estas, que eram o mostruário, que o stock está esgotado», recorda o Rodrigues, evocando a mordacidade dos brincalhões de Zalala.
O mais corriqueiro dizer, a algum mais insistente e putativo comprador, era que «só daqui a seis meses é que vamos receber nova remessa».
Assim, a brincalhar, ajudando uns aos outros ou chateando, a dupla de cantores (ceguinhos) percorria as casernas e outros pontos do aquartelamento, quebrando a rotina, tentando transmitir os seus e outros sentimentos, colaborando nos diálogos que ocorriam e que eram sempre iminentes para todos - num lugar como aquele, que era Zalala.
O resultado do negócio era sempre saldo negativo nas contas de vendas, porque a contabilidade estava fora de questão, quanto ao deve e haver, mas nos resultados sociais atingia sempre o pico, pois toda a gente reconhecia e aplaudia a dupla de brincalhões que apalhaçavam a guarnição, que socializava e cordializava as gentes que por lá «morriam» de saudades dos chãos e dos cheiros das suas terras.
«Era esse o nosso objectivo. Bebiam-se umas cucas e não se queria saber da "revista" nenhuma.Todos estávamos no mesmo barco...», recordou o Rodrigues, agora morador em Vila Nova de Famalicão.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Incidentes no Negage e viagem no caminho de ferro de Benguela

Aeródromo Base n 3. (em cima) e quartel do Negage (em baixo)


A situação de calma, fictícia, como aqui já se falou, que se vivia no Uíge angolano foi de novo quebrada a 20 de Abril de 1975, hoje se fazem 36 anos. No Negage, cidade que distava 37 quilómetros de Carmona e onde se localizava o Aeródromo Base nº. 3 e (se me lembro bem) um hospital militar.
A guarnição do Batalhão de Caçadores 4741, ali estacionada, estava sob tutela operacional do BCAV. 8423 desde 17 de Março e os incidentes entre MPLA e FNLA de faz hoje 36 anos implicaram pronta intervenção das nossas tropas - que a todo o custo, como sempre, queriam evitar derramamento de sangue e, necessariamente, proteger a população civil.
A situação, ao que leio no Livro da Unidade, obrigou à realização de uma reunião de emergência com a FNLA - que era a força militar dominante na região -, de modo a «obter uma mentalização do que deverá ser a missão das NT e dos Exércitos de Libertação, neste período que decorrer até à independência».
Mais para o sul, eu e o Cruz, vivíamos uma experiência inesquecível: viajar no caminho de ferro de Benguela, de Nova Lisboa até ao Lobito. Por lá tinha o Cruz família e eu, aos meus costumes, ia fazer uma surpresa a um meu amigo, ao Zé Pimenta - companheiro de escola (em Águeda) e furriel «Ranger» do curso imediatamente a seguir ao meu, de 1973, em Lamego. Assim foi.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Os primeiros incidentes militares em Nova Lisboa...

Escola de Aplicação Militar de Angola, em Nova Lisboa (anos 60). Em baixo, furriel Viegas de férias nesta cidade (em 1975), com madrinha Isolina Neves




A 19 de Abril de 1975, andava eu por Nova Lisboa em angolanas férias, desfrutando (com o Cruz, o furriel) do cosmopolitismo de uma cidade que Norton de Matos quis fazer capital de Portugal, e, pelos uíges da nossa tropa, repetiam-se incidentes entre militantes armados do MPLA e da FNLA.
Lá pelo planalto huambino, tudo, porém, parecia um paraíso e por um destes dias avantajei-me em petiscadela que meteu moelas e moambas, no bar-restaurante que o Lando tinha nas imediações do da Escola de Aplicação Militar de Angola e do RI21, ao Bairro de Santo António. E falou-se do movimento revolucionário que incendiava Portugal, das consequências da próxima independência de Angola e de como, nesse quadro, seria a vida dos portugueses - os brancos! Estranhamente, para mim, toda a gente tinha uma enorme confiança e nada de cultivar preocupações quanto ao futuro.
O sul de Angola, na verdade, estava livre de problemas, não havia guerra, que era «coisa lá dos gajos do norte» - da zona do café, do Uíge, nos Dembos, no  Leste, embora o sangue já há muito regasse as ruas de Luanda e outras cidades. Eu mesmo vivi esse clima de paz sulista, nas viagens de milhares de quilómetros que se faziam sem necessidade de qualquer segurança  - de Luanda à Gabela, a Nova Lisboa, ao Lobito, a Benguela, a Novo Redondo, Sá da Bandeira e Moçâmedes. Ou a Carmona, a Salazar. 
Mas num destes meus dias de Nova Lisboa registaram-se os primeiros primeiros incidentes e uma turba de angolanos armou escaramuça na avenida da República, pertíssimo do Ruacaná - onde eu fui ao Cinema, com minha madrinha Isolina.E no bairro de Santo António, perto do RI 21 e da Escola Prática Militar de Nova Lisboa. Foram um «aviso» para o que se seguiria nos meses seguintes, pelos julhos e agostos fora, setembros e outubros de muitas dores, na guerra civil que arrasou a cidade e muitas outras.
- LANDO. Orlando Tavares Rino, conterrâneo que era comerciante em Nova Lisboa -no Bairro de Santo António. Reside e trabalha em Rio Grande (Brasil).
- ISOLINA. Maria Isolina Pinheiro das Neves, já falecida e ao tempo viúva de meu padrinho Arménio Pires Tavares, vítima de acidente no Dondo e sepultado no cemitério de Gabela (Angola).

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Memória do Alferes Garcia em Pombal de Ansiães


 
Cruz, o nosso alferes das mecânicas e dos autos, foi este fim de semana  em romaria de saudades até Pombal de Ansiães e por lá buscou memórias de Garcia. Não lhe era difícil, por lá andou a «mais que tudo» dele, no último quartel dos anos 70, em medicina de periferia, e por lá conheceram ambos gente do sangue e da alma do (nosso alferes) Garcia.
Garcia, o alferes Ranger, de resto, por lá lhe arranjara (nesse tempo) acomodação em casa de gente amiga e por lá andou Margarida, flor de primavera do coração de Cruz, a medicinar o povo de Ansiães.
Cruz estivera, de resto, com (o alferes) Almeida) no dia de amores maiores de Garcia, embriagado em banhos de amor com a sua Olga - no dia do casamento - e não lhe seria difícil por lá achar gente do seu sangue. A terra não é grande, Pombal de Ansiães! A família é conhecida. Gente agarciada apareceria. E apareceu!
E não é que o destino, ai o destino!!..., não é que o destino por lá cruzou e aproximou emoções e afectos e  juntou Olga, de férias pascais e precisamente no fim de semana de ontem? Pois assim foi!

O dia de ontem, de resto, era de festa na ARCPA, que o nosso Garcia fundou - com prova de vinhos a que se juntaram (o alferes) Cruz e Margarida (sua «mais que tudo»), degustando os néctares afrutados e adamados dos produtores da terra. Orfeonistas da Universidade de Bragança animaram a prova e, por isso ou por aquilo, toda a gente de Pombal se encontrava reunida na associação. E por lá se achou Olga Garcia.
Conta (o alferes) Cruz:
«Falei com ela e com familiares e amigos e foi muito grato para mim ver como ele deixou boas recordações e como a sua falta continua a ser muito sentida».

Um dia, já depois do inesperado desaparecimento de Garcia, nos anos 80, por lá passei eu, por casa dos pais (com eles conversando) e pela frente da associação - dele nos falando as pessoas como se ele por ali estivesse a ouvir a conversa e a rasgar aquele infinito sorriso juvenil que lhe embebecia o rosto atransmontado. E daquela gente ouvi, em conversa de rua, a melhor homenagem que pode ter quem parte: a palavra de saudade, o elogio da memória,  a alegria de o ter e lembrar como amigo e homem bom.
Diz-me (o alferes) Cruz que, por todos nós, por todos os Cavaleiros do Norte que dele fomos amigos e companheiros em Angola, deixou um ramo de flores no seu jazigo do cemitério de Pombal de Ansiães.
Até um destes dias, amigo!
- GARCIA. António Manuel Garcia, alferes miliciano de Operações Especiais (Rangers), comandante do PELREC. Natural de Pombal de Ansiães (Carrazeda de Ansiães), era inspector da Polícia Judiciária quando faleceu, vítima de acidente de viação, a 2 de Novembro de 1979.
- CRUZ. António Albano Araújo de Sousa Cruz, alferes miliciano Mecânico-Auto, comandante do respectivo pelotão. Engenheiro, natural e residente em Santo Tirso.
- ARCPA. Associação Recreativa e Cultural de Pombal de Ansiães, fundada por António Manuel Garcia. A foto de acima foi ontem tirada por António Albano Cruz, na sede da ARCPA - que, com ela, homenageou o seu sócio-fundador nº. 1.

domingo, 17 de abril de 2011

O Pelotão de Morteiros 4281partiu há 37 anos

Valdemar e Pagaimo (em cima) e alferes Leite, comandante
do Pelotão de Morteiros 4281 



O Pelotão de Morteiros 4281 foi nosso companheiro da jornada quitexana e chegou a Luanda a 17 de Abril de 1974 - hoje se fazem 37 anos!  Era comandado pelo alferes Leite, açoreano que agora faz a vida pelos Estados Unidos. Com os furriéis Pires e Costa. O inimitável Costa! O pelotão «acampou» uma semana no Campo Militar do Grafanil, nos arredores de Luanda, antes de galgar os 320 quilíometros que, em estrada de asfalto, os levou até ao Quitexe - onde encontraram o Batalhão de Cavalaria 4211 como anfitrião. E anfitrião seria do Batalhão de Cavalaria 8423, que o rendeu a 6 de Junho do mesmo ano de 1974.
O Pelotão de Morteiros acamaradou com os Cavaleiros do Norte na guarnição do Quitexe - onde partilhou espaços, dividiu serviços e multiplicou companheirismo. Abandonou a vila a 20 de Dezembro de 1974, indo para Carmona - onde cumpriu comissão até Março seguinte, qundo partiu para Luanda e se voltou a instalar no Grafanil, antes de regressar a Lisboa.
Registe-se o favor, agradabilíssimo, de o Pelotão de Morteiros 4281 tão ter registado quaisquer feridos ou mortos na sua campanhaha angolana.
Ver AQUI.
E AQUI.

sábado, 16 de abril de 2011

Palestras sobre as eleições para a Assembleia Constituinte de 1975


A 16 e 23 de Abril de 1975 realizaram-se, em Carmona e no BC12, palestras sobre as primeiras eleições pós-revolução de 1974. As eleições para a Assembleia Constituinte. A ideia era preparar o pessoal militar para o acto de voto, no qual naturalmente, todos se iam estrear. De Portugal, pelo correio pessoal e pela leitura do Jornal de Notícias e do Expresso, chegavam informações que nos confundiam.
«Como é que correu isso por aí?», perguntei eu ao Neto, em telefonema combinado - feito a partir de Nova Lisboa e para a messe de sargentos do Montanha Pinto (anteriormente de oficiais), que dispunha de telefone da rede civil. 
«Ó pá, estiveram para aí uns gajos a matraquear, foi só paleio, democracia, liberdade, não sei mais o quê... acho que a malta não ligou muito», disse-me o Neto, mais preocupado, isso sim, com o aumento de patrulhamentos mistos na cidade e nas vias de acesso. «Anda malta por aí a dar o berro!!!...». 
A campanha eleitoral começara no dia 2 de Abril e, por Angola, vinha de dias antes (8 de Abril) um novo acordo de cessar fogo, entre os três movimentos nacionalistas angolanos, que, a exemplo de outros - antes e depois... -  também não foi respeitado. O Alto Comissário acusou o MPLA de ser o principal responsável por entregar indiscriminadamente armas a civis. O MPLA pediu a demissão do Alto Comissário. Era o almirante António Silva Cardoso, que tomara posse a 28 de Janeiro de 1975 e cessou o mandato a 2 de Agosto do mesmo ano. Sucedera António Alva Rosa Coutinho e foi interinamente sucedido por Ernesto Ferreira de Macedo. Este, por sua vez e logo no dia 26, foi sucedido por Leonel Cardoso - o último.

Em Lisboa, a 16 de Abril desse 1975 que lá vai, o Conselho de Ministros decidiu «expropriar, no sul do país, as propriedades de sequeiro de área superior a 500 hectares e as propriedades rústicas de área superior a 50 hectares». Começava a reforma agrária.
Por Nova Lisboa, onde passeava férias com familiares e amigos, o meu «aviso» aumentava: «Vão-se embora!...». Não fui ouvido pelos  Neves Polido. Nem por qualquer dos conterrâneos que por lá faziam pela vida.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Alguma malta dos furriéis da Companhia de Zalala



Pinto, Velez e Rodrigues (furriéis), 1º. sargento Panasco e  (furriéis) Queirós, Vitor Costa (em pé), Aldeagas e Nascimento (sentados)


ZALALA, Bar dos Sargentos, tempo de alaguma folia nos meados de guerras.
O Pinto foi meu companheiro em Lamego, depois em Santa Margarida e Angola, eu na CCS, ele na 1ª. Companhia. Um bom camarada, sempre pronto a participar nas horas difíceis e de perigo, ou num convívio no bar, sempre da mesma forma. O Rodrigues fala-nos aqui destes Cavaleiros de zalala.
- VELEZ: Chegou mais tarde à 1ª. Companhia, cheias de ideias e autoridade. Ficou no quarto do Pinto - que tratou de o «adaptar» ao ambiente zalaliano. Deu-lhe a volta e reparem no que o transformou: um bom camarada como o ele (o Pinto, tipo pirata) mas sempre com respeito com os mais velhos.
- RODRIGUES:  É evidente que eu não sabia tocar viola, mas naquela Zalala toda a gente tocava e, em cada reabastecimento, os  furriéis sabiam que tinham que trazer cordas para a viola. Um dia, morreu (a viola) numa briga, neste bar e na cabeça de furriel. Nunca mais foram precisas as cordas e nunca mais tivemos viola na Companhia.
- PANASCO: 1º. Sargento Alexandre Panasco. Fomos muito impertinentes com ele. A diferença de idade era muita e não sabíamos o que era ter filhos e, por isso, não reconhecíamos os seus sentimentos. Mas sempre o tratámos com o maior respeito. Hoje, percebemos bem o seu ar ausente e de sofrimento, por estar afastado da família.
- QUEIRÓS: O homem da cantina e de Braga, meu camarada de quarto.
- COSTA: Foi um professor, em Zalala, à noite e na cantina, para os soldados poderem fazer a 4ª. classe, porque eram muitos que não tinham essas habilitações.
- ALDEAGAS: Forcado de touros alentejanos, um potencial de força física e bom camarada.
- NASCIMENTO: Vago-mestre, o «sempre complicado» a fazer contas ao "rancho". Quase nos matou com a ementa persistente de arroz de tomate e carapau pôdre.


- PINTO: Manuel Moreira Pinto, furriel-miliciano de Operações Especiais (Ranger´s). Natural de Penafiel e residente em Paredes, onde é empresário do sector automóvel. Ver AQUI.
- VELEZ. Vitor Manuel da Conceição Gregório Velez, furriel miliciano atirador de cavalaria, empresário em Lisboa. Ver
AQUI
- RODRIGUES. Furriel miliciano atirador de cavalaria, natural e residente em Famalicão.
- PANASCO. Alexandre Joaquim Fialho Panasco. 1º. sargento de cavalaria, responsável pela secretaria da 1ª. CCAV. 8423.
- QUEIRÓS. Furriel miliciano atirador de cavalaria, natural e residente em Braga, aposentado. Ver AQUI.
- COSTA. Vitor Moreira Gomes da Costa, furriel miliciano atirador de cavalaria, natural e residente em Lisboa.
- ALDEAGAS. João Matias Mota Aldeagas, furriel miliciano atirador de cavalaria, residente em Estremoz.
- NASCIMENTO. José António Moreira do Nascimento, furriel miliciano de alimentação.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Cavaleiros do Norte reforçados com Caçadores do 5015


Avenida Portugal, em Carmona (em cima) e guião do BACÇ. 5015 (em baixo) 


A 13 de Abril de 1975, andava eu por terras do Huambo, laureando-me em férias com o Cruz, e por Carmona as coisas conflituavam-se. Os incidentes que se multiplicavam por Luanda e Salazar chegaram em resssaca à capital do Uíge e neste dia 13, que não era 6ª.-feira de azar, mas um domingo, a FNLA e o MPLA puseram-se a fazer contas de arma em riste e a disparar para cima de tudo o que se mexesse e lhe cheirasse a inimigo. E os inimigos eram eles próprios, angolanos contra angolanos.
Interveio a tropa, para fazer parar uma acção de fogo entre militantes armados dos dois movimentos e as coisas serenaram. Mas, para o desse e viesse - e por causa dos patrulhamentos mistos que então já se faziam e tantos arrepios nos pregaram... - entendeu o comando da ZMN reforçar temporariamente a guarnição do BCAV. 8423. Assim, a 14 de Abril de 1975 - hoje se completam 36 anos!!! - chegou ao BC12 um grupo de combate do Batalhão de Caçadores 5015. A 16, um outro, da 3ª. CCAV. 8423, a que estava no Quitexe e já antes jornadeara por Santa Isabel.

Outra razão operacional se juntara, por esta altura, ao serviço dos Cavaleiros do Norte: os patrulhamentos de longo curso, protegendo o tráfego rodoviário da estrada do café (para Luanda) e para o Songo e Negage - onde se localizava a base aérea.  A actividade era intensa e levedavam preocupações aos comandos militares portugueses. Não se podia evitar «apagar estes fogos» reais (e mortais, em muitos casos) e, ao mesmo tempo, fazer patrulhamentos e garantir a segurança pública de Carmona. Porque a guarnição era curta.
«Não se podia deixar a cidade inactiva», lê-se no Livro da Unidade. Mesmo assim, lá se ia consegindo «alguma situação de calma fictícia é certo», mas, como sublinha o LU, uma calma que permitia «um dia a dia mais ou menos estável». 
- ZMN. Zona Militar Norte.
- BCAÇ 5015. Batalhão de Caçadores 5015. Tinha CCS na Damba e aquartelamentos no Chimacombo (1ª. Companhia), Mucaba (2ª.) e Quivuenga e Cachalondo (3ª.). Por esta altura, ja parte do batalhão estava em Luanda, no Grafanil, para regressar a Portugal.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

A visita de António Albano Cruz à terra de Garcia


O alferes Garcia, no BC12, em Carmona (BC12), com Ricardo,
filho de alferes Cruz ao colo

O próximo fim de semana vai ser muito especial e é com alguma emoção que o vejo aproximar-se, pelo que não resisto à tentação de vos falar sobre ele. Será passado em Carrazeda de Ansiães e, porque não arranjei onde dormir em Pombal de Ansiães, vou ficar num turismo rural bem perto.
Foi em Carrazeda que a Margarida fez o serviço médico à periferia e onde, por esse motivo, passei alguns fins de semana bem agradáveis. Mas o que nos leva lá não é recordar apenas as gentes e a terra daqueles tempos e alguns dos bons momentos que lá passámos. É, sobretudo, recordar e prestar uma pequena homenagem ao nosso companheiro e amigo António Manuel Garcia (alferes do PELREC).
Vou levar comigo algumas fotografias, sendo uma delas do seu casamento em Pombal de Ansiães, para o qual tive a honra de ser convidado, com o também nosso companheiro alferes José Alberto Almeida. Com certeza que alguém se lembrará dele e dele me poderá falar.
Soube pelo nosso blogue que deixou uma filha e que esta já lhe deu um neto. Espero vir um dia, na melhor oportunidade, a transmitir-lhes pessoalmente quanto o apreciávamos e a amizade que sempre cultivou com todos nós.
ANTÓNIO ALBANO CRUZ
Alferes miliciano do BCAV. 8423
- MARGARIDA. Margarida Cruz, médica,
esposa do alferes Cruz e contemporânea
no Quitexe e Carmona.
- POMBAL DE ANSIÃES. Terra de naturalidade do
alferes Garcia, município de Carrazeda de Ansiães.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Andarilhanças e afectos familiares por Nova Lisboa...


A 12 de Abril de 1975 já eu andarilhava por Nova Lisboa (foto), com o Cruz - instalados no familiar Hotel Bimbe, da prima Cecília e do Rafael. Voarámos num avião da TAAG e lá chegámos em menos da duas horas.
Eu já fizera a viagem para a Gabela (em Setembro e em trânsito para o Huambo), em boleia num Toyota de amigo do Albano Resende e já não estava pelos ajustes de uma viagem de mais de 500 quilómetros, num machimbombo da EVA. Lá fomos de avião.
Ao meu jeito, não me fiz anunciar e como na altura usava barba crescida (por lá posta abaixo, em barbeiro perto do Ruacaná), não me conheceu o Rafael, quando chegámos de táxi, e fez-nos anunciar como dois clientes, para a «madame» Cecília.
Olha que dois clientes!!!
O projecto era, e foi, por lá veranear uma semana e depois, de comboio, seguir para Benguela - onde o Cruz tinha família. E assim foi.
Nova Lisboa era a segunda maior cidade angolana e para ela chegou Norton de Matos a projectar a capital de Portugal. Era uma cidade cosmopolita, bem desenhada, desenvolvida, bonita, atraente, cheia de vida e de amigos meus. Por lá faziam pela vida, além de Cecília e Rafael (com os quatro filhos e minha madrinha Isolina,a avó materna da casa), também os primos (de meu pai) Manuel, Aníbal e José (Mau), dois dos três filhos do tio Joaquim Viegas (Sérgio e Ivone), os conterrâneos Orlando e Paula (com os filhos) e os pais desta (Figueiredo e Leontina). Também Zulmira e o marido (Miranda), com os filhos Óscar e Nelson. Uma filha de Manuel Costa e outra de Óscar Matos. Não os cheguei a visitar a todos. Não deu tempo!
O Bimbe já fora de Armando Reis, outro conterrâneo. E por lá fazia pela vida  muita outra gente de terras de Águeda!
Foram gratificantes os dias de Nova Lisboa, no embalo do afecto e conforto familiares e de amigos. Dias de conhecer um mundo que ia muito para além do que sabia ou imaginava um miúdo, como eu, que ia de uma aldeia como a minha. As duas vezes que estive em Nova Lisboa davam para muitas histórias. Com saltadas a Silva Porto (onde morava a prima Ondina), à Caala, ao Alto Hama. Nova Lisboa era um  mundo, em grande!
- EVA. Empresa de Viação de Angola.
- MACHIMBOMBO. Autocarro, em Angola.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

O companheirismo solidário da guarnição de Zalala


ZALALA ficava para lá de alguns mistérios e perigos, à distância da saudade e do companheirismo que se levedava entre os Cavaleiros do Norte. Era assim a vida de um militar. A de todos os militares,  de todas as guarnições.
A solidão da Zalala era «combatida», no dia-a-dia, pela solidária camaradagem que o capitão Castro Dias por lá semeava e empolgava. Ele, professor e futuro sindicalista, que era homem de lutas e de combates, um miliciano militar que assumia na alma as dores e os sacrifícios dos seus homens - que eram filhos de tantas mães e gente de tantos génios.
A camaradagem fomentava-se por Zalala e a foto do (furriel) Rodrigues vem aqui recordar alguns dos elementos do 1º. Pelotão (ou Grupo de Combate) da 1ª. Companhia, do qual ele fazia parte e que operava segundo as ordens e instruções transmitidas pelo comando, nas mais variadas missões.
Nomes?...
«Ó pá, eu gostaria imenso de os recordar, mas olho-lhe a cara e conheço-lha, mas tá quieto quanto a nomes. Só com uma consulta minuciosa a alguns parcos registos que possuo, isso seria possível», disse-me o Rodrigues, através destas modernidades que são os correios elctrónicos de hoje.
O rosto de alguns, não lhe escapa: «O furriel Louro, o enfermeiro, o radiotelegrafista, o Bigodes, o Bolinhas, o Barbeiro, o 1º. Cabo Maria, que era natural de Angola», recorda o Rodrigues,  todos considerando «bons e corajosos camaradas».
«Mando-lhes um forte e grande abraço.Para todos, para todos...», diz o Rodrigues, furriel de Zalala.
Hoje, mas há 36 anos, o comandante Almeida e Brito visitou a CCAÇ. 4741 - estacionada no Negage. Preparava-se nova rotação de tropas, na província do Uíge e eu, em Luanda, preparava malas para viajar até Nova Lisboa. 

domingo, 10 de abril de 2011

Os dias de Luanda e a procura de Benedita e Mário



Os meus dias de Luanda, na primeira semana de Abril de 1975, foram vividos entre a folia de quem chegava a uma grande metrópole e, de férias, nela levedava entusiasmos e satisfazia apetites. E, no caso, também a ansiedade de não encontrar um casal conterrâneo: Mário e Benedita, pais da Fernanda, rapariga do meu ano, família civil que morava em Luanda.
Há dias, aqui falei de um telefonema feito em 2ª. feira de Páscoa, de Luanda para a vizinha Celeste (que já se foi deste mundo), a querer falar com minha mãe. Mas não disse do pedido dela (Celeste), para tentar encontrar a encontrar a irmã Benedita - de quem não tinha notícias, já fazia tempo - andando os pais muito preocupados. Não foi fácil tarefa, nem agradável. Eu sabia onde eles moravam, já lá tinha estado e na casa deles me tinha estreado no sabor do caril. Só que quando os procurei, não os encontrei e o bairro tinha sido alvo de alguns bombardeamentos, na fraticida guerra entre os movimentos. Era muito tensa a relação entre eles, discutida a tiro, à morteirada, à bazocada.
Fiquei alarmado. A casa tinha ar de ter sido assaltada, nada de os localizar, nem vizinhos que por ali apareceram me souberam dizer alguma coisa sobre a família.
Procurei o Mário na Sacor, mas também nada soube dele. E deles eu sabia, que não era intenção voltar à metrópole. O que se passaria? Poderia procurar a Fernanda, a filha. Mas onde é que ela morava? A sorte foi nesse dia ter encontrado o Albano Resende, que me deu nota do pouso deles e, para me anestesiar a ansiedade, me levou à fala com o Mário.
Mais tarde, em Agosto, bem mais dramática seria a minha procura do paradeiro do mesmo casal - que hoje, e desde 1975/76, aqui mora a uns 400 metros de minha casa. Já na casa dos 80 e tal anos.
Ver AQUI

sábado, 9 de abril de 2011

Cavaleiros do Norte, 2 anos!, 826 postagens!, 203 360 visitantes!

A 9 de Abril de 1975, laureava eu o queijo por Luanda - em angolanas férias, com o Cruz. Um ano antes, jornadeava pelo Campo Militar de Santa Margarida e em 1973 estava a duas semanas da incorporação militar que me levaria por Santarém (recruta na Escola Prática de Cavalaria) e Lamego (Centro de Instrução de Operações Especiais, onde me fizeram Ranger, para  o que desse e viesse da guerra), antes de chegar ao RC4 santa-margaridense, a unidade mobilizadora, e de partir para Angola.
Há dois anos, em 2009, fiz «nascer» este blogue - com o post que reproduzo na imagem.
Se me perguntassem nesse dia se a este chegaria, o de hoje, com actualizações diárias, garantiria que não! Não teria quaisquer dúvidas!
Mas, afinal, é o que tem acontecido. Todos os dias.
Este post é o nº. 826. Post 826 e outras tantas histórias. Nalguns casos, mais de uma por dia!
Hoje, que faz dois anos e até este momento, o blogue já teve cerca de 250 entradas.
De países tão diferentes como Portugal (131), Brasil (13), França (15), Macau (2), Estados Unidos (2), Espanha (2), Ucrânia (1), Eslovénia (4), África do Sul (2), Dinamarca (2), Alemanha (8), Holanda (6), Canadá (7), Suíça (22), Angola (27), entre outros. Suponho que serão, para além de Cavaleiros do Norte, muitos quitexanos - militares ou civis, por uma qualquer razão.
O Cavaleiros do Norte foi visto 203 360 vezes.
Obrigado aos que têm colaborado: ao tenente Luz (agora capitão aposentado), aos amigos Cruz, Almeida, Ribeiro e Machado (alferes), Neto, Monteiro e Pires (Bragança), Belo, Dias, Rodrigues, Reina e Fernandes (furriéis), ao Tomás e ao Buraquinho (1ºs. cabos). E ao dr. Albino Capela. A quitexanos de campanhas anteriores: Fonseca (Casal), Patriarca, Lapa e César. E a todos quantos, de uma ou outra formas, me tem feito chegar elementos de memória da nossa jornada de Angola. Sem querer, mas podendo esquecer algum, a todos um grande, grande obrigado quitexano.
O Cavaleiros do Norte é de todos!
Um abraço para todos!
C. Viegas
Ver AQUI

sexta-feira, 8 de abril de 2011

A casa do capitão a arder...

Bandeira Portuguesa hasteada no Quitexe, na porta d´armas. O edifício, à direita, era o do comando e para trás ficavam as casernas, as oficinas e a parada


O içar da bandeira era, naturalmente e como nos restantes aquartelamentos, um acto diário lá para os lados do Comando militar do Quitexe. Ali, muitas tarefas já devidamente delineadas, eram transmitidas a todos os grupos e secções que compunham a CCS.
Não o digo com perfeito conhecimento de causa, até porque, valha a verdade, não terei constado das formaturas no Quitexe mais de duas ou três vezes. E só fui quando obrigado, como todo o pessoal das transmissões. Dizia-se que eram quase sempre momentos de alguma tensão, cada um a perguntar aos seus botões o que iria ser transmitido naquele dia. Além da saga de avisos, reparos e ameaças do nosso saudoso capitão e Comandante da CCS, temia-se sempre que mais alguma má novidade houvesse para transmitir – e más novidades não nos “faltavam” ultimamente.

Numa das últimas vezes que se reuniu toda a Companhia, não assisti por me encontrar de serviço, no posto de rádio. Estávamos quase em vésperas de partir para outras paragens, quando o Comandante de Batalhão entendeu fazer um balanço do que tinha sido a nossa prestação, mas também avisar-nos do que nos esperava na zona do Ambrizete. O discurso de quem tinha o leme do Batalhão terá sido muito emotivo, principalmente quando falou nas dificuldades que tínhamos encontrado no terreno, salientando o querer férreo dos seus homens.
Como disse, eu não estava lá, mas estava o capitão Franco, o oficial de operações do batalhão, hoje coronel reformado. Com ele cavaqueei demoradamente na passada semana, sobre peripécias do dia a dia no Quitexe, algumas até hilariantes. Outras, seguir-se-ão dentro de dias, como ficou apalavrado.
No dia do discurso de que dou conta, e que terá durado cerca de meia hora, logo que a Companhia “destroçou” abeirou-se dele, muito ansioso, o «Menino Jesus», atirador do «pelrec»: «Meu capitão, meu capitão, dá licença… a sua casa está a arder”! Intrigado ficou o capitão por este só lhe dizer quando a Companhia “destroçou”! E lá correu Quitexe acima, aflito, porque na casa moravam mulher e filha. A rápida intervenção de alguns civis que por ali andavam já tinha posto fim ao incêndio, que felizmente não passou de um susto.
E como é que o “Menino Jesus” sabia?! Sabia porque um civil lhe deu o recado mas o Comandante da CCS não o deixou transmitir, proibindo a sua entrada no gabinete de operações, área reservada, ordenando-lhe que seguisse imediatamente para a formatura!
«E sem conversa...», gritou, apontando-a com o pauzinho de que não se separava!
E quando aquele homem dizia «sem conversa»… ai de quem se atrevesse a mais uma palavra! Ainda hoje, apenas meia dúzia sabe que Amadeu era a sua graça, e todos se referem a ele como o «sem conversa». Era o RDM em pessoa, mas nós até temos saudades dele! Temosm, sim senhor! E até da idade que tínhamos quando nos aplicava o Regulamento Militar!
ANTÓNIO FONSECA