quinta-feira, 31 de março de 2011

Dias de Carmona, antes de ir para férias angolanas

Furriéis Cruz e Viegas na avenida principal do Quitexe (em
cima) e guião do ECAV. 401 (em baixo)

A 31 de Março de 1975, em vésperas da minha saída de Carmona para férias por Angola, com o Cruz (foto), o BCAV. 8423 prosseguia a sua política da aproximação com os dirigentes dos movimentos - estratégia que vinha dando bons frutos e se espalhava pelas áreas próximas de Carmona.
Neste dia, em Salazar, Quibaxe e Úcua começaram igualmente os patrulhamentos mistos - neste último caso, com a participação da 2ª. CCAV. 8423 (comandada pelo capitão miliciano José Manuel Cruz) e  do ECAV. 401. Os contactos com os dirigentes dos movimentos - o MPLA, a FNLA e a UNITA - vinham a realizar-se habitualmente em todas as quartas-feiras, desde a chegada dos Cavaleiros do Norte  Carmona - a 2 de Março. 
Os últimos dias deste mês, foram também tempo para as visitas do 2º. comandante do BCAV. 8423, capitão José Diogo Themudo, a sub-unidades: ao Quitexe, onde estava a 3ª. CCAV. 8423, comandada pelo capitão José Paulo Fernandes (a 27) e a Vista Alegre e Ponte do Dange, onde jornadeava a 1ª. CCAV., a do capitão Davide Castro Dias (28), ida de Zalala.
O capitão José Diogo Themudo, a 24 de Março, assumira o comando interino do BCAV. 8423, dado o tenente-coronel Almeida e Brito ter sido deslocado para o comando da ZMN.
Por mim, com patrulhamentos e PM na cidade e serviços internos no BC12, fazia malas para 30 dias de férias - que, com o Cruz, se iriam estender por boa parte de Angola.
- CRUZ. António José Dias Cruz, furriel miliciano mecânico
rádio-montador. Natural de Cardigos e residente em Lisboa.
- ECAV. 401. Esquadrão de Cavalaria 401, os Dragões, em Luanda,
de 1973 a 1975. Contacto de e-mail: manuelaraujocosta@aeiou.pt

quarta-feira, 30 de março de 2011

O alferes Sousa, que era contra a guerra colonial

Avenida do Quitexe. Ao fundo, ao lado esquerdo da casa do telhado triangular, a enfermaria militar



ANTÓNIO FONSECA
Texto

Já um dia aqui falei do alferes Sousa, de Operações Especiais, e da razão que o levou a ameaçar-me com uma participação, em plena operação militar. Com ele, e salvaguardando sempre as devidas distâncias, passei muitas horas em amenas conversas. Algumas bem interessantes, outras nem por isso e porque visavam apenas matar horas sem sono em noites quitexanas.
Era uma pessoa de contrastes e tanto lhe dava para gargalhar como para se entregar a uma tristeza que não se entendia e até preocupava os mais sensíveis e atentos. Inteligente, e muitas vezes com tom crítico, recorria a frases carregadas de ironia, provocando algum mal-estar em alguns oficiais. Com o alferes Serpa, oficial de transmissões do Batalhão, teve momentos pouco amistosos sempre que se falava de política ultramarina. Mas só discutiam em “campo aberto”, afim de que ninguém testemunhasse o teor das conversas, avisado que estava, por este, de as suas convicções ideológicas poderem muito bem chegar às altas patentes militares. Mas não era o único na corda bamba! Havia mais, e até com bastante peso na hierarquia militar, que só viriam a respirar fundo após 25 de Abril de 1974.
Filho de engenheiro e médica, família de convicções antagónicas à legitimidade da guerra de África e que ele também interiorizou, nunca deixou de exprimir o que lhe ia na alma, como o fizera em lutas estudantis, assumindo riscos que lhe iam ficando muito caros. As muitas operações e escoltas em que participou, sempre de forma bem activa, contrastavam muito com os seus ideais. Mas, segundo ele, era a única e melhor forma de defender os seus homens, numa luta onde não havia lugar para perguntas, “ses ou “mas”!
No dia a dia do Quitexe, ocorriam episódios, a nível de Comando, que nem sequer eram sonhados, porque não podiam ser transpirados, mas que tinham uma ligação muito directa com a maneira de ser e agir de cada um, principalmente no que aos alferes milicianos respeitava. As muitas reuniões no Quitexe com os comandantes das companhias de Zalala, Aldeia Viçosa e Santa Isabel, mas principalmente as constantes deslocações do comandante de Batalhão a Luanda, seriam indicações de que alguma coisa estaria para acontecer, embora sempre se procurasse esconder essa “mensagem”.
Muitos destes pormenores, vim a conhecer esta semana, em conversa com o ex-alferes Sousa, quando este me achou, literalmente, a almoçar numa esplanada na rua de Santa Catarina, no Porto, cidade onde reside e goza a sua aposentação. Por coincidência, alguns dias antes tinha eu estado a 100 metros de sua casa, numa cerimónia com parte lúdica, a que não assistiu apenas por impedimento, face a compromissos familiares, mas que até era parte interessada, pois a obra de engenharia tinha também o seu dedo. Pois é, ele há coisas!...
Trinta e sete anos depois, garante, não se esqueceu de ninguém e recorda Quitexe de uma maneira muito especial. A Companhia também não o esqueceu, e por isso mesmo quase fui incumbido de o achar para o almoço de 2011. Não fui suficientemente perspicaz…e o “achado” fui eu!
ANTÓNIO FONSECA
1º. Cabo de Transmissões do
Batalhão de Caçadores 3879,
no Quitexe em 1972/73

terça-feira, 29 de março de 2011

O Campo Militar do Grafanil na hora do regresso a Portugal...


O Campo Militar do Grafanil, uma entrada, numa foto de 1974, igual ao que era em 1975


AMÉRICO  RODRIGUES
Texto

O tempo de estadia no Grafanil, por Agosto de 1975 fora, na espera do regresso a Lisboa, foi tempo de muitos e variados episódios.
Por exemplo, sermos requisitados para muitas missões em Luanda, fazermos protecção às casa dos governantes - a de Jonas Savimbi, entre outros -, andar aos tiros com elementos do MPLA, nossos vizinhos na altura (por cedência de quartéis), ir recuperar a Berliet do nosso condutor - o “Mamarracho”, de Montalegre -,que tinha o cravo pintado e tinha sido entregue ao MPLA, mas que ninguém sabia. Ou despejar carregadores no zinco do telhado das casernas, passar noites a detonar granadas, coleccionar mais de uma dúzia de tipo de armas diferentes que iamos encontrando nessas acções, trocar “uzis” por um automóvel, comer os pobres peixes (pimpões) que estavam no lago, fazer explodir o dito automóvel quando a PM nos interpelou.
E não esqueço sermos apanhados no meio de tiroteios, entre o MPLA e a FNLA.
Muitos destes episódios não eram do conhecimento do comando, sendo da iniciativa de soldados e furriéis, em defesa dos camaradas, porque, nessa altura - Agosto de 1975!!! - o Grafanil não oferecia o mínimo de segurança e cada um tinha de cuidar da sua defesa e dos outros.
 As balas tracejantes, de noite, eram para nós a lembrança do fogo de artifício das festas das nossas terras.
Tivemos de descarregar navios para podermos regressar, porque tínhamos sempre data marcada, ora de avião ora de barco, mas nunca mais se concretizava.
Dávamos dinheiro angolano (angolares), porque não havia nada para comprar. Fazíamos bancadas num campo de futebol de salão com as urnas, que estavam lá de reserva, mas que ninguém queria.
Sempre que era marcado a data do regresso, era bebedeira para festejar! E foram tantas, porque a data era sempre adiada. E muitas vezes foram, até que chegasse uma definitiva.
AMÉRICO RODRIGUES
- ANGOLARES. Escudos angolanos. O Estado
de Angola tinha moeda própria, no tempo
da colonização.

segunda-feira, 28 de março de 2011

A chegada a Angola e o campo militar do Grafanil

Furriel A. Rodrigues, da 1ª. CCAV.. 8423, no dia da
chegada ao Grafanil, 1 de Junho de 1974


As estadias no campo militar do Grafanil deixaram várias recordações, as da chegada e as da partida.
As baldas permanentes para a Luanda, tentando conhecer a cidade e os seus prazeres de vida, foram peripécias da chegada. Até nas vacinas me baldei, como na contra o sono da mosca tsé-tsé, e não sei se hoje estou a pagar a factura, pois tenho problemas em dormir demasiado.
Nestes 4 ou 5 dias, na ilha de Luanda, pude comer lagosta, coisa que fazia pela primeira vez na vida, e beber canhângulos (cerveja em grandes jarros) e marisco com fartura! Foram o alento para a partida para Zalala.
O Grafanil e cidade de Luanda tinham quase tudo para que se pudesse levar uma rica vida de serviço militar.Todavia, o meu destino não era esse e lá fui parar a Zalala. No regresso ao Grafanil, em Agosto de 1975, a realidade era muito diferente, passados os 14 meses que estivemos no norte de Angola. Para pior.
Quando chegámos ao aquartelamento que nos estava destinado, encontrámos um autêntico caos. Como na altura tinha como missão a parte alimentar da companhia, vim para Luanda de avião (DC6 ) da Força Aérea, para preparar (com a restante equipa) a chegada da última coluna de tropa portuguesa, que incluía a minha companhia e tinha partido de Carmona. Nem imaginam a porcaria e lixeira que os últimos soldados lá deixaram. Fizeram a última refeição e deixaram tudo como acabaram a mesma, pratos e panelas com comida e todo o resto,até já germinavam plantas nos restos. O bolor era patente em todos os utensílios.
Passámos dois dias só para fazer uma ligeira e razoável limpeza ao refeitório e cozinha.
AMÉRICO RODRIGUES
Furriel miliciano atirador de cavalaria,
da 1ª. CCAV. 8423 (Zalala). Residente em
Vila Nova de Famalicão

domingo, 27 de março de 2011

O futuro exército de Angola e os patrulhamentos mistos

Avenida de Portugal (?) em Carmona. Também por ela passaram os primeiros patrulhamentos mistos,  26 para 27 de Março de 1975


O processo de independência de Angola - sem que agora valha a pena caracterizá-lo, ou questioná-lo, valorizando-o ou desvalorizando-o, ... galopou por Março de 1975 adentro, regado de incidentes e de sangue, um pouco por toda a Angola. Principalmente em Luanda! E também em Salazar! À nossa volta! E quanto sangue de gente inocente foi derramado na terra de Angola!
Carmona e a província do Uíge, porém, com os defeitos e virtudes das suas guarnições militares, serenidades e alguns celerados desassossegos, continuavam na paz dos anjos. Não é que não se registassem pequenos incidentes. Registavam. Mas nada que se afigurasse com o que se passava naquelas duas cidades e regiões.
Iniciaram-se as primeiras actividades de Exército integrado, envolvendo as Forças Armadas Portuguesas e elementos dos movimentos emancipalistas. Ao alferes Garcia, ao furriel Neto e a mim (todos atiradores, da Operações Especiais), por exemplo, calhou-nos dar instrução de tiro, aplicação militar e ordem unida.  
A experiência não viria a ser concluída - por força da evolução política e militar... -,  mas indubitavelmente foi muito proveitosa, tendo sido muito bem recebida pelos angolanos indicados pela FNLA, MPLA e UNITA - que iriam formar o futuro exército angolano.
Os Operações Especiais «ensinavam» ordem unida, aplicação militar e tiro, mas todas as especialidades transmitiam os seus conhecimentos aos mancebos angolanos indicados pelos movimentos. Houve «certa expectativa inicial», como refere o Livro da Unidade, mas «sem problemas de execução».
De ontem para hoje, há 36 anos, iniciaram-se os patrulhamentos mistos, envolvendo a tropa portuguesa e os militares dos movimentos. Ver AQUI.
- FNLA. Frente Nacional de Libertação de Angola, liderada por Holden Roberto.
- MOLA. Movimento Popular de Libertação de Angola, presidida por Agostinho Neto.
- UNITA. União Nacional para a Independência Total de Angola, liderada por Jonas Savimbi.

sábado, 26 de março de 2011

O luto do Quitexe que chegou à minha aldeia...

O Quitexe, em 1961 (vista aérea), no tempo em que por lá passou Neca Taipeiro


Os lutos do Quitexe de 1961 chegaram hoje ao cemitério da minha aldeia: foi a enterrar o Neca Taipeiro, um dos dois primeiros militares que, daqui, marcharam para a «Angola é nossa» que Salazar decretou como emergência nacional. Foi o Neca e foi o Lito, depois recebidos na aldeia como heróis.
O Neca ia fazer 72 anos em Julho e era meu vizinho. Muitas vezes, ali sentados no café ou no muro do adro, ou aqui à porta de casa, falámos das duas Angolas que conhecemos em tempos diferentes. Ele, nos tempos trágicos de 1961 e 1962, integrando os primeiros Batalhões de Caçadores que, Dembos adentro, foram conquistando posições, lutando quase corpo a corpo, galgando trilhos e picadas, matas afora, por sítios de dor e que cheiravam a sangue e a morte.
Eu, já em 1974 e 1975, fazendo o «espólio», digo eu, da presença portuguesa na terra angolana.
Por lá o encontrei, em 1974 e 1975, já ele civil e fazendo pela vida. Primeiro, num bar de Úcua, marchava eu para o Quitexe, a 6 de Junho de 1974. E mais tarde, por 1975 adentro, em Luanda.
Voltou, como retornado, e por cá refez a vida. Quarta-feira, vizinho comum me disse que a saúde lhe fugia, já internado em Coimbra. Faleceu ontem e hoje foi a enterrar, um dos primeiros  militares portugueses que jornadeou na Angola de 1961 e 1962. Pelo Piri, Nambuangongo, Aldeia Viçosa, Quipedro, Quitexe, Carmona e Negage, Sanza Pombo. «Corremos aquilo tudo, nunca chegámos a estar em sítio certo», disse-me ele, há algum pouco tempo.
Infelizmente, não chegámos a tirar a foto que tínhamos combinado, para postar aqui: a do primeiro e do último ribeirense que passou pelo Quitexe.
- NECA TAIPEIRO. Manuel Ferreira Simões dos Reis, soldado
atirador das primeiras campanhas da zona do Quitexe, em
1961/62. Meu vizinho, agora falecido. Deixa viúva. filha e neto.
Ver AQUI
E AQUI.

sexta-feira, 25 de março de 2011

O furriel Oliveira da Companhia do Liberato

O Liberato, ali ao lado esquerdo (no mapa) e visita do comandante Almeida e Brito (à direita, na foto), quando era oficial de operações operações do B/Cav 1917, em 1968


Ao sair esta tarde de uma assembleia geral, reconfortava-me numa esplanada de Águeda, com um parceiro da reunião, quando, em passo aligeirado e com a filha pelo lado, m´apareceu o Zé Marques, velho amigo de escola. E o que tem que ver o Zé Marques com os Cavaleiros do Norte?
Bom, o Zé Marques era o furriel Oliveira, da companhia do Liberato - essa mesmo que se revoltou por volta de Outubro de 1974, e quis avançar sobre Carmona. A companhia de militares angolanos que a CCS do BCAV. 8423 foi chamada a parar no asfalto da terra do café - entre Quitexe e Aldeia Viçosa.
A companhia era de militares angolanos, de todas as raças e cores, mas com quadros na sua maioria europeus. Era o caso do Zé Marques, furriel miliciano de alimentação - que chegou ao Liberato em rendição individual, por lá esteve dois meses com uma companhia formada no RI 21, de Nova Lisboa. E depois outra, a que se viria a revoltar, a CCAÇ. 209 - também do RI 21.
A CCAÇ. 209 dependia orgânicamente do BCAV. 8423 e, por isso, pelo menos duas vezes lá estive - em escoltas a delegações militares. Sem nunca encontrar o Zé Marques, por razão simples: ele era lá o furriel miliciano Oliveira e por ser natural do Caramulo, nunca ninguém o associou a Águeda - quando por gente de Águeda eu perguntava.
O desgosto da nossa conversa associou-se hoje ao insólito de termos concluído termos estado, numa visita do comandante Almeida e Brito (que o PELREC escoltava), a poucos metros um do outro, sem por nós darmos.
Como foi possível, Ó Zé Marques?!
A CCAÇ. 209 viria a ser a última do Liberato e«o nosso furriel» regressou a Portugal e ao seu Caramulo nas vésperas do Natal de 1974.
- ZÉ MARQUES. José Marques de Oliveira, furriel
miliciano de alimentação. Natural do Caramulo e
residente em Águeda.Aposentado da Caixa
Geral de Depósitos.

Ver AQUI.
AQUI

quinta-feira, 24 de março de 2011

O furriel que era... Capitão



Já viram o que é ser furriel e Capitão, ao mesmo tempo?! E como é que pode? Pois pode, sim senhor! Era o caso de Luís Ribeiro Capitão, de nome de baptismo e furriel miliciano de formação militar. Companheiro nosso, garboso Cavaleiro do Norte da 3ª. CCAV. 8423, a de Santa Isabel.
Já por aqui falámos dele e hoje aqui vem, de novo, para citar a Ordem de Serviço nº. 164, onde um louvor lhe sublinha «alto espírito de querer e inabalável vontade de cumprir». E também o «bom trato social, altamente disciplinado e exigente disciplinador», que se «mostrou sempre como exemplo a camaradas e subordinados».
O Capitão foi nosso companheiro diário no Quitexe - desde quando para ali se mudou a companhia de Santa Isabel, em Dezembro de 1974. O louvor faz referência ao tempo em que colaborou na secretaria da sub-unidade, tempo em que «confirmou em pleno toda a confiança já nele depositada, sendo incansável de trabalho, mesmo nas situações mais delicadas e difíceis que a sua companhia  viveu».
O documento, que respigo do Livro da Unidade, ainda salienta o facto de «sempre se oferecer, voluntariamente, para qualquer missão, por mais espinhosa que esta se apresentasse, merecendo, por tal, ver reconhecida a sua actuação». 
Grande e valente furriel Capitão!
- CAPITÃO. Luís Ribeiro Capitão, furriel miliciano atirador de
cavalaria, faleceu a 5 de Janeiro de 2010. Natural de Vila
Nova de Ourém, integrou a 3ª. CCAV. 8423, de Santa isabel.
Ver AQUI.

quarta-feira, 23 de março de 2011

O comandante Carlos Almeida e Brito


A 36 anos de distância e amadurecidos pelos anos que nos foram formando, pelas glórias e tragédias da vida, pelas alegrias e saudades da nossa juventude, lembrar Angola e a jornada que por lá nos levou em missão, implica, necessariamente, citar Almeida e Brito, o nosso comandante. E o papel que teve na segurança de pessoas e bens do Uíge.
Nem sempre o entendemos!
Nem sempre aceitámos, de bom grado, a disciplina que exigentemente nos impôs. E quantas recalcitrâncias eu mesmo, então muito irreverente e jovem, lhe afrontei - quando os nossos sentidos de justiça se diferenciaram, em fronteiras que, todavia, nunca se extremaram. Sempre de cara aberta. Frontalmente. 
Almeida e Brito vem hoje a este espaço para lembrar os tempos de Carmona - onde e quando as graves confrontações militares entre MPLA e FNLA molharam o chão da cidade com o sangue de muitos mortos e muitos feridos. E com a tropa portuguesa na primeira frente, em defesa de civis indefesos e segurança dos pontos nucleares da cidade. Sob o seu comando.
Carmona, ao tempo, «escapava» aos incidentes que se multiplicavam por Angola fora e, em algum tempo, era mesmo a única capital de província em que não se tinham registado «batalhas» ou confrontações, mais ou menos graves.
Almeida e Brito foi o grande responsável pela gestão estratégica e militar da cidade. A Março de 1975, diariamente, contactava os dirigentes dos movimentos. Às quartas-feiras, reunia o Estado Maior Conjunto. E dessa estratégia, cito do Livro da Unidade, «tem-se verificado uma boa aceitação das medidas militares tomadas», o que, como naturalmente se conclui, originou «um clima de paz», que, de resto, «foi exemplo para terceiros».
Foi o grande comandante, no momento mais trágico, com a serenidade dos competentes, a coragem dos que não temem o perigo - antes o enfrentam em qualquer trincheira.
Por alguma razão, a 9 de Setembro de 1995, no 1º. Encontro dos Cavaleiros do Norte, foi citado como «o comandante maior».
A nossa continência, comandante Almeida e Brito!
- ALMEIDA E BRITO. Carlos José Saraiva de Lima Almeida e
Brito, tenente-coronel e comandante do Batalhão de Cavalaria
8423. Atingiu a patente de general e, depois da jornada de
Angola, foi, entre outros cargos, 2º. comandante da Região
Militar Centro, 2º. comandante geral da GNR e comandante
da Região Militar Sul. Faleceu a 20 de Junho de 2003,
subitamente e durante um passeio em Espanha. 

terça-feira, 22 de março de 2011

O bom, competente e comunicador furriel Lino



O Lino, lembram-se do Lino?!
Era mecânico-auto e dele, da sua competência e capacidade de desenrascanço, muitas vezes dependia a operacionalidade das viaturas. E ai do burro de mato, ai da berliet, ai de qualquer viatura militar que não estivesse afinada na hora, quando a hora fosse de arrancar para qualquer missão.
O Lino jornadeou por Santa Isabel e foi parar ao Quitexe, quando a 3ª. Companhia por ali assentou praça. Era gajo de muitas palavras, de muitos feitos, um enorme contador de lendas e mercador de coisas africanas. Era um camaradão, sempre com uma qualquer solução para um qualquer problema ou dilema que surgissse. E regava-os, como às conversas, com a fluidez de quem sabia engenheirar as palavras, para explicar o que quer que fosse.
Era, assim, pois, um grande comunicador.
O capitão José Paulo Fernandes, seu comandante de Santa Isabel, levou-lhe o nome a louvor público, testemunhando-o como «exemplo a destacar».
A Ordem de Serviço 174 publicou o louvor e nele se lê que foi «grandemente responsável pela alta percentagem de operacionalidade das viaturas da sua sub-unidade, facto reconhecido superiormente pela sua inesgotável actividade e pelo seu alto auto-espírito de missão».
Mais dele dizia o louvor: «Bom condutor de homens, disciplinado, possuindo raros dons de convivência, de camaradagem, de trato e de comunicabilidade, soube disso tirar partido para conseguir processos de trabalho ímpares».
Que mais dizer do bom do Lino?
- LINO. José Rodrigues Lino. Furriel miliciano mecânico-auto, da
3ª. CCAV. de Cavalaria 8423. Empresário do sector das madeiras, no Fundão.
- BURRO DE MATO. Unimog, viatura de transporte de militares, de
banco corrido ao centro e ao longo da carroçaria.

segunda-feira, 21 de março de 2011

A mulher que pediu ajuda aos Cavaleiros do Norte

A foto mostra-nos a Avenida Portugal, em Carmona - uma das principais. E vem aqui a propósito do sinaleiro e do jeep que se vêem. Mais ou menos neste local, nos dias dramáticos de Junho de 1975, uma mulher pediu apoio à Berliet que passava e recolhia civis, levando-os dos perigos da cidade que se metralhava e bombardeava, para a segurança que lhes dava a parada do BC12.
Ia na Berliet um grupo de militares do PELREC e a missão era essa: recolher civis que pedissem protecção. Assim fazíamos, ajudando-os até a subir e a carregar alguma mala ou saco que trouxessem.
Ali, ao final de uma manhã metralhada pela fúria de fnla´s e mpla´s, fúria que não respeitava civil de militar, uma mulher, branca e com três ou quatro crianças na roda da saia, pediu protecção à tropa. Pois assim seria.
Estranhamente, o sempre solícito e generoso Marcos reagiu, negando-se a apoiá-la. Foram momentos menos bons. «Mas  que se passa, Marcos?", perguntei eu, empoleirado na Berliet.
«Esta, não!...», respondeu-me ele, a manear a cabeça e a bater com as botas no passeio, enquanto passava a faca de mato na coxa direita do camuflado e na mão esquerda segurava a G3.
Aquilo deixou-me intrigado e violento.
O Marcos não era rapaz de evitar uma ajuda, de recusar uma mão, de dar um pé atrás ao perigo. Que mosca lhe mordera? "Ajude a mulher, pá!... Ó Francisco, ajude também, pá...», gritei eu, de teimoso e exigente.
As rajadas e o estiouro de morteiros continuavam a ouvir-se de longe, fazendo eco pela avenida, e o Marcos ajudou, encavalitou as crianças na caixa da Berliet, ajudou a mulher a subir e ela lá se juntou, com as crianças, aos outros civis que já levávamos.
No BC12, veio o Marcos à fala comigo: «O furriel foi injusto!..., não me devia ter obrigado», acusou-me.
«Porquê?!», perguntei eu.
«Aquela gaja ainda há dias nos insultou naquele sítio, mesmo naquele sítio...», lembrou-me o Marcos.
Justamente naquele mesmo passeio, na verdade, ia eu, ele e o António, de PM e no jeep conduzido pelo Breda,  quando parámos à ordem do sinaleiro. A civil encharcou-nos de nomes e cuspiu para o chão, endemonizou-nos. Já na altura, o Marcos - que era rapaz de baixa estatura mas de coragem enorme - quisera reagir às ofensas. Não o fez.
Agora, ter de a ajudar, ter de «salvá-la», era demais.
Soube que, dias depois e na parada do BC12, o Marcos pediu satisfações à mulher. E que a perdoou.
- MARCOS. João Manuel Lopes Marcos, soldado atirador. Reside no Pêgo (Abrantes).
- FRANCISCO. Vitor José Ferreira Francisco, soldado atirador de cavalaria. Reside na Marinha Grande.
- ANTÓNIO. Francisco Fernando Maria António, soldado atirador de cavalaria.  Residente em Mação.
- BREDA. Joaquim Rama Breda, 1º. cabo condutor, de Leiria.

domingo, 20 de março de 2011

Os camuflados, as dores e os lutos de quem ia para a guerra




Aos idos tempos de 1974, não era comum verem-se militares de camuflado nas ruas de Portugal. Eram sinal de guerra, de morte, de viuvez, de orfandades, de dor! Julgo mesmo que tal era proibido aos militares.
Os camuflados - salvo casos muito específicos - só eram vestidos na chamada metrópole por forças especiais (e muito, muito raramente). E nem sequer os mobilizados para as várias frentes da guerra ultramarina os usavam, mesmo em vésperas de partida.
Vestiam-se normalmente as fardas de trabalho, nos aquartelamentos, ou a nº. 2, nas saídas.
As famílias dos militares, elas mesmas de alguma forma recatavam as fardas da guerra - quiçá imaginando o sofrimento que iriam ter quem os ia vestir - os filhos, os maridos, os namorados, os irmãos. Foi o que aconteceu quando a minha casa cheguei com calças, camisas e dolmans camuflados, comprados no Casão Militar do Porto e a que minha mãe tinha de dar mão de costureira, para os ajustar ao corpo.
- «Então é esta a roupa da guerra?!!!», perguntou-me ela, por estes dias de Março de 1974 - enquanto alinhavava a altura das baínhas das calças e a largura das camisas, ajustando-as à cinta.
Que era, lhe disse eu.
«Tá bem!!!..», retorquiu-me, de olhos tristes e quando já reforçava os botões, pregando-os com mais linha, mais forte, mais segura, com o cuidado de a usar de cor verde - assim que sumariamente lhe expliquei porque daquelas cores eram os camuflados.
Ainda ali os tenho (são os meus despojos de guerra!!!) e ainda de vez em quando ela me pergunta por eles, em brincadeira de mãe: «Agora, nem te servem...». E risse.
Pois não!
Já lá vão 37 anos e 20 e tal quilos depois!  

sábado, 19 de março de 2011

A compra do fardamento no Casão Militar do Porto




A 19 de Março de 1974 fui tio pela segunda vez e, com o Chico Neto, fui ao Casão Militar do Porto comprar o fardamento que tínhamos de levar para o ultramar. Recebíamos um abono cujo valor não recordo e a nosso cargo (dos 1º.s cabos milicianos e aspirantes a oficiais milicianos) ficava a aquisição.
O BCAV. 8423 estava desde a véspera em gozo da chamada Licença de Normas - 10 dias de férias!!!... - e eu e o Neto, com o apetite dele em ir ver o Rally de Portugal que passava nas serras do Préstimo (Águeda), por lá passámos na minha estreia nesta matéria desportiva, ainda ajudámos a mudar uma roda a um piloto estrangeiro e fomos almoçar ao Porto, depois comprando os camuflados, as botas e outros artefactos.
O à-parte desta nota tem a ver com a minha ignorância em matéria de ralis e, depois, o entusiasmo que me levedou a alma por ver um português a lutar pelos primeiros lugares - era Francisco Romãozinho, em Citroen GS, que acabaria a prova no oitavo.
O rali decorria numa época complicada pela crise petrolífera, mas a conhecida capacidade de César Torres resolveu a questão. Estou certo se lembrar que a gasolina veio da Venezuela, negociada por ele, que ao tempo era o presidente do Automóvel Clube de Portugal? Não estou seguro.
As compras no Casão Militar do Porto foram rápidas e poupadas. Era «moda» não gastar todo o abono que nos era dado e assim fiz eu e o Neto - e faziam todos... - sobrando-nos alguns trocos para guardar no bolso para Angola. Eram magros, muito magros, os dinheiros de então.

- CASÃO MILITAR. Organismo estatal que, ao tempo, dava apoio comercial, com custos mais baixos, a todas os familiares das forças armadas - a nível alimentar e de vestuário, sendo conhecido por Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento. O do Porto, ficava na Rua da Boavista.
- SOBRINHO. José Fernando Morais Moreno, 37 anos, (ex)remador internacional do Náutico de Viana (do Castelo), campeão nacional e ibérico. Por duas vezes, atleta pré-olímpico - numa delas ficando a dois centésimos do apuramento para os Jogos de Montreal. Treinador da modalidade e professor, meu sobrinho e afilhado.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Os dias e as noites à procura de conhecer a cidade de Carmona

Rua do Comércio nos anos 70. Residencial Apolo, ao fundo


Os primeiros dias de Carmona, em Março de 1975, foram de natural curiosidade em conhecer a urbe, para muitos dos Cavaleiros do Norte. A esmagadora maioria nunca tinha vivido em cidade, alguns de nós praticamente nunca tínhamos saído das aldeias (era o meu caso...), razão porque se imagina o que era a aventura de lhe conhecer os ventres e os sítios de desejo. Escuso, aqui, de falar em nomes, mas eram conhecidos os mais tórridos sítios onde se animava a alma e satisfazia o corpo dos jovens Cavaleiros do Norte.
Sítios mui frequentados. E de noites e vícios mui vividas e desejados. 
Outro vício, passou a ser o de ouvir relatos de futebol português - que já se ouvia rádio na cidade. E ir jantar aos restaurantes carmonianos, assim tal permitissem as algibeiras. Passou a ser moda ir ao Escape, dar uma saltada ao Xenú, ao Leão d´Ouro, ao aeroporto, ou ao Peixoto, as piscinas ou até o bar do Eugénio. E porque não lembrar o Diamante Negro, onde tantas noites se engravidaram de prazeres, lá para os lados do campo de Recreativo do Uíge?! Lembro-me bem?

quinta-feira, 17 de março de 2011

Cavaleiros do Norte «admitem» 2 Companhias de Caçadores





A 17 de Março de 1975, há precisamente 36 anos, o Batalhão de Cavalaria 8423 assumiu o controlo operacional da Companhia de Caçadores 4741, estacionada no Negage, e da 1ª. CCAÇ. 4911, do BCAÇ. 491, em Sanza Pombo.
Ao tempo, operavam-se mudanças no dispositivo militar da RMA e estas, na área da província do Uíge, tendiam a aproximar as guarnições da capital (Carmona), concertando acções - na dependência directa da ZMN, que a partir de 24 de Março passou a ter Almeida e Brito como comandante interino.
Os Cavaleiros do Norte, esses, instalados no aquartelamento do (entretanto extinto) Batalhão de Caçadores 12, na saída para o Songo, adaptavam-se à vida e postura de cidade.
A alguma displiscência de atavio, tolerada em guarnições não urbanas, passou a ser mais «fiscalizada» pela entretanto criada Polícia Militar - com efectivos do próprio Batalhão e com a missão de olhar o aprumo dos militares na cidade e, em casos mais delicados, intervir para que se serenassem ânimos. E lembremos que, ao tempo, já era visível a animosidade da população civil, relativanente à comunidade militar.
- ZMN. Zona Militar Norte.
- CCAÇ. 4741. Companhia de Caçadores 4741/72. Esteve em Angola de 1972 a 1974. Contactos: João Maria Marques Celorico, telefones 966643705 e 969642502; e M. Santos, 224835548.
. BCAÇ. 4911. Batalhão de Caçadores 4911. Esteve em Angola de 1973 a 1975. Contacto: Duarte, telefone 933643769.

quarta-feira, 16 de março de 2011

A revolta das Caldas e os futuros Cavaleiros do Norte

Pavilhão do RC4 onde estiveram detidos os sargentos e alguns oficiais da Revolta das Caldas e foi «casa» dos furriéis milicianos do BCAV. 8423 (foto de 26 de Agosto de 2010). Em baixo, 1ª. página do Diário de Notícias a noticiar o levantamento militar abortado a 16 de Março de 1974. Há 37 anos!


O chamado Levantamento das Caldas, Intentona das Caldas ou Revolta das Caldas aconteceu na madrugada de 16 de Março de 1974. Faz hoje 37 anos! Era um sábado e nós, os futuros Cavaleiros do Norte, tínhamos entrado, na véspera, no gozo da chamadas Licença das Normas - que, na prática começavam a 18, 2ª.-feira seguinte, e iriam até 28.
A tentativa de golpe de Estado é tida por muita gente como o pronúncio do 25 de Abril e muitas vezes é citada como o catalisador que aglutinou o oficialato em torno do MFA.

Nós, por Santa Margarida, de nada disso sabíamos e, em casa e no dia um de férias, devem imaginar a estupefacção ao ver, na RTP do tempo, a notícia da revolta abortada. 
Soube-se, mais tarde, que  estava prevista a participação de outras unidades militares, mas só o Regimento de Infantaria 5 das Caldas da Rainha avançou para Lisboa, sob o comando do capitão Armando Marques Ramos. Isolado na «aventura», foi travado por unidades leais ao regime, já às portas de Lisboa e sem derramamento de sangue.
As consequências não se fizeram esperar e foram presos cerca de 200 homens, entre oficiais, sargentos e praças. O que viemos a saber, após o nosso regresso ao RC4, é que os (ou alguns) sargentos e oficiais milicianos da revolta estiveram detidos no pavilhão que, no RC4, nos «hospedava» como mobilizados para Angola.
Seria nele que, a 25 de Abril, de 1974, eu mesmo iria saber notícias do dia quando, madrugador como sempre, desfazia a barba e ouvi o comunicado: «Aqui, posto de comando do Movimento das Forças Armadas...». Fui a correr acordar a malta, que ainda dormia o último sono.

terça-feira, 15 de março de 2011

O primeiro patrulhamento misto na cidade de Carmona


Vista aérea do BC12, em Carmona, de onde saíram os patrulhamentos mistos.
Em cima, a estrada para o Songo

A 15 de Março de 1975, em Carmona, realizou-se o primeiro patrulhamento misto - envolvendo militares portugueses e forças da ELNA, das FAPLA e das FALA.
Fomos «avisados» de véspera, chamados ao Gabinete de Operações do BC 12, com indicações precisas sobre como agir. Tivemos alguns receios, uma mão-cheia de dúvidas! Como vai ser e não vai? Quem comanda quem? Que armamento? De Luanda, continuavam a chegar-nos notícias preocupantes sobre a (não) aproximação pacífica dos elementos dos três movimentos emancipalistas e muito embora em Carmona se vivesse na paz dos anjos, não seria de espantar que, a um qualquer  momento, pudessem rebentar problemas. Bem prevenidos andávamos para tal.
De mais perto - mais perto que Luanda, já quase nas nossas barbas... -, havia também notícias de incidentes em Salazar. E não eram as melhores.
«Verificou-se o deteriorar da situação», anota o Livro de Unidade.
E nas nossas memórias estavan frescos os incidentes de Aldeia Viçosa, a 2 de Fevereiro - onde a 2ª. Companhia (do capitão Cruz) teve de puxar dos galões (e das armas e da coragem da guarnição) para sanar as diferenças que FNLA e MPLA queriam resolver a tiro e à bomba.
A experiência do patrulhamento misto, felizmente, veio a decorrer sem quaisquer problemas. A FNLA comemorou o seu aniversário nos locais da cidade que entendeu e às forças mistas coube fazer a respectiva segurança. 
Ver AQUI.
E AQUI.
- ELNA. Exército de Libertação Nacional de Angola, força armada da UNITA.
- FAPLA. Forças Armadas Populares de Libertação de Angola, forma armada do MPLA.
- FALA. Forças Armadas de Libertação de Angola, força armada da FNLA.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A preparação militar de há 37 anos, em Santa Margarida

Marco geodésico da Mata do Soares. Por aqui andou
o BCAV. 8423 a fazer a sua preparação militar

A 15 de Março de 1974, o Batalhão de Cavalaria 8423 teve a primeira inspecção de Instrução Operacional, depois de uns vários dias de «guerra» na Mata do Soares. Preparação militar intensa, quase «real» - durante a qual, de forma muito aproximada, se recreava o ambiente de guerra. 
O dia de hoje (dia 14, uma quinta-feira) de há 37 anos, era assim aguardado com expectativa. É que, assim fosse feita a inspecção de sexta, iríamos de imediato ter as chamadas Licenças de Normas: 10 dias de férias.
Mal sabíamos nós o que se preparava para o dia 16, a chamada revolta das Caldas. Nem imaginávamos!
Por nós, de malas e sacos feitos, o importante era que a inspecção corresse bem (e correu!...) e, sobre operacionalidade e pontualidade, firmeza, competência, coragem, atavio, aprumo e disciplina, etc., etc., nos mandava recados o comandante Almeida e Brito - por quem, ao tempo, tínhamos respeito medido em distância física. Nada de grandes intimidades. Por ele, nos falavam os aspirantes a oficiais milicianos (futuros alferes), gente da nossa escola e idades. Ou, menos vezes mas sempre mais austeros e exigentes, os sempre inspectivos 1º.s sargentos. Que não eram posto de muitas empatias com os futuros furriéis milicianos.
A noite de hoje, de Março de 1974, foi tenpo para, no SIMCA 1100 do Neto, «voarmos» Tramagal fora, a caminho de Abrantes - para refeiçoar em restaurante já nosso conhecido e por cuja portas e arredores se passeavam meninas que nos aguçavam os olhos e despertavam apetites. Tínhamos nós, futuros Cavaleiros do Norte, então, uns graciosos e esfomeados 21 para 22 anos de desejos.

domingo, 13 de março de 2011

O 2º. Comandante do Batalhão de Cavalaria 8423





A um dia de meados de Março de 1975 chegou a Carmona o capitão José Diogo Themudo, que viria a ser o 2º. Comandante do Batalhão de Cavalaria 8423.
O oficial inicialmente nomeado para a função, o major Ornelas Monteiro, apresentara-se a  4 de Fevereiro de 1974, ainda no Campo Miliar de Santa Magarida, mas fôra desmobilizado em vésperas do embarque para Luanda - por solicitação do Movimento das Forças Armadas (MFA). Esteve, assim, o Batalhão de Cavalaria 8423 sem 2º. Comandante nada mais nada menos que cerca de 10 meses - entre Portugal e Angola.
José Diogo Themudo veio a ter papel determinante na história dos Cavaleiros do Norte, que interinamente comandou a partir de 24 de Março - quando o tenente-coronel Almeida e Brito passou a comandar a Zona Militar Norte. Também interinamente.
Era oficial discreto, eficaz, competente, dos que não precisam de exigir palada para serem respeitados. Ele próprio contou a este blog a forma como chegou a Carmona e aos Cavaleiros do Norte, depois de uma mobilização que não teve destino, de umas «férias» passadas nas praias e apetites de Luanda, à espera de ser colocado, e até que o destino o pôs à fala com Almeida e Brito - que no aeroporto de Luanda o convidou para 2º. comandante do BCAV. 8423.
Ver AQUI. 

sábado, 12 de março de 2011

O ADEUS DA 2ª. CCAV. À VILA DE ALDEIA VIÇOSA



Aldeia Viçosa, alguns anos antes da passagem da 2ª. CCAV. 8423


A 11 de Março de 1975, completou-se a rotação da 2ª. CCAV. 8423 de Aldeia Viçosa para Carmona. Somava-se uma nova etapa da jornada angolana dos comandados do capitão miliciano Cruz.
Um primeiro grupo de combate desta companhia já estava na cidade, deslocado aquando da rotação da CCS, a 2 de Março. Reforçava-se, assim, a guarnição citadina - que estava muito reduzida. Pouco mais era, mesmo a partir desta data, que a CCS e a própria 2ª. CCAV. 8423. E a verdade é que era uma garnição manifestamente insuficiente para «garantir os serviços solicitados ao batalhão». Que eram muitos.
Sem precisar o período, ocorre-me que os militares operacionais estavam de serviço dia-sim-dia-não - e apenas para garantir a segurança do BC12, do Comando da Zona Militar Norte (e do Sector), numa altura em que já se murmuravam prováveis retaliações dos militantes dos movimentos emancipalistas, nomeadamente dos chegados do mato e em relação a alguns civis. A sobrecarga de serviços levou mesmo, por esse tempo, a que alguns especialistas passassem a fazer serviço de escala, no interior das unidades, para, de alguma maneira, folgar os que repetidamente tinham de sair - para patrulhamentos, escoltas, policiamentos e outras acções no exterior.
O companheiros da 2ª. CCAV. 8423, naturalmente, folgaram com esta transferência: a cidade oferecia-lhes um mundo civil que inexistia em Aldeia Viçosa. E a chegada a Carmona era, também, a sua primeira etapa no caminho para Lisboa. Que aconteceria a 10 de Setembro. Não se sabia, a esse tempo, mas ainda faltava meio ano.

sexta-feira, 11 de março de 2011

O aquartelamento da 1ª. CCAV. 8423 na fazenda de Zalala


Aquartelamento de Zalala, onde estacionou a 1ª. CCAV. 8423


O Dias jornadeou por Zalala, depois por Vista Alegre e Carmona, antes de Luanda e de voltar a Lisboa, nos primeiros dias de Setembro de 1975.
Mandou-nos uma foto do aquartelamento e com uma definição claríssima de posições. Foto, faz dele questão de frisar, «
obtida de ângulo com visionamento total» das instalações militares da subunidade comandada pelo capitão miliciano Castro Dias.
Diz o Dias, o furriel:
«As instalações mais à direita, estavam fora do arame farpado e eram, as do primeiro plano, destinadas a militares que quisessem ter lá a família. Creio que nunca foram utilizadas para esse fim, pelo menos pelo nosso pessoal. Recordo-me de uma situação de punição, do foro disciplinar, em que foi uma das dependências utilizada como cela.
Atrás destas, era o campo de futebol e depois, uma serração de madeiras. Dizia-se que neste local, em 1961, foram mutilados corpos de cidadãos brancos.

Na parte do centro esquerda, temos então o aquartelamento. A vista da entrada é impedida por pavilhões de café, contíguos ao parque de viaturas e refeitório. A seguir, as casernas - à esquerda e á direita. Do lado esquerdo, ficavam também a cantina, as transmissões e o material de guerra. Mais à esquerda, o edifício mais pequeno, eram as instalações sanitárias e de higiene, com o posto de sentinela no "primeiro andar". Ao fundo, uma torre com depósito de àgua e um outro posto de vigia. Antes desta, um pouco à direita, o edifício de comando e a messe de oficiais e, mais à direita, o edifício que, na cave, albergava a enfermaria e, no rés do chão, a secretaria, o bar, a messe e aposentos de sargentos.
- DIAS. João Custódio Dias, furriel miliciano
de transmissões de infantaria. Aposentado da
Polícia Judiciária e residente em Tomar.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Capitão José Paulo Fernandes, comandante da 3ª. CCAV. 8423

Capitão miliciano José Paulo Fernandes, comandante
da 3ª. CCAV. 8423, a de Santa Isabel


A 3ª. CCAV. 8423, a de Santa Isabel, comandada pelo capitão miliciano José Paulo Fernandes, ficou no Quitexe - quando, a 2 de Março de 1975, a CCS rodou para o BC12. Muitas dores de cabeça por lá iria ter.
O comandante do Batalhão, tenente-coronel Almeida e Brito, prestou-lhe louvor, ao capitão Fernandes, na Ordem de Serviço nº. 174, sublinhando-lhe «a acção desenvolvida no comando da subunidade», funções em que «soube tirar partido das possibilidades logísticas» e, assim, «garantindo o verdadeiro cumprimento da mossão que lhe foi determinada».
O destaque do louvor vai, em particular, para o período da «eclosão dos braves acontecimentos de confronto armado entre os movimentos de libertação, na área do Quitexe».
Ao tempo, «o desequilíbrio» de forças era notório, mas os bravos cavaleiros de Santa Isabel, sob comando do capitão miliciano José Paulo Fernandes, «garantiram o cabal cumprimento da missão» que lhe estava atribuída. 
É o organizador do Encontro da 3ª. CCAV. 8423 de 2011, em Torres Vedras, a 4 de Junho. Pode ser contactado pelo telemóvel 917588737.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Os garbosos Cavaleiros do Norte de Aldeia Viçosa



A 2ª. CCAV. 8423 estava aquartelada em Aldeia Viçosa, a uns 40 quilómetros do Quitexe, sempre em piso de asfalto. Na chamada Estrada do Café, entre Carmona e Luanda.
Era comandada pelo capitão miliciano José Manuel Cruz, que a memória do batalhão veio a fixar como oficial que «aquando da eclosão do grave conflito armado entre os movimentos de libertação, na cidade de Carmona» liderou pessoal que «deu verdadeiros exemplos de dedicação, desembaraço e espírito de sacrifício» - como se lê no louvor publicado na Ordem de Serviço nº. 174.

Tinha este quadro de oficiais e sargentos:

COMANDANTE
- CRUZ. José Manuel Romeira Pinto da Cruz, capitão miliciano, professor do ensino secundário, aposentado. Residente m Esmoriz.

ALFERES MILICIANOS
- CAPELA. Jorge Manuel de Jesus Capela, atirador de cavalaria. Empresário do sector da contabilidade e informática, residente em Oeiras.
- CARVALHO. Domingos Carvalho de Sousa, atirador de cavalaria. Técnico de vendas, residente em Marrazes (Leiria).
- MACHADO. João Francisco Pereira Machado, operações especiais. Aposentado da administração fiscal, residente na Amadora.
- MENESES. Manuel Meneses Alves, atirador de cavalaria. Chegou em Fevereiro de 1975. Reside em Leiria.
- PERIQUITO. João Carlos Lopes Periquito, atirador de Cavalaria.
- RAMOS. Fernando António Morgado Ramos, atirador de cavalaria. Colocado na 2ª. CCAV. 8423 em Maio de 1975 (além do QO).

SARGENTOS
- EIRA. Manuel Alcides da Costa Eira, 2º. sargento miliciano de enfermagem. Residente em Vila Real. Chegou à 2ª. CCAV. em Abril de 1975
- NORTE. Fernando Mendes Pereira Norte, 1º. sargento. Falecido. Residia na Cova da Piedade.


FURRIÉIS MILICIANOS
- BREJO: João António Piteira Brejo, atirador de cavalaria. Aposentado, residente em Palmela.
- CHITAS. António Milheiras Courinhas Chitas, armamento pesado. Residente no Sobralinho (Vila Franca de Xira).
- COSTA. José Manuel Cerqueira da Costa, atirador de cavalaria. Residente em Santa Cruz do Bispo (Matosinhos).
- CRUZ. António Oliveira da Cruz, atirador de cavalaria. Residente em Figueiró (Vieira do Minho). 
- FERREIRA. José Maria Freitas Ferreira, atirador de cavalaria. Foi reclassificado como amanuense e colocado em Luanda, na CCS do QG, a 1 de Novembro de 1974.
- GOMES. José da Silva Gomes, atirador de cavalaria. Residente em Vila Nova do Prado (Vila Verde).
- GUEDES. António Artur César Monteiro Guedes, atirador de cavalaria. Aposentado da GNR, residente em Foros de Salvaterra (Salvaterra de Magos).
- LETRAS. António Carlos Dias Letras, operações especiais. Empresário da área do mobiliário metálico, residente em Palmela.
- MARTINS. Amorim António Barrelas Martins, atirador de cavalaria. Residente em Pegões (Gare).
- MATOS. Mário Augusto da Silva Matos, atirador de cavalaria. Quadro de empresa, residente em Anadia. 
- MELO. José Fernando Nôro Dias de Melo, atirador de cavalaria. Agente da GNR, aposentado. Reside em Leiria.
- MOURATO. Abel Maria Ribeiro Mourato, vagomestre. Residente em Vila Viçosa.
- PINTO. Jesuíno Fernandes Pinto, atirador de cavalaria. Residente em Parada de Gatim (Vila Verde).Chegou à 2ª. CCAV. em Agosto de 1974.
- RAMALHO. Rafael António Pimenta Ramalho, atirador de cavalaria. Funcionário público aposentado, reside em S. Bartolomeu (Vila Viçosa).
- REBELO. António Augusto Faria Novais Rebelo, transmissões de infantaria. Funcionário camarário em Guimarães.
- Nota: Estes dados poderão ~
ter uma ou outra desactualizações.