Casal e furriel Teixeira, no Quitexe (1973)
ANTÓNO CASAL FONSECA
Texto
Andava aqui às voltas com as fotos do Quitexe e retive uma, por alguns minutos. Caramba, o “meu” furriel de transmissões a posar a meu lado?!
Além de ser, para mim, uma pessoa com características muito especiais, principalmente pelas razões que em tempos aqui descrevi, foi também a pessoa que um dia me surpreendeu ao dizer-me: «Sei que és meu amigo, portanto ouve-me se tiveres um bocadinho»! E eu ali fiquei, com todo o tempo do mundo, no papel de confessor, meio atrapalhado, assim… sem mais nem menos! E chorou! Chorou convulsivamente! A razão, não a posso nem devo aqui revelar, mas se me ler, e eu espero que sim, ele saberá bem do que falo. E bem melhor que eu!
Como ele sempre fez questão de frisar, sem a ninguém guardar segredo, era de uma família muito humilde, e por ela deixou o Seminário. Dizia-me que o que mais o amargurava era não poder estar junto dos irmãos, não tanto pela saudade mas pelas necessidades que lhes adivinhava. Sempre entendeu ser uma injustiça a sua mobilização, quando tinha tanta gente para cuidar. Pois tinha, «como tantos outros, milhares...», - fazia-lhe eu ver para lhe atenuar o desassossego!
As férias, pelas quais tanto ansiava, foram passadas no Quitexe, da maneira mais simples que se possa imaginar.
«Gostava de ir ao puto como alguns vão, mas não há taco!...”, disse-me mais uma vez com a voz embargada e os lábios a tremerem-lhe!
Pois…, ele bem queria, e até sei que precisava, mas não podia mesmo! As férias não passariam do Quitexe, tirando duas ou três deslocações a Carmona, mas sem se estender nos gastos. E era a retenção de gastos, uma das razões porque raramente tinha a companhia dos colegas furriéis, segundo me dizia com ar algo desgostoso! Muito desgostoso mesmo, mas camuflado (mal) pelo seu sorriso franco que o tornava, penso, mais vulnerável.
E era verdade, não precisava de mo dizer! Infelizmente!
A muito custo lá me pediu a máquina para tirar meia dúzia de fotos nas férias, mas fez questão de tirar esta comigo.
“É para um dia, quando eu morrer, te lembrares do teu furriel!...”, disse-me, com um sorriso amarelo e com ar de quem tinha dito a maior piada do dia! Mas não morreu, felizmente, e, tanto quanto sei, continua bem vivo e de boa saúde na casa que o viu nascer, em terras transmontanas!
Munido de máquina fotográfica, lá foi com um companheiro até Carmona, disposto a “arrasar”. «Vais ver pá!!!...». Mas começou mal!..., da pior forma possível! Com tantas mulheres jovens e bonitas na cidade, logo havia de deitar o olho a um borracho…casado!
«Tive azar pá…como é que eu sabia que era casada?..., não podia adivinhar…são todas iguais»!, desabafava ele, já no Quitexe, e inteiro de corpo porque fora salvo pelo Palma “candongueiro”, o guarda-costas do comandante!
«Qualquer manguelas, a milhas de distância, vê a pinta da fêmea…tá lá tudo escrito…ali!...», opinava de cigarro no canto da boca retorcida de tiques, o Martins do Cais do Sodré! Com esta do “tudo escrito” é que o furriel se baralhou! ~
«Se quiser umas explicações sobre mulheres venha ter comigo…mas paga bem…», insistia ele no seu discurso de presunçoso “matador”!
Não perdeu tempo, o furriel, a tentar decifrar o discurso demasiado gasto e, também por via disso mesmo, já despido de toda a graça!
Serenamente e num jeito educado que sempre lhe foi peculiar, lá foi cumprindo a sua obrigação, sem grandes alardes nem conquistas amorosas mas, ao contrário do Martins do Cais do Sodré, não viu posto em causa o seu regresso à então Metrópole! Pois é, um verdadeiro (g)aranhão não se deixa envolver na teia que tece!...
Agora, que tenho saudades do meu furriel Teixeira…lá isso tenho! É verdade!..., o que é que eu hei-de fazer?!
ANTÓNIO C. FONSECA
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