Restaurante Pacheco, no Quitexe, mesmo em frente à messe de oficiais e casa de furriéis (foto 2005)
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ANTÓNIO CASAL DA FONSECA
Estou aqui a lembrar-me das nossas idas à lenha, para  os lados da fazenda Santa Isabel. Não digo que fosse uma saída de alto risco,  como eram as escoltas aos fazendeiros, onde estes eram, como muito bem se sabia,  os alvos privilegiados. 
Alguns, até mesmo já identificados pelo IN, por razões  que agora não vêm ao caso, e que até gozavam de estatuto especial no que à  protecção respeitava. Não era de alto risco, mas também não era nenhuma balda! 
 A minha última ida à lenha, em Fevereiro/Março de 1973,  ficou marcada por um episódio rocambolesco, dos que só nos acontecem, em  princípio, uma vez na vida. Espero bem que sim, mas se voltar a acontecer, não  será em terras de Angola! Bom, o dia de amanhã, como se diz, ninguém o  viu!...
 Sentado num molho de lenha seca, ali deixada por alguém,  almoçava eu e o Domingos, com quem trocara a minha lata de rojões pela de  atum, dele. Mas havia ali, na lenha, alguma coisa de estranho que já incomodava! O  Domingos olhou para mim, eu olhei para o Domingos, e por instinto e em  simultâneo ganhámos molas no traseiro! «F….pá, que é isto?!..., a lenha está a mexer-se!»,  exclamava ele, de olhos esbugalhados e com metade dos rojões no camuflado! 
Ali  havia coisa…, e mexia! E afinal havia mesmo! Uma cobra de consideráveis  dimensões e na firme disposição de se defender, agora que era o centro das  atenções! 
 Antes que alguém começasse aos tiros, desordenadamente, e  sabendo-se bem que havia ali meninos capazes de o fazer, teve o alferes que se  impor! E com má cara, quando já via três ou quatro com a mira no réptil!  
 Calhou ao Teixeira, que dias antes demonstrara ser um ás  com a G3 – a gastar balas para não perderem a validade, ali num qualquer  descampado!... -, tentar matar o bicharoco e de preferência com um tiro! É que,  pelo menos no meu tempo, as balas não eram para gastar de qualquer maneira e  delas teriam de ser prestadas contas!
 O Teixeira, bom na mira e no gatilho, e ainda por cima  incentivado por um almoço prometido pelo alferes, acertou à primeira!  
 «Ora, que avaria, a menos de  um metro de distância e quase com a arma a fazer-lhe festas, se falhasses eras  preso pá!», ria-se o alferes Sousa,  agora bem mais solto e de peito feito. Antes só dera uma espreitadela bem  discreta, não fosse o diabo tecê-las!
 Mas o alferes cedo se esqueceu da promessa e qual almoço  qual carapuça! Não se conformou o Teixeira, que não teve pejo em  “envergonhá-lo”, no Pacheco e com casa cheia, em almoço de domingo: «Então, meu alferes?, Vim aqui convencido que me pagava o tal  almoço que me prometeu! Posso  pedir o prato?».
 Claro que o alferes cumpriu a promessa, ali mesmo, com  sorriso de orelha a orelha, mas bem amarelado! Nada preocupado estava o Teixeira,  com a cor do sorriso do seu comandante de pelotão, de quem era (é) grande amigo,  desde que viesse o tal bife com batatas fritas!  
 O alferes Sousa, sempre tão cumpridor e empenhado em  passar despercebido, ainda se viu em papos de aranha para justificar o disparo  daquela bala! 
 «Se houve disparo, tem de  existir relatório!», insistia o capitão! E houve,  embora com dois dias de atraso, mas tão exagerado (e aldrabado!...) que o  Domingos acabou por constar nele quase como herói! E muito bem! Afinal, eu e o  Domingos tínhamos sido atacados por um réptil perigosíssimo! Tinha-nos valido o  Teixeira, destemido! Francamente, não demos por nada, mas se o relatório do  oficial o dizia, quem éramos nós para o desmentir?!  
 E ainda hoje se diz que o seu louvor se deveu àquele acto  de coragem, já que de coragem falava o louvor, e outro acto de relevo não se lhe  conhecia! 
Grande Teixeira!!!  
ACF   

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