quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O alferes Cruz de oficial dia na madrugada da guerra....

Margarida e António Albano Cruz, amazona e cavaleiro
do Quitexe de 1974/75 (em cima). Em baixo, à esquerda, António Pais


Cruz é nome repetente na CCS do BCAV 8423! Há o Cruz alferes e o Cruz furriel. Este tem sido, por estes nossos 34 anos de civis, meu companheiro de muitas «jantas»! Cruz, o alferes, voltei a vê-lo agora: charmoso, hein!! E bem acompanhado pela doce Margarida dos seus amores! Tão amores, tão amores que a levou de mala aviada e filho no colo para o Quitexe de 1974. E para a Carmona de 75. Bate aqui o ponto!
O (alferes) Cruz, que é engenheiro de formação e vocação dada aos cantos corais, orou na convívio da pateira. Orou emocionado, de coração a pular de alegria e com a nostalgia das saudades dos tempos angolanos que nos fizeram mais homens! Falou com uma sílaba e outra a saltar por cima de outra e de nó entalado na garganta. Eu conto: estava ele de oficial de dia, no BC12 e na madrugada em que rebentaram as «macas» de Carmona. Sabe-se lá!!!! A metralha soltava-se na madrugada, sem escolher alvo ou inimigos; e sem se saber por quem era e para onde era atirada. E ele, alferes Cruz, de oficial de dia, com a mulher e o filho na cidade! Margarida e o bebé Ricardo em perigo e ele sem poder sair do quartel, sem o poder abandonar. Até que pôde: o comandante Almeida e Brito até lhe emprestou o carro, o «carocha» preto: «Vai lá, vai rápido...!».
Não arrancou o velho «carocha», com o motor a trabalhar..., e Cruz ficou ainda mais enervado e ansioso: «O meu filho, a minha mulher!...». E o «carocha» não andava. Com os nervos, Cruz não o tinha destravado.
Olharam-no alguns soldados, na parada! Os momentos eram de grande tensão! Bravos cavaleiros do norte, mesmo sem sequer serem atiradores da valente cavalaria portuguesa, deram-lhe a força solidária. «O meu alferes não vai sozinho... vamos consigo!!!».
Que não e que sim. Foram e vieram, em viatura militar, com Cruz de filho agarrado ao peito e a «música» negra dos silvos das balas e dos morteiros a estrelarem os céus de Carmona. As rajadas a comporem uma estranha sinfonia! Chegaram ao BC12!
«Quanto eu gostava de me lembrar dos nomes desses rapazes!! Quanto gostava, aqui!...». E quase uma lágrima se lhe soltou na barba grisalha, na tarde do Encontro de Águeda, com Margarida, a suave Margarida dos sonhos e da vida de Cruz, a dar-lhe a mão e a força. «Como eu gostava!! Desculpem, estou emocionado!!!...».
De trás, falou o António Pais, rádio-montador, de Viseu. «Um, fui eu!...».
Muitas lágrimas se soltaram e esconderam naquele momento, na sala Pato Real da Estalagem da Pateira. Os dedos indicadores, muito disfarçadamente, secaram a água de emoção que nos caiu dos olhos! Foram cúmplices com as memórias que casaram um mar de emoções, entre mordidelas de lábios e puxar de lenços!
- CRUZ. António Albano de Araújo Sousa Cruz. Alferes miliciano mecânico, natural de Santo Tirso. Fez a comissão acompanhado da esposa Margarida, médica, e do filho Ricardo, o bebé-mascote da CCS do BCAV. 8423.
- PAIS. António Correia Lourenço Pais, 1º. cabo rádio-montador, empresário do sector eléctrico em Viseu, de onde é natural.

8 comentários:

SANTOS disse...

Esta história foi muito comentada na altura, eu felizmente não estava no BC12, pois estava de férias em Luanda e fartei-me de sofrer porque não conseguia saber novidades de Carmona.
Um abraço para todos os cavaleiros que estiveram em Águeda no encontro de sábado, onde não pude estar e um grande abraço pró Viegas que eu sei que foi o pai da ideia e concretizou-a.

OLIVEIRA disse...

Gostei de reencontrar estes amigos todos na foto embora já não me lembre do nome de quase todos eles, mas lamento não ter sido avisado do encontro, só ontem soube dele, vou mandar o meu contacto para o Viegas. Tinha gostado de estar convosco...
Também me lembro desta história bem lixada do alferes Cruz que estava de oficial de dia mas não sabia que o Pais tinha ido, ele era das transmissões, não era... estes encontros são bons para recordar estas coisas e tenho pena de nunca ter participado em nenhum moro na zona de Almada.

Anónimo disse...

Meu Caro Celestino,

Se ainda não dei notícias é porque queria encontrar as palavras certas para te transmitir a felicidade que foi passarmos todos o dia juntos.

Quando vinha para baixo não me saía da ideia uma coisa muito simples: a nossa força foi a de sabermos que estávamos todos em Angola por uma causa de BEM. Isso ajudou-nos em cada dia a tentarmos ser justos, correctos, amigos dos outros (mesmo dos "inimigos") e positivos na nossa acção. Por outro lado, em situações-limite de stress e de perigo vieram ao de cima as características mais nobres do povo português ...

Espero escrever algo sobre isto em breve.

Um grande abraço de gratidão por tudo o que fizeste por nós.

Zé Alberto

Tomas disse...

Quem se lembra do cozinheiro que nessa madrugada veio à Sanzala? Era velo a dar as "canetas" estrada fora a caminho do BC12 debaixo de fogo. Isto é o que eu chamo de homem coragem. Eu estava a espreitar pelo posto de vigia da sala de operações e dada altura disse para o Emanuel dos SANTOS (quem é o bacano que vem ali a correr?). Só depois foi descuberto o segredo. "À GRANDES CAVALEIROS".

Anónimo disse...

Saudades de conviver com esta gente boa...

Anónimo disse...

Meu caro Viegas, a narrativa é fabulosa e descreve estes momwetos com pormenor, são estes momentos que nos emocionam porque foram vividos com muita intensidade; eu não me lembro desta situação mas parece que a estou a ver, lembro-me bem do alferes Cruz, era das oficinas não era...

Anónimo disse...

As palavras do vosso colega ex-Alferes Almeida trouxeram-me à memória o discurso feito pelo nosso Comandante no 1º encontro. É certo que foi mais extenso mas todo ele se poderia resumir às palavras do vosso amigo Alberto. Direi até que no fim do discurso alguns afirmaram sentir que tinham cumprido um dever, uma dúvida que até certo ponto os incomodava à dezasseis anos.
Se em 1990 gostei de as ouvir, agora gostei de as ler!
Casal

Anónimo disse...

Era bom praça, o nosso alferes, andei com o filho dele algumas vezes ao colo na parada...
Teixeira