terça-feira, 27 de outubro de 2009

O golpe de mão que não chegou a ser... porque não era!

Os serviços nocturnos não eram pêra doce, no Quitexe. Os postos de vigilância ficavam à volta da vila, a várias centenas de metros - que nos obrigavam a longas e prudentes caminhadas! A sanzala, cujo nome não lembro, ficava nas traseiras da administração civil e por ali tinha um dos postos de vigia dos mais temidos da noite.
Descia-se e subia-se um caminho de terra, com uma subida íngreme à chegada de enormes campos da ananás. E lá ficava, em cima, o posto, de três pisos, com as respectivas vigias. Muitas vezes, por ser distante, ia-se de jeep. Como na noite a que reporto.
O grupo da ronda, para se assegurar da forma como era feita a vigilância, resolveu ir sem luz, a partir de certa altura, e parou a uns 100 metros, talvez 150..., do posto. E progredimos, com toda a técnica aprendida na serra de Penude, no duro curso de Operações Especiais - os Rangers, de Lamego.
A noite era soprada de uma brisa quente que nos goticulava a testa, a cara e escorria por todo o corpo abaixo. Estranhamente, não havia sinais que se vissem do posto de vigia. E devia haver! Continuámos, até rastejámos e... nada! Já era preocupante! O que estaria a acontecer? Chegámos junto ao posto e... nada. E apanhámos um susto: ao olhar uma plantação de ananás, a brisa quente fazia ondear as folhas, parecia um mar! Um mar que nos amedrontava! O posto de vigia tinha a porta aberta, o que também era estranho! Teria havido um golpe de mão?!
Entrar, não foi fácil, estávamos com medo! Sem saber o que nos esperaria! Mas entrámos, em silêncio sepulcral, a transpirar de medos. Subimos ao primeiro piso, pela escada de madeira, a chiar! E... nada. Vimos dois vultos estendidos, como se dormisssem. Supusemos o pior. Um de nós, pisou uma G3 e confirmámos que estavam vivos! Dormiam!!! Pronto, golpe de mão não havia! Mas... e o militar que deveria estar de vigia?! Sabíamos quem ele era e sussurrámos o nome, sem qualquer eco de resposta. Subimos ao piso de cima e lá estava ele, de mira apontada para o lado do Quitexe, para a caminho que nos trouxera.
Poupemos palavras: ele ouviu o barulho e a luz do jeep, mas deixou de o ouvir e de a ver, sem identificar o que quer que fosse. Fixou-se, à distância de uns 150 metros, no que ele próprio não queria ver: um potencial perigo. E não via. Nós tínhamos progredido, no silêncio da noite quebrado pela brisa, já fora do ângulo de visão dele. No piso de cima, chamámo-lo e ele confundiu-nos com os dois companheiros de vigia.
«Estou a vê-los! Acolá....». E apontava para de onde nós vínhamos!
Demorámos tempo até que o conseguimos tranquilizar. Foi uma noite de medos! A de um golpe de mão que não chegou a ser... porque não era?

2 comentários:

Tomás disse...

Por ver este plantío de ananases(!), ou abacaxis?, veio à minha memória um caso muito engraçado e que aconteceu em Carmona, mas eu passo a contar: Quem se lembra do condutor da secretaria do comando? O seu nome era Breda (nome de metralhadora). Bom moço, muito calmo, quase dois metros de altura e que ás vezes era pena não usar a sua estatura, pode dizer-se, e ele não leva a mal, que era timido. Mas vamos à história; um belo dia, estavamos já a queimar muita papelada, do lado de fora onde saiam as viaturas ou seja junto ao depósito da água, quando eu, o Santos (cabo escriturário) e o Breda reparamos num bonito terreno cheio de abacaxis(!). Naquela altura pedimos ao Breda "é pá podias fazer um favor, e o que é; como és mais forte podias ir ali aquele terreno e trazias alguns abacaxis; está bem." Eu e o cabo Santos estavamos atarefados para não perdermos nenhum documento visto ser documentos com procedências diversas: confidencial, secretos ultra secretos etc. A dada altura lembramo-nos; o Breda? Quando olhamos para o terreno vimos que afinal fizemos mal. Ao fim de um ano de comissão, o nosso amigo Breda ainda não sabia que este tipo de fruta nasce em cima da planta, e era velo cheio de garra, com aquele fisico todo,a arrancar as plantas. "ORA AQUI NÃO TEM, ESTA TAMBEM NÃO..." Para o Breda vai um ENORME abraço.

Anónimo disse...

O golpe de mão que chegou a ser...porque o era! E não era brincadeira, não senhor! Em 1973 O Posto 5 foi mesmo atacado e as consequências podiam ter sido trágicas. Lá estavam os valentes soldados a dar o que tinham...e o que não tinham!
Contarei entretanto o que aconteceu e não devia ter acontecido!

A. Casal