quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A última viagem dos Cavaleiros do Quitexe à Fazenda do Liberato

Monumento aos Mortos na Fazenda do Liberato (foto de Luís Patriarca )

O mês de Outubro de 1974, que se sonhou tranquilo, já aqui dissemos que pouco teve disso. Talvez a nossa impaciência, o roer das saudades da terra e das nossas gentes, as notícias que nos chegavam do «puto» sobre as labaredas revolucionárias do PREC («Nem mais um soldado para Angola...», gritava-se por Lisboa e nos quartéis), as esperanças que se semeavam no correio que recebíamos («Diz-se cá que a tropa vem já embora...», o que não veio a ser verdade...), tudo isso de algum modo nos constrangia os dias que não havia maneira de passarem. Nos estressava, dir-se-ia na linguagem de hoje.
O PELREC esteve sempre activo e voava no tempo em tarefas que nos levavam ora a patrulhamentos, ora a escoltas e a operações stop no asfalto (bem perigosas, por sinal...), ora a transportar os homens da acção psicológica que faziam circuito de filmes e palestras pelas sub-unidades.
Por meados de Outubro, o PELREC foi ao Liberato, a Santa Isabel e Zalala, as fazendas onde a tropa estacionava desde 1961/62. Preparava-se a rotação do BCAV. 8423, em evidente retracção do dispositivo militar - levando em linha de conta o cessar fogo anunciado pela FNLA (o partido emancipalista que principalmente operava no Uíge), o MPLA e a UNITA. Iriam ser abandonadas.
O Liberato era longe e de picadas não aliviadas de perigos, onde furrielava no sector de alimentação o meu amigo Zé Marques, que é do Caramulo e agora funcionário da Caixa Geral de Depósitos, em Águeda. Por lá estava ele, sem que eu soubesse e alguma vez o encontrasse.
No regresso, faz anos por estes dias, registou-se uma breve escaramuça, deflagrada a partir de um outeiro para a picada onde passava a coluna militar, felizmente sem passar disso. Mas ainda se ouviram tiros avulsos e em rajada e, por isso e razões de segurança, aprudentou-se ainda mais o risco de alguma minagem ou o rebentamento de armadilhas. Bem se compreende, por isso, o tempo de largas horas que demorou o regresso, o pára agora e avança depois que razões de segurança obrigaram nessa última viagem ao Liberato. De lá, lembro o desconsolo e nostalgia encontrados nos militares, a maior parte deles naturais de Angola. E o monumento aos mortos (foto), que saudámos em continência instintiva e em breves momentos de reflexão!
- PUTO. Designação (peti nom...) habitulamente atribuída a Portugal, pelos militares europeus. Vais ao «puto», tens correio do «puto»?.

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