terça-feira, 31 de maio de 2011

As duas despedidas de Tomás para Angola...



Nem sempre é bom recordar, mas no caso da minha despedida paa Angola, em Maio de 1974, a minha mãe e meu irmão (que já partiram!), foram comigo até à estação de Campanhã, no Porto. Meu irmão, encorajou-me, pois tinha vindo da Guiné e de uma zona 100% operacional (Farim e Cuntima). E disse-me: «Vai descansado que tudo vai correr bem, vais ver...».
Deu-me um abraço, abracei a minha mãe - que me disse, com os olhos em lágrimas: «Deus queira que não tenhas pior sorte do que o teu irmão, que Deus te proteja...».
 Despedi-me e com uma coragem vinda não sei de onde, disse-lhe: «Vai ver que dentro de pouco tempo estou aquí». E assim saí de um café, em direção à estação de Campanhã, com os dois sacos com as fardas às costas e dizendo-lhes adeus. Passado cerca de 24 horas estava eu a entrar pela porta dentro: «Olá, cá estou eu novamente, cheguei...».
Depois, já custou menos, a segunda despedida, sempre na esperança de haver outra surpresa e... voltar. O que equivaleria a já não ir para Angola. Mas o tal regresso, o definitivo, só viria a acontecer 15 meses depois.
RODOLFO TOMÁS

segunda-feira, 30 de maio de 2011

O dia da chegada a Luanda e ao Grafanil...

Baía de Luanda e capela do Campo Militar do Grafanil (1974)

O alvoroço da chegada a Luanda, hoje se completam 37 anos, foi agitado pela curiosidade natural, a de saber como lidar com os naturais e residentes; a adaptação do clima, conhecer o lendário campo militar do Grafanil, saber para onde iriam os nossos juvenis ossos parar. Viemos a saber que seria a vila do Quitexe.
O Grafanil era imenso, como nos tinham dito. Uma mini-cidade militar, com dezenas de unidade e uma população (residente e flutuante) que poderia passar das 20 000 pessoas! Talvez!
A viagem do areroporto, pela cidade e estrada de Catete, até ao Grafanil encheu-nos os olhos e matou-nos algumas curiosidades: os prédios enormes, a circulação automóvel e de peões, brancos e negros misturados, as ruas cheias de gente. Se havia guerra em Angola, não era ali que a conhecíamos. Não se via!
Arrumadas as malas no destacamento que nos estava destinado e acomodado o pessoal, foi dada ordem de saída: à cidade de Luanda se poderia ir! E cada qual que se desencassse para o almoço. Assim foi!! O táxi levou-nos à baixa, deslumbrando-se os olhos com a beleza da baía. Eu levava chouriços e rojões para malta amiga e logo procurei, após almoço, a residência de Mário Neves - parente com apartamento na rua do estádio dos Coqueiros. Não o achei (só viria a encontrá-lo em Setembro, na Gabela), mas lá deixei a encomenda. E fui à descoberta da cidade! Que nos embriagava a curiosidade com o seu cosmopolitismo e a vida social que viríamos a descobrir! Aí, e então, começaram a nascer as saudades de hoje! 
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domingo, 29 de maio de 2011

A noite do embarque para Angola, há 37 anos!!!

Monteiro, Neto e Viegas no refeitório dos cabos milicianos do RC4, em Santa Margarida (1974), dias antes do embarque para Angola. Em baixo, avião Boeing 707 dos Trannsportes Aéreos Militares (TAM)


Ao fim da tarde de 29 de Maio de 1974, hoje se completam 37 anos, subimos os degraus dos autocarros que nos levaram de Santa Margarida (do RC4) até Lisboa. Aí começou a nossa jornada africana.
Foi um dia de estreias: andar numa auto-estrada, conhecer uma portagem e um aeroporto. «Coisas» que eu nunca tinha visto. Como quase todos! E fazer o baptismo de voo num avião. Eu já tinha andado de helicóptero, na instrução dos Rangers, em Lamego. Aí ia a CCS do BCAV. 8423!!!
Choveu a bom chover, no percurso de auto-estrada (que era apenas até Vila Franca de Xira) e pelo tempo em que, já no aeroporto (o AB9), fizemos tempo de espera para o embarque. Íamos viajar de noite - diziam-no que era  por questões de segurança!... - e, do avião, olhar a noite de Lisboa foi um encanto! A cidade era bonita, esmagadoramente deslumbrante, abria apetites para a rasgar até à madrugada!!! Mas nós íamos para a guerra!
Correu bem a viagem! Por mim, recordo-me de ter dormido e, a certa altura, alguém me acordar a dizer que as luzes que se viam na noite já africana eram as da cidade de Bissau, capital da Guiné Portuguesa. E dormi! E comi! Comida de avião? Julgo que sim!
O voo foi de 9 horas! Alvoreceu e nós a ver África do ar, furando os céus que descobríamos estranhamente avermelhados. A ver as tropicalíssimas paisagens africanas. E lá se espreitou Luanda, durante os largos minutos em que o avião de fez à pista do aeroporto internacional! Já era a manhã de 30 de Maio. E que manhã de calor! Que logo nos levou a tirar o blusão e a experimentar o sabor da cerveja angolana.
O comandante Almeida e Brito, o oficial adjunto (capitão Falcão) e o oficial de transmissões (alferes Hermida) tinham viajado uma semana antes e lá estavam à nossa espera. A 1ª. companhia chegou no dia 1 de Junho; a 2ª. CCAV. desembarcou a 4; a 3ª. CCAV. a 5! Assim o Batalhão ficou completo para a jornada angolana - que se iria estender até Setembro de 1975.

sábado, 28 de maio de 2011

Desporto, recreio e espectáculo, antes da guerra...



Pavilhão do Clube Recreativo do Uíge, em Carmona 

A tensão cresceu nos últimos dias de Maio de 1975, em Carmona. Pressentia-se e sentia-se!  Os patrulhamentos eram constantes, na cidade e acessos. As NT, assoberbadas e sempre atentas, protegiam os pontos vitais da cidade - ainda que de forma camuflada, digamos. O aeroporto, as comunicações, o hospital, o abastecimento de água. A guarnição não tinha parança.
Os pequenos conflitos com os movimentos armados também se repetiam. Queriam eles controlar os itinerários - ao que opôs a tropa portuguesa - «a única autoridade militar constituída», como refere o Livro da Unidade. 
O mês de Maio de 1975, sublinha o mesmo livro, «foi o período onde, franca e verdadeiramente, se verificou a viragem das nossas possibilidades de uma ordem que se deseja e quer se impõe seja conseguida».
Carmona, agora Uíge, era a capital da província e, naturalmente, o seu ponto fulcral. Eram permanentes as  quezílias entre o MPLA e a FNLA (que «não aceitava muito bem qualquer outra opção política», numa terra que achava sua). Foram crescendo, tendendo sempre a aumentar, levedando ódios e suscitando instabilidades. A pequena guarnição militar tinha enorme dificuldade em fazer o seu papel de árbitro.
Por estes dias, um grupo de militares ensaiava um espectáculo que iria (mas não chegou) ser apresentado no pavilhão do Clube Recreativo do Uíge. E equipas militares, no  mesmo pavilhão, participavam em torneios de futebol de salão e basquetebol. Sem sabermos, fazíamos cultura, recreio e desporto, em vésperas da iminente guerra.
Assim foi na quarta-feira, dia 28 de Maio de 1975.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O dia em que a partida para Angola foi adiada

Viegas e Ferreira (Pimenta) na messe de cabos milicianos do RC4

A 27 de Maio de 1974, bem de madrugada, acompanhou-me minha mãe até ali abaixo, ao agora chamado Largo do Centro Social da ARCOR - até há pouco tempo baptizado de Cruzeiro. Foi de silêncios a nossa viagem, apeada, da casa ao largo, uns longos 150... metros - onde esperámos o carro do Neto, conduzido pelo Benigno, para com ele irmos de viagem até Santa Margarida. Era o dia da partida para Angola!
A despedida foi rápida: «Pronto, mãe!... Adeus, adeus... quando menos contar, cá estarei de volta!...», disse-lhe eu, cheio de nove horas, feito forte de alma e de coração.
«Adeus, rapaz!...», disse ela. Sem um ai, ou um qualquer sinal de amargura!
Lá fomos, pela estrada fora, a ver abrir a alvorada, até Santa Margarida. Pouco depois, soubemos que a partida fôra adiada para 4ª. feira, dia 29. E estávamos autorizados a voltar para casa. O Neto voltou e fiquei eu por lá, roubando-me a mais uma despedida. A ler, a parlapear com a tropa que por lá ficou e a dar uma volta pela Mata do Soares - por onde fizeramos o IAO! Por lá fui companheiro do Zé Ferreira (o Pimenta, na foto), outro aguedense e companheiro de escola, Ranger do curso seguinte (o terceiro) ao meu (o segundo).
Sabe bem, passados estes 37 anos, recordar estes momentos e, com uma vida entretanto feita, perceber e concluir como era generosa a nossa comunhão com o que a Pátria nos pedia. E pediu-nos a mobilização para Angola - para onde fomos pela razão que este blogue anda a contar.
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quinta-feira, 26 de maio de 2011

O domingo de véspera da minha partida para Angola



A 26 de Maio de 1974, um domingo, gravei o sinal de chamada para a missa. Já tinha a cassete com o dobrar de sinos do funeral do Quim, que se enterrara no dia 12, e eu próprio tocara um repenique de trindades, que fiz de aleluias na torre sineira da igreja.
O dia e a véspera foram passados a vadiar pela aldeia, olhando campos por onde até aí ajudava minha mãe no amanho minguado de terras - o subalo, a pontepedrinha, a codiceira, o serrado, a travessa, o vale do serrano, a longa, a arroteia, a tapadinha..., o valbom, o gramal!!! -, mandando falhas nas águas amoliçadas da pateira e a dar dois dedos de conversa com quem me cruzava nestas minhas horas do «adeus, que vou para... Angola!!!».
Foram dias descontraídos! Muito serenos! Minha mãe, ao tempo recém-viúva, lá me almofadou a mala e o saco que levava de viagem, com conselhos que ainda hoje guardo. «Lembra-se do que me disse faz hoje 37 anos?!...».
Não se lembrava a autora dos meus dias, hoje repousada no Jardim Social aqui do lado, quando há bocado lhe falei e até que lhe disse: « Foi quando fui para Angola!!!...».
«Ah, prá guerra!...», exclamou-se ela, agora a caminho dos 91 anos e de sorriso aberto, a tocar-me no ombro direito com uma espécie de soco, certamente a esconder-me a recordação das dores que ao tempo sentiu.  
Assim dito, logo desfiámos longa conversa, até que lhe chegou a hora da janta. Fui eu de seguida, e de carro, dar a volta por aqueles sítios de há 37 anos, fazendo «reconhecimento» dessas memórias e aqui estou, agora, a editar o post 880 deste blogue dos Cavaleiros do Norte. O tempo passa depressa!
- QUIM. Joaquim Augusto Tavares Pires, 36 anos, conterrâneo então falecido. Irmão de Porfírio, Lurdes, José e Fernando, o actual presidente da Junta de Freguesia de Ois da Ribeira, a minha aldeia natal e de residência. 
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O enconto dos Caçadores do Quitexe da CCS do 3879

A CCS do BCAÇ. 3879 no encontro de 15 de Maio de 2010, na Lourinhã

O encontro da CCS do Batalhão de Caçadores 3879 está marcado para o próximo dia 28 de Maio de 2011, às 10,30 horas, na Azóia, em Leiria.
Junta companheiros que pelo Quitexe jornadearam entre 1972 e 1973, antes de partirem para Ambrizete - onde concluíram a comissão que os levou a Angola.
O organizador é o 1º. cabo Casal, filho da avó do cantor David Fonseca e que, aqui no Cavaleiros do Norte, assina crónicas como António Fonseca. E que belas crónicas, de memórias e de saudades quitexanas!

A almoçarada será no restaurante O Casarão e a concentração no parque do dito cujo. Os Caçadores do Quitexe partilharão logo depois (11,30 horas) a celebração de missa na igreja local - antes do almoço (13).
«O resto...será conversa! Da boa!!!», diz-nos António Fonseca, o Casal da 3879.
Bom encontro, ó malta!!!

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O Destacamento da Ponte do Dange


Ponte do Dange, onde a 1ª. CCAV. 8423 teve
um Destacamento, em 1974 e 1975


A 1ª. CCAV. 8423. a de Zalala, rodou para Vista Alegre a 22 e Novembro de 1974 e, por consequência, ocupou o Destacamento da Ponte do Dange - precisamente para fazer segurança à ponte - que era vital na estrada do café, ligando Carmona a Luanda.
Vista Alegre, relativamente a Zalala, tinha muito melhores condições. Era já uma vila, embora pequena, com estrada de alcatrão em frente ao quartel - a tal estrada do café...
«Eu já não digo «aquartelamento”, porque a diferença de qualidade das instalações era muito significativa, por isso sendo grande o nosso alívio em poder deixar de combater, entre ”outros inimigos”, a anterior picada de Zalala», recorda-me o Rodrigues, que era furriel atirador e fazia de vagomestre.
Os tropas de Zalala conheciam a picada como a palma das mãos, todos os seus declives, a lama e o pó, os buracos, as curvas e os mil perigos, aos quais já estava mais ou menos habituados. Mesmo familiarizados. Estar em Vista Alegre era estar no... paraíso.
O sempre bem-humorado Barata comentava, com graça e até farta ironia, que «isto, sim, é uma vila; tem quatro casas e uma “oliveira“ a marcar o centro».
A verdade é que, em Vista Alegre, já dava para sair do quartel e beber uma cerveja num dos estabelecimentos que vendiam de tudo, desde medicamentos a peixe seco, pregos, ferramentas, farinha, a cerveja e um indeterminável número de artigos.
O mesmo não se pode dizer do Destacamento da Ponte do Dange, que não deixava nada a dever às condições de Zalada, em termos logísticos.
«Eram iguais ou para pior...», recorda o Rodrigues.
Como se vê nos postes eléctricos (da foto), dava a impressão de quem lá esteve anteriormente só queria que não tombassem no tempo deles, utilizando escoras de “engenharia militar”. Era desenrascar quanto se podia.
- BARATA. Jorge António Eanes Barata, furriel miliciano atirador de cavalaria, residente em Alcains.
Ver AQUI.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Os últimos dias de Maio de 1975, em Carmona...

O Bar do Eugénio, na cidade de Carmona (actual Uíge)


Os últimos dias de Maio de 1975, em Carmona, foram de crescente instabilidade - que se sentia a cada dia, levedando nas ruas e nas almas. Os patrulhamentos das Forças Mistas - as NT, com aqueles que seriam o futuro Exército Nacional de Angola - mantinham a segurança pública, mas não evitavam uma ou outra escaramuças.
Vulgarmente se ouviam tiros, às vezes rajadas, principalmente de noite e para o lado dos bairros que circundavam a cidade. E também nesta. Tenho presente, num incidente diurno e perto do Bar do Eugénio, entre civis e militantes (armados) de um dos movimentos, a necessidade de a patrulha de PM (PU) intervir de forma rápida e ágil, quem sabe se, com isso, evitando alguma(s) morte(s). E de, logo depois, numa transversal da Rua do Comércio terem sido disparados tiros sobre a patrulha - que, por razões que agora não lembro, seguia apeada.
O sacrifício da guarnição era evidente: aos serviços normais somavam-se os de excepção, como eram os patrulhamentos na cidade e nos principais itinerários. Os menos de 400 homens do BCAV. 8423 não tiveram, por esses dias de Maio de 1975, tarefa que se desejasse. Aumentavam as dificuldades e ponderava-se a concentração, na cidade, de todo o Batalhão. A 1ª. Companhia, recorde-se, estava na vila do Songo e em Cachalonde - comamdada pelo capitão José Paulo Fernandes.  
- PM (PU). Polícia Militar, Polícia de Unidade. Criada em Carmona, em
Março de 1975, para «melhor garantir a apresentação  do pessoal militar e
prevenir a resolução de muitas quezílias entre a população civil e as NT,
devido à animosidade que aquela tem a estas», como se lê no Livro da Unidade.
- NT. Nossas Tropas.  

segunda-feira, 23 de maio de 2011

O emblema e o crachat do Batalhão de Cavalaria 8423



O crachat/emblema do Batalhão de Cavalaria 8423 foi desenhado pelo (alferes miliciano) Mário Simões e conhecido a 11 de Fevereiro de 1974. O comandante  Almeida e Brito, desejando desde logo «instituir o espírito de corpo o BCAV., de modo a que se conctituísse um todo coeso, disciplinado e disciplinador», achou por bem idealizar o emblema braçal da Unidade, ao mesmo tempo que se desejou «a sua plena identificação com a sua unidade mobilizadora» - o Regimento de Cavalaria 4.
Conta-nos (o alferes miliciano) Simões (foto ao lado) que, quando chegou a Santa Margarida para formar batalhão, sabendo-se que era desenhador, foi chamado pelo comandante Almeida e Brito, que lhe apresentou o conceito que pretendia para os crachás e galhardete, o símbolo que iria representar o batalhão, assim como as cores para cada companhia, em terras de Angola.
«Mostrou-me um galhardete onde se via um cavalo em fuga e foi a partir dessa base que eu comecei a trabalhar algumas maquetas, a fim de serem apresentadas ao comando», recorda, agora, Mário Simões.
O trabalho foi «exaustivo e desafiante», mas no fim de alguns dias chegou-se ao resultado final. «O tempo era curto, havia que mandar executar os vários crachás, os autocolantes e os galhardetes», recordou Mário Simões.
O emblema seve o lema «Perguntai ao inimigo quem somos», dentro das tradições do RC4, sendo o fundo de cor preta. E foram escolhidas as cores para cada companhia: vermelha (1ª. CCAV., a de Zalala), azul (2ª. CCAV., a de Vista Alegre) e castanha (3ª. CCAV., a de Santa Isabel).
Assim se criou a imagem dos Cavaleiros do Norte!

domingo, 22 de maio de 2011

O sr. Augusto de Zalala...

Rodrigues, Augusto e Queirós, boa gente de Zalala (1974)

Augusto foi um militar de Zalala, que todos tratavam por senhor. Senhor? Então não era camarada? Bom, a verdade é que Augusto, de idade bem mais avançada que a nossa, fez parte do 4º. pelotão em Zalala da 1ª. Companhia; e depois em Vista Alegre, sempre tratado por senhor.
Ninguém sabe, ou se lembra, de como e porque foi mobilizado para o serviço militar, mas de três dias de mato, numa operação em que o pobre do sr. Augusto foi vítima das famosas formigas “quissonde”, disse muitos se lembram. Eram enormes, as formigas, de cor avermelhada. E quando mordiam, mordiam a sério. Bem faziam sentir a dor que provocavam.
Sempre que íamos para o mato, tínhamos de utilizar roupa apertadas com bons elásticos, porque as formigas entravam nas calças e procuravam logo os testículos, para morder. Eram um perigo! E, se mordessem, era escusado..., que não largavam. Para as retirar, tínhamos de as puxar até as partir e lá ficava a cabeça da fixa na pele.
O sr. Augusto, numa dessas vezes, teve o azar de uma dúzia destas “amigas” terem pegado com ele. O pobre do homem não usava cuecas, imaginem como ficou! Sangrava a bom sangrar e isto logo no segundo dia, mesmo depois do tratamento do enfermeiro e de uma tentativa de evacuação - que foi recusada. O bom do sr. Augusto, assim, teve de aguentar o resto da operação, movimentando-se com grande custo e por vezes carregado às costas pelos restantes camaradas.
Mais tarde e devido à sua difícil mobilidade - o que já não tinha tanto a ver com as quissonde, mas com a idade, passou a ficar no quartel e a fazer serviços na cantina e cozinha, entre outros. Foi, por isso, por nós “promovido” a  sr. Augusto. Pelo nosso respeito a pessoas de mais idade e, no caso, por ser um bom camarada e um amigo sempre pronto a colaborar em qualquer tipo de serviço - desde que ele fosse capaz.
Aqui lhe deixo um grande abraço, sr. Augusto! AMÉRICO RODRIGUES

sábado, 21 de maio de 2011

As vésperas de partir para Angola, há 37 anos!



Há  37 anos, em Maio de 1974, estes eram os dias de vésperas de partida para Angola - que era para ser a 27 e foi a 29. Aqui pela aldeia, fiz a procissão das despedidas, depois de, num salto de comboio, ter ido a Viana do Castelo baptizar o meu sobrinho  Zé Fernando e dizer «até um dia destes...» aos familiares e amigos que ainda por hoje por lá vivem.
Os amigos mais próximos, um a um, tiveram o abraço do adeus, embrulhado em desejos de que tudo me corresse bem e na esperança de que por Angola não demorássemos muito tempo. O 25 de Abril tinha sido semanas antes, ainda não fizera um mês, e os ventos revolucionários chegavam à aldeia com sugestões de mais nenhum soldado ir para a guerra. Mas fomos!
Os amigos, nas despedidas, todos me faziam votos  de sorte, a que eu, na imberbidade dos 21 para 22 anos, dizia amen com convicções seguras: sentia-me preparado, física, mental e tecnicamente, e recusara mesmo uma oferta de favor para não ir ao ultramar. Portanto, era ir e sem medos.
«Escreve, pá!...», era a sugestão mais repetida por aqueles e aquelas que, mais próximos ou mais distantes, eram gente da minha horta de amigos. Assim fiz sempre!!! De Angola, trouxe uma mala de correio, que ainda guardo, com mais de um milhar de cartas e aerogramas. Documentos que agora, para este blogue, são semente de ideias e colheita e maná de pormenores, que são pão desta leitura diária - desde 9 de Abril desde 2009.
Hoje, ali no cemitério, onde levei minha mãe à sua habitual romagem de sábado, achei-me diante da campa de primo meu, mais velho e de quem tenho nome igual, que foi fuzileiro especial, depois militar de carreira e que, no aquartelamento do Vale do Zebro, morreu há 15 anos na sequência de uma estúpida queda de uma escada.
Fiquei a pensar na observação de minha mãe: «Tás a ver, o teu primo também andou lá na guerra e veio morrer cá...». Assim foi. Há guerras a sério que não matam. Há coisas vulgares que nos derrotam. Nos abatem
- FOTO: A foto do meu primeiro serviço em Angola, no Quitexe.
Ver AQUI

sexta-feira, 20 de maio de 2011

O FNLA que ia ver os jogos de futebol em Zalala

Furriel Rodrigues com elementos da FNLA, em Vista Alegre (1975)


Os primeiros contactos “amigáveis” com elementos da FNLA aconteceram em Zalada, onde eles iam com familiares, procurar intensamente a enfermaria e remédios para cura de um interminável número de doenças, que nem eles sabiam definir.

Queixava-se o furriel enfermeiro Barreto de estar «tramado para tratar este pessoal»: «Só sabem dizer que dói aqui, aqui e aqui, já lhes disse que o que dói é a ponta do dedo, quando eles apontam para localizar a dor».
Realmente era difícil ajudar estes homens, mulheres e crianças que, após anos provavelmente sem um comprimido, ou outro tipo de medicamento, ansiavam vivamente por uma cura milagrosa, na base de uma injecção, pomada, pensos ou um xarope, que os livrasse de um qualquer mau estado físico, ou “mental. Todos eles viam na enfermaria essa oportunidade. Troquei impressões com alguns elementos da FNLA, no tempo de Zalala e dos nossos confrontos, sobre os pontos onde atacavam.
Há várias histórias de escaramuças, de que eles se recordavam perfeitamente - até dos locais onde fazíamos operações militares. Diziam eles que muitas vezes nos localizavam, mas evitavam o contacto. Pude verificar algum do seu armamento, mas o que mais me espantou foi um deles dizer que ia ver os nossos jogos de futebol -sempre muito bem escondido no mato envolvente ao aquartelamento. Vejam lá se algum dia me passaria pela cabeça ter tal espectador...
Em Vista Alegre, já eram bastantes, mas não eram tão genuínos, nem comparados, com os de Zalada - por provavelmente terem sido recrutadas à última da hora. Já apareciam em grupos e com “fardas”e melhor armamento. Como os outros movimentos, MPLA e UNITA, tinham presença muito reduzida, as escaramuças a valer foram mais tarde. Reservadas para o palco de Carmona.

AMÉRICO RODRIGUES

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Instrução ao futuro Exército Nacional de Angola


Quartel do BC12, onde esteve o BCAV. 8423, de 2 de Março a 4 de Agosto de 1975. A norte, a estrada para o Songo


O quartel do Batalhão de Caçadores 12  (foto) foi onde, de 2 de Março a 4 de Agosto de 1975, esteve o comando e algumas companhias do Batalhão de Cavalaria 8423. De lá partiam ordens e operações, tendencialmente para manter a segurança da cidade e da região, das pessoas e bens. Mas eram cada vez mais ingratos os dias finais do mês de Maio de 1975.
Ao tempo, procurava-se incrementar as chamadas Forças Mistas, que seriam o futuro exército de Angola -  envolvendo militares da FNLA, MPLA e UNITA. Que, nas diversas especialidades, recebiam instrução da tropa portuguesa.
A nós, milicianos do PELREC, coube instruir os atiradores, ex-combatentes das matas e dos trilhos do Uíge, ex-inimigos do ontem.Julgo poder dizer, afora uma ou outra situações menos ortodoxas, que o relacionamento foi pacífico e pedagógico. Nao foi por nós - ou por falta da nossa paciência, ou competência, ou dedicação, que não se formou o Exército Nacional da Angola. São contas de outro rosário, que não o nosso?

quarta-feira, 18 de maio de 2011

A modernidade de Vista Alegre, por onde jornadearam os «zalalas»...

Vista Alegre em 1974/75 (em baixo) e já no século XX (em cima, foto da net). Repare-se que a casa do lado direito, atrás da placa, ainda é a mesma


Vista Alegre foi pouso da jornada africana dos Cavaleiros do Norte, por lá jornadeando a 1ª. CCAV. (a de Zalala), de 22 de Novembro de 1974, a 24 de Abril de 1975 - quando passou para o Songo. Assumiu a responsabilidade operacional no dia 25 desse mês, mês véspera de Natal.
A companhia de Zalala foi lá render a Companhia de Caçadores 4125/72 - nessa altura de partida para Luanda. O Destacamento de Ponte do Dange tam´bém integrava a guarnição comandada pelo capitão Castro Dias.
A foto de cima identifica a localidade com algum ar de modernidade, bastando olhar para os candeeiros de luz pública, que parecem alimentados por “painéis solares” - luxo que nem se sonhava no tempo dos Cavaleiros do Norte.
«Verifico, com alegria, que a casa perdura nos tempos de hoje...», diz o (furriel) Rodrigues, que m´enviou a foto, com
«a placa genuína, a de 1974/74», como fez questão de sublinhar.
A estrada de 1974 e 1975 nem tinha a linha contínua, o que leva a concluir que foi melhorada a chamada estrada do café - que liga(va) Carmona (Uíge) a Luanda. E sabe-se que sim, por notas recolhidas ma imprensa angolana actual.
- Ponte do Dange, ver AQUI

terça-feira, 17 de maio de 2011

Carmona e o o Uíge eram uma ilha no mar da FNLA

Carmona, capital do Uíge. Quartel do BC12, onde esteve
o BCAV. 8423. Visto do lado do Songo.

As dores de Maio de 1975 foram crescendo, dia a noite, cada vez mais sentidas pela guarnição e, em particular, pelos homens que saíam em serviços - para a cidade de Carmona, ou para os patrulhamentos a itinerários.
A autoridade militar portuguesa era frequentemente questionada, ora pelos dirigentes e militares dos movimentos, ora pela população civil europeia. Já aqui várias vezes falámos disso. 
Não era invulgar sermos maltratados e acusados!! E muitos europeus cuspiam e vociferavam palavrões à nossa passagem. O Livro da Unidade dá conta de, relativamente à guarnição, «começar a verificar-se desautorizada e alvo de atropelos, o que levou publicamente a afirmar «viver-se numa ilha no mar da FNLA», com todas as inconveniência que daí advêem».
A FNLA era, de verdade, a força nacionalista dominadora da povíncia do Uíge, dizendo-se na altura que teria mais de 20 000 homens armados - número que nunca foi possível confirmar. E as escaramuças com o MPLA (principalmente) e depois com a UNITA pasarem ser frequentes - quiçá diárias. 
Era nesse tempo que os Cavaleiros do Norte tinham de ser árbitro justo e imparcial. Papel que, julgo bem, exercemos com honra e às vezes com sérios riscos.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Os estranhos cortes de cabelo à moda de... Zalala!!!

Rodrigues, Eusébio, Barata e Queirós. Estranhos cortes de cabelo, à... Zalala


Um dia resolvemos cortar o cabelo. Claro que, em Zalada, longe de um possível, imprevisível ou provável olhar do comandante Almeida e Brito, pois bem sabíamos da disciplina que era imposta e que tínhamos sempre de cumprir com o aprumo na nossa apresentação. Caso contrário, bem podíamos contar com as devidas sanções - que ele não perdoava a ninguém, nem admitia desculpas.
E olhem lá se ele nos apanhava assim!Nem quero imaginar onde iríamos parar.

A foto é de um daqueles dias de liberdade (sem serviços) e, como tal, das respectivas e habituais “maluquices de Zalala” - que, porém, fomentavam as amizades e a união e nos ajudavam matar o tempo e a esquecer o resto.
Neste caso, combinámos os quatro cortar o cabelo. Solicitámos os serviços do barbeiro da companhia e da sua famosa máquina de cortar. Máquina, desse tempo, manual!
Não lhe pedimos os catálogos ou fotos de penteados da moda, porque isso não existia. Cada um foi designer a seu gosto. O Rodrigues optou por cortar o cabelo dos lados e a meio da cabeça, o Eusébio, cortou o cabelo à Santo António, rapado por cima e deixar o resto por baixo. O Barata, já prevendo o desfecho da iniciativa, rapou logo a cabeça e o Queirós fez um corte de “apache”.
E assim passámos a tarde, porque, no final, lá voltou o barbeiro, para nos fazer outro corte - como o do Barata, de cabeça rapada, não fosse o nosso capitão Castro Dias dar com a transformação dos  penteados e, por tabela da disciplina militar, nos aplicar os respectivos castigos.
Assim se passava uma tarde em Zalada.
AMÉRICO RODRIGUES



domingo, 15 de maio de 2011

O auxiliar Rebelo e todos os cozinheiros do BCAV. 8423


A tropa puxa-nos a contar epopeias de guerra, narrando os dramas que se viveram (ou não) nas operações e patrulhamentos, cada qual puxando mais o lustro dos seus feitos.
Sempre se fala dos heróicos atiradores, a «carne para canhão» que invariavelmente saía dos aquartelamentos para missões apeadas ou transportadas, sempre em mil cuidados, não fosse o perigo que nos espreitava enlutar-nos as fileiras. Mais remotamente, fala-se dos sapadores - que também de quando em vez malhavam com o corpo pelas picadas e nos trilhos do norte angolano. E até já aqui falámos dos enfermeiros e dos mecânicos - cada especialidade sempre em dia com as suas obrigações, para que tudo nos corresse bem! E até dos escriturários e do sacristão, ou dos homens das transmissões, os criptos, ou outros!
Nunca aqui falámos dos cozinheiros!!! E como eles nos eram tão úteis, todos dos dias, para nos saciarem a fome de corpos jovens. No refeitório geral, ou nas messes, eles eram verdadeiros mestres, autênticos chefes, sempre prontos na arte de bem cozinhar, para que fome não houvesse entre a guarnição.
O Rebelo era um deles. Auxiliar na messe de sargentos, ajudava na cozinha e foi sempre prático e diligente na sala de jantar - onde nos servia, sempre despachado, empratando os pitéus cozinhados pelo Almeida. A foto é dele, na messe de sargentos do bairro Montanha Pinto, em Carmona - «armado até aos dentes", para a pose. Nele, vai a nossa homenagem a todos os cozinheiros dos Cavaleiros do Norte.
- REBELO: José Joaquim Robalo Rebelo, auxiliar de cozinha. Funcionário da Fábrica Militar da Braço de Prata (FMBP). Natural de Aranhas (Castelo Branco), mora em Odivelas.
- ALMEIDA. José Maria Antunes de Almeida, 1º. cabo cozinheiro. Natural de Arganil e residente em Boliqueime, Albufeira (Algarve).

sábado, 14 de maio de 2011

Os bravos e isentos Cavaleiros do Norte

Rua do Comércio, em Carmona, agora cidade do  Uíge (anos 70 do século XX)


Os meados de Maio de 1975 foram tempo de crescente avolumar da tensão entre os movimentos então já instalados na cidade Carmona. E pouco valia a intervenção dos comandos militares portugueses, sugerindo e aconselhando calma na gestão dos seus relacionamentos. Só á força!
A missão prioritária das NT era arbitrar esses conflitos e manter a segurança da cidade, das pessoas e dos bens, do tráfego rodoviário e dos abastecimentos, das comuinicações, unidades de saúde, da energia. Mas era um missão incompreendida. Acusada de parcialidade. Pelos movimentos e pela população civil europeia.
Leio do Livro da Unidade: «Procurando posição de isenção, foi a actuação das tropas orientada no sentido da sua missão, contudo viu sempre escolhos diversos a vencer, viu e sentiu ameaças». Ameaças que os mais operacionais, bem sentiam na pele e na alma, sempre que as tarefas nos levavam às ruas da cidade, ou às  estradas que ligavam ao Songo, ao Negage e a Luanda (pelo Quitexe).
As NT eram não raramente «alvo de vexames», como recorda oLivro da Unidade. E, sobretudo, «apelidada de partidária». As suas actividades (as nossas), no sentido de se cumprir o acordo entre portugueses e angolanos, para a independência destes, eram «mal aceites, ainda que não suscitem quaisquer dúvidas quanto à sua isenção». Mal aceite, repitamos, pelos movimentos e pela população europeia.
Passados 36 anos e com tanta pós-história de Angola escrita, não tenho quaisquer dúvidas: o Batalhão de Cavalaria 8423 esteve à altura. Foram bravos, e isentos, os Cavaleiros do Norte!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

A morte do soldado sapador José Gomes Coelho


José Gomes Coelho, no Quitexe, ao centro de bigode. E na foto a cores, em baixo. Reconheço, na de cima, os 1º.s cabos João Monteiro «Gasolinas» (à esquerda) e Soares (à direita). Os dois companheiros que ladeiam o José Coelho, quem são? Recordo os rostos, mas esqueci os nomes. Quem os identifica?  


A13 de Maio de 2007, há 4 anos, faleceu José Gomes Coelho, que pelos Cavaleiros do Norte jornadeou como soldado sapador, operacionalizando-se em Santa Margarida, depois  estacionando no Quitexe e em Carmona, antes de Luanda e do regresso a Portugal - a 8 de Setembro de 1975.
Pertencia ao pelotão de sapadores, comandado pelo alferes Ribeiro, e dele lembro a pacatez  e sentido de dever, sempre humilde, sem falhar um serviço, sempre em missão.
A vida levou-o pela Universidade do Porto, onde profissionalmente exerceu a arte de carpinteiro - até que a doença o levou a reforma antecipada, por invalidez, falecendo aos 55 anos, vítima de doença que lhe atormentou os últimos tempos da sua passagem terrena.
«Teve um tumor cereberal. Nunca quis ser operado...», disse-me a filha Ângela, reportando o luto da sua família.
Casou com Maria Elisa Sousa Ferreira, viúva que me deu a notícia da sua morte há dois anos, pelo tempo do Encontro de Águeda. Teve duas filhas e ainda conheceu dois netos.
Está sepultado no cemitério de Oldrões da Calçada, em Penafiel, onde vivia.
Até um destes dias, amigo!
Ver AQUI.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

O Pinto, companheiro de Lamego e de terras de Angola

Telefonou-me hoje o Pinto (foto), que foi companheiro dos melhores da jornada angolana, ele em missão por terras de Zalala, furrielando na 1ª. CCAV. Eu, na já bem mais «cosmopolita» vila do Quitexe. Mas essa amizade levadada no norte de Angola, já como Cavaleiros do 8423, fôra semeada e nascida nos tempos da exigente e amarga instrução  militar do CIOE, em Lamego - onde nos fizemos «ranger´s». 
A conversa foi longa, regada de saudades dos nossos tempos mais jovens - de 21 para 22 anos, de Lamego a Angola, passando por Santa Margarida. E caricaturando alguns momentos mais relevantes, ou assaz pitorescos, desses tempos de farda camuflada, que nos fizeram soldados dispostos, se necessário, a dar a vida!
O Pinto já goza as delícias da reforma, depois de uma vida dedicada à mecânica e aos automóveis. Reside em Paredes, do Porto. «Estou bem, pá... Tenho tudo o que preciso, uma família porreira», disse-me hoje, notando-se-lhe aleluias na voz, por  ter chegado a este tempo de 59 anos sem custas no corpo e na alma.
Queixou-se o Pinto que a 1ª. CCAV. 8423 não se reúne. Vai ligar ao Queirós, ao Rodrigues: «Temos de nos encontrar, pá!...».
Olha, vem a talho de foice: e o nosso encontro de antigos instruendos do CIOE? Reunimo-nos uma vez, há uns 20 anos, em Águeda. E nunca mais! Vamos pensar nisso, ó Pinto?!
Ver AQUI.
- PINTO. Manuel Moreira Pinto, furriel miliciano de Operações Especiais (Ranger´s), da 1ª. CCAV. 8423 - a de Zalala. Reformado, natural de Penafiel e residente em Paredes (Porto).
- CIOE. Centro de Instrução de Operações Especiais, em Lamego.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

A frota de Mercedes do aquartelamento de Zalala...



Zalala era um lugar inóspito e isolado, carregado de problemas de toda a espécie, mas o Rodrigues, que por lá jornadeou como furriel atirador de cavalaria e depois até gestor de alimentação, vem lembrar que «comparando com os tempos de hoje, até vivíamos bem». A situação, do ponto de vista dele e tendo em contra a frota automóvel, «equivaleria a um industrial de sucesso, nos tempos actuais».
«Deixa-me brincar, mas «eram só» Mercedes», diz ele, na nota que enviou para o blogue, com a foto que se vê acima.
A primeira Mercedes, à esquerda, andava sempre carregado de sacos de areia, tipo rebenta-minas. E já tinha rebentado muitas, segundo relatos dos companheiros da CCAC. 3534, que os Cavaleiros do Norte de Zalala substituíram.
As mazelas eram vem visíveis e a «desgraçada» fazia a picada de Zalada ao Quitexe muitas vezes em 8, 9 ou mais horas, na altura das chuvas.
«A parte da frente ia na direita da picada e a traseira na esquerda e, por isso, ficava no Quitexe, porque precisava duma estrada só para ela, não tinha o prazer de andar no alcatrão», comenta o Rodrigues.
A versão dos mecânicos falava do chassis empenado e, por isso, não havia nada a fazer. Os gasolinas eram mais rápidos e em terreno mais ou menos plano tinham bom andamento e superavam alguns obstáculos. Os unimogs (”burros do mato”) nem tanto, porque entravam em tudo o que era buracos e principalmente no meio do capim, quando batiam em obstáculos que não se viam ou venciam.
«Quando havia colisão, ninguém se segurava e o pessoal voava para fora da viatura, mas tinham um guincho, que muitas vezes foi crucial para vencer obstáculos e repor outras viaturas na colunas», lembra o Rodrigues, com «um grande abraço aos mecânicos que cuidavam destas máquinas

terça-feira, 10 de maio de 2011

Estranhas dores de cabeça no IAO de Santa Margarida

Campo Militar de Santa Margarida (sublinhada a vermelho) e
área de S. Miguel de Rio Torto e Mata do Soares
Clicar na imagem, para a ampliar

A 10 de Maio de 1974, ficou concluída a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional (IAO) que os futuros Cavaleiros do Norte fizeram pelas redondezas de Santa Margarida e nomeadamente pela chamada Mata do Soares.
Já aqui chamámos algumas histórias, as que a memória lembrou, mas muitas outras se terão passado - principalmente entre os companheiros das três companhias operacionais, que no IAO mais sofreram que os CCS´s, que por lá faziam de IN.
Ocorre-me uma, por estes dias passadas comigo e que teve a ver com uma brutal dor de cabeça que me enfermou. Coisa de impacto físico brutal e estranha a um fulano da minha idade e constituição física, mas que me levou à enfermaria do aquartelamento, o RC4.
Lá fui eu, em boleia militar, e por lá esperei vez de ser «aviado» pelo médico de serviço, que me fez algumas perguntas e me mandou esperar fora  da sala que servia de consultório. E por ali fiquei bons pares de minutos, até que um enfermeiro me chamou e mandou deitar numa maca. para me massajar.
«Massajar-me?!...», interroguei-o eu, de espanto.
Pois não é fulao? Que sim, era eu.
«Então, deite-se e puxe as calças para baixo...», disse o enfermeiro, imperativo e com umas bisnagas na mão.
«Há engano, homem.... eu queixo-me é de dores de cabeça», disse-lhe eu. E doíam-me bem, a martelarem-me de tal fprma, que tinha necessidade de comprimir as têmporas. «Doi-me é a cabeça....», insisti eu.
O enfermeiro é que não me ouviu e lá me massajou, por ordem receitada pelo médico militar - que era homem para os seus 70 anos e de quem suspeitei ter «alguma coisinha» na cabeça.
Mas não é que as dores de cabeça desapareceram?
Ainda hoje, 37 anos depois, não entendi a maleita que de forma tão violenta me fazia doer as têmporas.
- CCS. Companhia de Comando e Serviços.
- IN. Inimigo.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Os dias de tensão e quezílias na cidade de Carmona

Bairro Popular, em Carmona (1975). As antenas são
das instalações da Junta Provincial de Povoamento



Os dias de Maio de 1975, em Carmona, foram-se levedando de tensão - já não só pela animosidade da população civil para com os militares, mas também porque, numa terra que era «terra da FNLA», por isso, não eram bem vistas, nem aceites, outras opções políticas - nomeadamente o MPLA! E a UNITA, que pelo norte uígense começou também aparecer. E, muito timidamente, até alguns movimentos da preocupada sociedade civil. 
Por isso mesmo, tornaram-se vulgares e regulares as quezílias entre eles e, cito o Livro da Unidades, «por vezes nem se conhecendo bem as razões, ou sequer se conseguindo distinguir a origem das situações» - que, à partida, pareceriam de entendimento fácil, mas que se tornavam motivos de polémicas e agressividade - com as NT a terem «enorme dificuldade em fazer vingar o papel de árbitro», que seria condição prioritária para que os processos de integração dos (ex)combatentes e de independência corressem bem. Minimamente bem!
E que o dissessemos nós, os militares que patrulhávamos a cidade (prncipalmente durante a noite), ou nela policiávamos
o atavio, o aprumo ou a segurança militares, e tantas vezes era alvos até de chacota e de muitas provocações.
Numa noite, numa das primeiras depois da minha chegada de férias, seriam umas duas da manhã, chamaram-nos para incidentes no bairro popular e recordo-me bem do frio dos nervos quando nos aproximávamos. Dos suores que nos encharcavam o camuflado. E não era só do calor africano, era da tensão física e emocional. Ouviam-se tiros, que felizmente acabaram quando nos aproximámos, de unimog e armas aperradas e de bala na câmara, para o que desse e viesse.
Não deu nem veio nada! Havia algum respeito pela tropa e este era um bem que queríamos manter.

domingo, 8 de maio de 2011

Os dias de piquete no aquartelamento de Zalala


Furriel Rodrigues, à esquerda, com o piquete de serviço,
em Zalala, na protecção à avioneta do “tabaco»


 
Os dias de piquete, em Zalala, eram de previsível descanso - normalmente os que se sucediam aos de operações pelas matas uígenses  - essas, sim, sempre perigosas, ainda que não tivesse havido um tiro, uma mina, ou uma armadilha nos trilhos que se batiam passo a passo e de olhos bem abertos, para verem o que não queriam ver.
Não eram (os piquetes) muito diferentes de Quitexe, de Aldeia Viçosa ou de Santa Isabel. Ou Vista Alegre, Ponte do Dange, Luísa Maria ou outro qualquer pouso dos Cavaleiros do Norte. Ou, mais tarde, de Carmona, ou do Songo.
O Rodrigues, que jornadeou por Zalala, veio recordar o que por lá acontecia sempre que uma avioneta sobrevoava o aquartelamento, duas ou três vezes: «Já sabíamos o que era e o pessoal de piquete escalado tinha de se deslocar para a pista de aterragem, para fazer a respectiva segurança».
Uma vezes, muitas vezes, eram voos civis, de gente que ia à fazenda de Ricardo Gaspar, em Zalala. Mas em outras, na maioria dos casos, eram o marketing do tabaco ou da cerveja a anunciar as suas marcas e a fazer a campanha do fumador.
«Normalmente, o piquete tinha pouca actividade, mas uma vez ou outra era requisitado para prestar auxílio a algum pelotão que estivesse no mato, ou em patrulhamento e precisasse de apoio de qualquer espécie», agora recorda Américo Rodrigues.
O piquete, portanto, representava para os Cavaleiros do Norte de Zalala uns dias de merecido descanso e refeições quentes no quartel, após as nossas investidas no mato.
«Quando aparecia a avioneta do “tabaco”, a importunar o nosso repouso, todos ficávamos revoltados. Se pudéssemos, a avioneta vinha a baixo, em vez de nós irmos para a pista de aterragem», diz o Rodrigues, 36 para 37 anos depois de os seus dias se passarem por Zalala.
Assim se passava a jornada angolana de terras uígenses.

sábado, 7 de maio de 2011

Comandante Almeida e Brito


O dever cívico levou-me hoje às festas do ano de prata de uma IPSS de Águeda (Os Pioneiros), que conheço de perto e por onde sei estar semeado um grande campo de solidariedade. E o que tem isto a ver com os Cavaleiros do Norte? Pois, é que encontrei lá o general Pires Tavares, irmão de armas e de peito do nosso saudoso comandante Almeida e Brito (foto).
Desfiámos histórias, recordámos um nosso encontro de Coimbra, nos anos 80 para 90, quando Almeida e Brito era brigadeiro e adjunto dele, então comandante da Região Militar Centro.
Registei o sentimento de admiração que nutria pelo nosso comandante. Admiração que adubou de elogios às competências militares, profissionais e pessoais de Almeida e Brito, de quem foi companheiro na Academia, depois em jornada moçambicana, depois em comando militar regional e outras fases das suas carreiras, sempre íntimos pela vida fora. «Um grande militar, fui eu quem o escolheu para meu adjunto em Coimbra, sempre o quis comigo», disse-me Pires Tavares, recatando a emoção.
Recordou-me a sua missão em terras dos Dembos (Quibaxe), muita vizinhas do nosso Quitexe uígense e a fidalguia de D. Isabelinha, agora viúva de Almeida e Brito.
Ficaram de ouro, os anos de prata que hoje fui viver a Os Pioneiros. 
- ALMEIDA E BRITO. Carlos José Saraiva de Lima Almeida e Brito, tenente-coronel e comandante do BCAV. 8423. Atingiu a patente de general, depois de, por exemplo, ser 2º. Comandante da Região Militar Centro e da GNR e comandante da Região Militar Sul. Faleceu a 20 de Junho de 2003, durante um passeio turístico a Espanha. Tinha 76 anos.  

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Os primeiros dias de Carmona em Maio de 1975

O Cinema Moreno, em Carmona (1975). Ficava em frente à Rádio Clube do Uíge

O ambiente de Carmona, pelos idos primeiros dias de Maio de 1975, era pesado, com várias escaramuças entre militantes e dirigentes dos movimentos e crescentes constrangimentos nas relações entre civis e militares portugueses. Estes, eram sucessivamente acusados de traidores e sobre eles dito cobras e lagartos. O ambiente era tenso...
A criação da Polícia Militar, de resto, surgiu disso mesmo. Não só para garantir o necessário atavio e comportamentos dos homens da guarnição, mas muito mais para resolver «as muitas quezílias existentes entre a população civil e as NT, devido à animosidade que aquela tem a esta», com leio no Livro da Unidade.
Os incidentes, na verdade, repetiam-se regularmente e ocorre-me, de memória, uma sessão de cinema no Moreno, que foi  interrompida por causa dos insultos que eram «vomitados» sobre os militares, proferidos por alguns civis, acobardados no escuro da sala. Cada cena mais a jeito, era aproveitada para fazer trocadilhos, para se insultar a tropa, e o ambiente tornou-se assaz dramático. E imprevisível.
A sessão foi interrompida à força, ligada a luz subitamente e «avisada» toda a gente para as consequências iminentes, em caso de se continuarem os insultos. Recordada a cena, assim, com esta singularidade, até parecerá brincadeira de meninos amuados, mas não era assim. Até porque entre o público estavam também elementos dos movimentos emancipalistas e, valha a verdade, havia algum medo do eventual exercício de vinganças acobardadas nos escondidos da noite.
Maio de 1975 não foi de flores, mas de dores. De dores na alma na sociedade carmoniana e no espírito de paz que as NT a tudo o custo queriam fazer vincar.
- NT. Nossas Tropas.